O Lenço

O Lenço

Laura arrumava as malas apressadamente. Fazia aquilo há tantos anos que agora já nem pensava mais. Todas as roupas dele já sabia de cor. Ele deixara algo em cima da cama para ela incluir na mala. Pegou e viu que era um lenço que ela havia bordado 40 anos atrás, com o nome dele.

Estava casada há 45 anos. Sabia que era muito tempo, mas não lhe parecia tanto assim. Viu cada ruga dele aparecer, seus primeiros cabelos brancos, suas manias se acentuarem, seu andar se modificar. Era o seu marido, aquele moço tão bonito por quem tantos anos atrás havia se apaixonado. TIvera a felicidade de se casar com o seu grande amor, porém, esse grande amor, com o passar dos anos, havia também se acostumado a ser grande e, com isso, Laura perdera a sua dimensão.Sentia falta do seu olhar maroto para ela quando a queria na cama. Às vezes, estavam todos os filhos à mesa, ela numa cabeceira e ele na outra. De repente, como num chamado, percebia os olhos dele querendo os seus, e no meio da falação das crianças e das batidas dos talheres, só o olhar dele e o dela existiam. Era um momento mágico. Tudo ao redor desaparecia para Laura e, neste instante, sabia que seria amada, acariciada, querida. Sentia-se mulher, só mulher. Nestes momentos esquecia-se dos filhos, da casa, era apenas Laura e Fabio, dois jovens que se amavam apaixonadamente. Terminava o jantar como que num sonho, colocava as crianças para dormir, só pensava nele. Depois disso, banhava-se cuidadosamente, perfumava-se e deitava-se na cama fingindo ler uma revista. Ele então entrava no quarto, daquele seu jeito tranqüilo e acolhedor. Vinha com o seu cheiro tão bom de água de colônia, corpo de homem limpo, e a abraçava carinhosamente, ternamente. Encostava todo o seu corpo ao dela e Laura enternecia-se de amor, de prazer, de paixão. Os dois se amaram assim por muitos e muitos anos.

Laura piscou os olhos com força, como se despertasse de um sonho, e continuou a arrumar a mala dele. A cada peça que dobrava, olhava para o lenço. As lembranças do seu casamento a tomaram novamente. Parou de arrumar e sentou-se na cama, remediada. Olhou novamente para o lenço, ali, jogado displicentemente, a olhar para ela. Tocou suavemente com as pontas dos dedos o bordado, já com a cor desvanecida, e circundou o seu nome. De mansinho, começou a chorar e, aos poucos, o choro transformou-se em pranto. Chorava de saudades do seu amor, da sua juventude, chorava de medo de perder este homem, o seu amor por décadas, chorava por ter deixado os momentos se escoarem com o passar dos dias. Laura, naquele momento, teve a consciência da morte, da perda, de como seria a vida sem ele. Pela primeira vez na sua vida, teve a consciência do tempo. Segurava o lenço fortemente entre os dedos. Ficou assim um tempo que lhe pareceu uma eternidade. De repente, sentiu uma mão nos seus ombros, quente, tão conhecida. Hã quanto tempo ele não fazia isso? Levantou a cabeça, seus olhos vermelhos de tanto chorar. Fabio a olhar para ela preocupado, volta os olhos para o lenço amarrotado em suas mãos. Delicadamente o retira, coloca-o ao lado da cama e a puxa para os seus braços. Envolve-a fortemente.

Neste momento ele não sente mais o peso da idade, não sente temor ou arrependimentos, sente-se homem, amado. Só quer ficar assim, protegendo a sua mulher, a sua paixão de 45 anos, que havia esquecido, por estar sempre ali ao seu lado. Neste momento, sente que o amor, o sentimento, não envelhece nunca. Seu coração bate forte como há muitos anos não acontece. Laura murmura baixinho ao seu ouvido: "Posso ir junto com você?" Ele sorri e a abraça ainda mais aconchegadamente e responde: "Sempre... sempre..."

Diana Taboada
Enviado por Diana Taboada em 26/08/2010
Código do texto: T2461472
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