Ontem acordei e me olhei no espelho à minha frente.O sol já havia raiado e isso não me animou nada.
Diante de mim, vi uma cena que me desagradou:Eu,refletida no espelho sujo de respingos de lágrimas e maquiagem da noite anterior,quando cheguei.Se bem me lembro, chorei 1 hora seguida depois de perceber que todos os meus motivos de alegria se tornam sempre lacerantes e tristes.Eu estava em casa.























            Na noite anterior, eu não tava em casa. Estávamos um dentro do outro, de modo que nada na rua gelada era mais importante do que meus gritos de prazer naquele casebre bagunçado, e nada era mais relevante do que a força mística que impunha sobre minha alma naquele momento,com o simples ato de me olhar de baixo, no meio de minhas pernas, meio másculo,ciente do gozo que acabara de me proporcionar,e beijar minha boca em seguida.
                  Tá certo que eu havia bebido muita cachaça,e uma mera foda se transformara num filme inteiro de Amor.Mas a cabeça feminina,mesmo sóbria, viaja mesmo nessas cenas românticas,e isso é algo que não vai  mudar...mesmo que a mulherada cisme de meter a cara no mundo,conquistar mercado de trabalho e esfregar na cara dos homens que também fazem o planeta girar,com toda a força do chamado sexo frágil,essa coisa de se sentir mulherzinha,protegida,louca e apaixonada debaixo de um corpo masculino, nunca mudará.E idealizar cenas de amor mesmo quando ele já foi embora e não te ligou após um mês,muito menos...Na minha cabeça retardada de mulher,tudo aquilo era suave,afetuoso.Juntos alí,unidos pela solidão e pelas paranóias que eu tinha e ele também (ele também?Como você sabe sua iludida!?!?).Não eram necessariamente as mesmas paranóias,mas eram pensamentos de duas almas calejadas pelo sofrimento de relacionamentos anteriores.Ah!Como eu sou escrota!Pensar que um cara tá me comendo somente porque está procurando abrigo nos meus braços sexualmente interessados e cheios de afeto!"Como eu viajo meu Deus!"
              Depois de uma tarde de sexo meio desorientado,vieram as lucubrações.Ah que mentira!!!As MINHAS lucubrações já haviam começado desde quando olhei meio sem graça,pros olhos mel dele na estação de trem ensolarada( eu nunca tinha reparado nos olhos dele...)Ah...Eu que já estava me sentindo desprovida de sentimentos ,Eu, que estava rindo de qualquer bobagem dita por ele , em  tom sempre tímido e manso,neste momento,comecei a elucubrar que talvez essa minha fase Robótica ou de Coração Gelado tivesse se esvaindo ,num passe de mágica,à cada palavra sem sentido daquele estranho rapaz.Como?Se eu já conhecia antes,há  3 anos antes?Se trabalhávamos juntos,se ele era amigo daquele meu Ex que causou toda essa seca em meu peito, num passado não tão distante?Como!?Se ele mesmo havia desabafado pra mim toda a sua profunda depressão por aquela que também havia o magoado,e toda vez que ele chorava no meio de expediente de trabalho eu estava lá,olhando e dando uma palavra sincera de minha amizade?Como assim Deus,se havíamos perdido o contato por quase Um ano,e nem sentimos ao menos falta um do outro como dois colegas de trabalho que se conheceram formalmente um dia e foram separados pelo acaso desse destino,e que resolveram se reencontrar "de bob" na Praça XV,semanas antes?Enfim.Somente essa minha cabeça absolutamente retardada para interpretar que esse cara pudesse querer alguma coisa comigo que não fosse sexo.Ou amizade descompromissada.
          Ah eu odeio andar de trem!Mesma sensação do elevador,aquele constrangimento,só que com gente mal 
educada e nada adeptas do silêncio.Mas eu nem percebia nada que não fosse ele à meu redor...
        Eu ali naquele trem sujo,sem manutenção,cheio de gente barulhenta e crianças pidonas,me sentia envolta novamente por um sentimento de candura,meio morno e confortável que se alastrava nessa robô sem sentimentos,que agora traía o namorado(coisa q não fazia antes),saía de vez em quando pra casas de swingue(para observar ) e defendia a bissexualidade.Essa garota que antes tinha ideais de casamento filhos e família,nos últimos meses se desiludira e brincava de maneira prazerosa, magoando todo e qualquer cara que passasse pelo seu caminho,fazendo-os de capacho.Essa mina parecia muito ridícula no trem ,no banco laranja,sentada do lado do rapaz que era o seu tipo quase ideal,meio cigano-urbanóide-maluquinho-lunático e invariavelmente do signo de áries.Parecia estúpida, pois se esforçava brutalmente para segurar um riso espontâneo e do nada que brotava na sua cara só pelo fato de estar do lado dele...E me sinto tão ridícula ,que nem nesse parágrafo onde revelo estar novamente apaixonada,me sinto bem...É vergonha demais para uma robô desiludida.
           E a viagem seguira,normal,com uns beijos mal dados e saculejantes no trem,saudosos desse rapaz.Algumas revelações por parte dele,subentendidas,mas que pra uma babacona iludida se tornam emocionantes.Enquanto eu tentava esconder minha cara apaixonada por cabelos bem escuros recém adquiridos e unhas vermelho sangue que passavam um ar de mulher segura,eu sentia um puta cheiro gostoso proveniente dele,coisa que nunca, sério,nunca senti antes."Ah,ele se perfumou pra mim!" eu pensava,"Não idiota,são somente feromônios,sua cachorrinha com tesão e iludidassa!",rebatia alguma parte Do Contra da minha mente.E a mulher segura ia ficando pra trás,nas linhas da Supervia.
         Chegamos na casa dele.E aí é tudo aquilo que já foi falado,e que não vou me aprofundar,nem repetir pois senão fica parecendo porno-chanchada.Rock,MBP,mais Rock do que MPB...um gato siamês  espião que nos olhava enquanto suor ,gemido e entrega aconteciam no chão da casa do rockeiro carinhoso dos olhos tristes.
       Olhos tristes e desanimados. Extremamente sonhadores e devaneiosos.Ao sorrir se fecham pequeninos.Ao me olhar são só mistério e riso!Ao me penetrar são másculos e muito, muito sérios e escuros.Na estação estavam cor-de -mel....Mas sempre acabam por serem tristes e desanimados.Que medo...Tanto tempo que não avalio simples olhos dessa forma!Quando começo com isso pode crêr:A desgraça tá formada.
         No dia seguinte, eu acordo.Dormi nua com ele do meu lado,me segurando.Me abraçando,num colchão de solteiro,bem velho,no chão.O beijei no tórax e ele me chamou de linda,fazendo cafuné.Levantou-se correndo feito louco,trocando de roupa agitado,nessa inconstância de todos os outros 3 arianos que passaram na minha vida,que eu não consigo me acostumar.Me visto feito louca,fingindo não querer que ele continuasse ao meu lado.ODEIO me sentir assim!!!Me dá vontatde de chorar...Enquanto eu bocejo,choro.Rapidinho.E não me entendo.Ocorre uma despedida,estilo "amigos."
        Vou embora.Meio incompleta,meio vaga,muito vazia.Sempre senti muito mais do que eu gostaria.Um simples vazio se converte em imensidão.De vazio.
           Numa estação de trem eu tô sozinha.Com cabelos pretos bagunçados e unhas vermelhas descascando.Insegura.Tentando sentir uma coisa de cada vez.Tá bem ensolarado aqui.
            Deveria me sentir feliz por estar amando.Choro rios nesse momento.Desespero genuíno e Forte.Imaturo.
             O trem chega.A porta se abre.Não tem lugar.São mais de 20 estações a frente,em pé. Crianças chatas me encaram.Mulheres feias me olham.Uma viagem sem noção de ruim.2 horas de desespero e vazio."Odeio estar apaixonada."Mais um ônibus pra chegar em casa.São quase 3 horas de viagem .Eu viajando,pensando, elucubrando até demais.
"-LOSER!"
            Chego em casa meio perdida,chorando,triste,neurótica...
"-Eu estava tão no comando!"
         ...E Com medo. E Cansada da viagem ruim.De frente ao espelho concluí mais uma vez:
 "-Odeio andar de trem..."

Bú Martins
Enviado por Bú Martins em 11/08/2010
Reeditado em 01/09/2010
Código do texto: T2432048
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.