O PÉ DE JAMBOLÃO

Quando eu vi aquela árvore, ali, em frente à sua casa, não prendi muito a minha atenção, pois ela me pareceu bastante comum. Sem flores, nem frutos, de porte mediano, não possuía mais do que três metros de altura. Uma árvore igual à outra qualquer.

Certa tarde do mês de janeiro, pleno verão, um calor intenso, ela nos ofereceu sua preciosa e refrescante sombra. Foi neste dia que eu soube que se tratava de um pé de jambolão. Ficamos ali, sentados, por horas. Você, sua irmã, as filhinhas dela e eu, recém chegada. Sua mãe aparecia de vez em quando, sorrateira, curiosa; você buscava uma cadeira, ela sentava-se perto de nós, enriquecendo-nos com suas reminiscências. Ela falava de sua avó, de sua infância simples, das peraltices de seus irmãos. Falava, também, do Arroio do Só, e se expressava com tanto saudosismo que dava vontade de conhecer o lugar. O vento passava por nós, balançava nossos cabelos, e balançava os galhos do jambolão que, com seu farfalhar de folhas, parecia agradecer. Com o vento, odores agradáveis, um cheirinho de mato, um cheirinho de verde, daqueles que eu costumava sentir todos os dias, quando eu ainda era uma criança. Caem algumas folhas sobre nós, acariciando-nos. Começo a gostar desse pé de jambolão.

E então, entre uma conversa e outra, uma recordação e outra, entre um carinho e outro, você me conta que o plantou, você e seu pai; e, seu olhar se perde do nosso meio e repousa junto às doces lembranças de seu pai, de quando ele lhe ensinava tantas coisas e você ávido por aprender e contente por estar com ele, era aplicado, um aluno exemplar, um filho exemplar. Vejo que sente uma saudade inenarrável, seus olhos se enchem de lágrimas, você disfarça um pouco, seca os olhos com os dedos, balança a cabeça como que para espantar aqueles pensamentos e retorna para nossa roda de conversas descontraídas. Sorri, brinca com os cabelos de sua sobrinha, se encanta com as covinhas da outra, diz uma piada, uma broma qualquer para sua irmã. Todos nós rimos. Estamos tão felizes. Sua mãe, satisfeita, nos chama para o café da tarde. Levantamo-nos, uns ajudando os outros. Limpamos da roupa, gravetos, pedrinhas e folhinhas de grama. As meninas correm na frente, sua mãe e sua irmã vão logo atrás delas e nós dois, abraçados, atravessamos o portão e seguimos, corredor adentro, até chegarmos à cozinha, onde um delicioso lanche nos espera. Ficando para trás, apenas, o pé de jambolão que continuava a balançar seus galhos com toda a elegância, pois estava seguro de ser ele o mais importante.

Hoje, ao lembrar-me de sua rua e de quando comecei a fazer parte de sua família, senti ganas de escrever. Ao redigir as primeiras linhas, percebo que este quadro está mais vivo do que nunca em minha memória, porém, o tempo passou e aqueles dias não voltarão mais. As crianças cresceram, verões vieram e se foram, o vento balançou inúmeras melenas e todas as árvores de sua cidade, sua mãe partiu para encontrar seu pai e, até você se mudou. Somente o pé de jambolão permaneceu ali, no mesmo lugar, oferecendo sua sombra amiga, ouvindo, pacientemente, outras histórias, outras bromas, outros risos e outras reminiscências que o vento leva e traz.

E o nosso amor? Ah! O nosso amor! Assim como o jambolão, cresceu, floresceu, deu frutos e, continua forte e sereno, pronto para receber as doçuras e as agruras da vida, pronto para driblar o tempo e permanecer vivo para sempre.

DoraSilva
Enviado por DoraSilva em 20/09/2010
Reeditado em 10/02/2013
Código do texto: T2510028
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