DESPEDIDAS

A casa estava escura, eu caminhava lentamente pela escuridão, lá fora, a guerra explodia por todos os lados e não demoraria a destruir aquele bairro, a minha rua. Ele estava lá, parado na frente de sua casa pronto para partir. A guerra o roubara de mim também. Nós crescemos juntos morando um do lado do outro, naquela mesma rua, que observo agora, e posso garantir que não foi sempre assim. Ela nem sempre foi um lugar de pessoas preocupadas, temerosas e chorosas. Outrora fora um lugar cheio de vida e feliz, sem o fantasma da morte que anda junto com a guerra.

Não tínhamos mais idade para sermos crianças, porém continuávamos sendo. Tão infantis eram nossos pensamentos. Então começaram as noticias: bombas explodiam o país, pessoas morriam, os homens partiam e as mulheres choravam. Eu comecei a colecionar despedias. Primeiro partiu meu pai, numa fria manhã de quinta-feira, fora se apresentar ao exercito. Minha mãe chorava e eu o via partir com os olhos tristes, ele se voltou para mim e forçou um sorriso, “- eu volto... eu prometo”, disse bem baixinho, meu pai não cumpriu a promessa, nunca mais voltou para casa. Espero que ele não tenha sofrido muito. Espero que a guerra o tenha levado logo.

Depois, partiram os jovens da minha rua, meninos que até pouco tempo eram moleques correndo e brincando comigo. Destes, poucos eu vi voltar. Algumas moças também partiram, assim como algumas mulheres fortes, foram tentar ajudar os pobres que sobreviviam às batalhas e aos ataques. Seu irmão foi junto com os jovens, e sua mãe enlouqueceu. Ele foi um dos que não voltaram.

Assim, minha inocência se foi como os outros, forçando o fim abrupto de minha infância. Nós dois não nos considerávamos mais crianças. Ele, logo compreendeu que a guerra já matará sua mãe e não demoraria a levá-lo como já fizera com todos, por isso decidiu partir antes que a guerra leva-se. Foi então que nossas brincadeiras perderam a graça, pois cada uma delas era uma despedida silenciosa, até que cessaram de vez. Restaram nossas conversas escondidas na mata.

Por fim, o dia fatídico chegara. Estávamos cercadas por árvores, os dois traziam os olhos transbordados de lagrimas; os dele me diziam adeus e mais alguma coisa, que não ouso repetir. Os meus suplicavam coisas que ele não ouvia. Então, ele se aproximou de mim pela última vez e pela primeira vez os seus lábios não procuraram o meu rosto, só desta vez foram à procura de minha boca. Ao encontrá-la; se juntaram a ela e assim ficaram por um tempo que não foi possível contar..., uma eternidade, mas para mim pareceu muito breve, quando eles se afastaram bem devagar eu chorava ainda mais. Ele permaneceu perto de mim durante um certo tempo; tempo, durante o qual nada falamos. Nada precisávamos falar. Depois ele se virou e voltou para casa.

Agora, a noite já ia alta, como eu disse, minha casa estava escura e eu o via pronto para partir. Então, ele começou a andar pela rua, um pouco antes de sumir, se voltou para mim e sorriu; eu sabia que ele não podia me ver e ele sabia que eu estava lá, seus olhos diziam algo que eu não quis entender, talvez dissessem o mesmo que meu pai. Depois, ele recomeçou a andar até sumir. Nunca mais voltei a vê-lo, e jamais o pude esquecer.

Muito tempo se passou e por fim, a guerra se foi, deixando um rastro horrível por onde passou, levando muitos e deixando marcas em todos. Às vezes, ainda me ponho a observar pela mesma janela, indagando-me se a guerra o levou também.

L. R. Viveiros (n°23 T: 208vesp)

Apoio: G5

Larissa Regina
Enviado por Larissa Regina em 13/09/2010
Código do texto: T2495234