Silvia – Um Amor Marcado.
Como eu gostava dela... Existia algo que não sabia explicar, mas o que eu sentia me deixava fascinado.
Logo pela manhã ela corria lá pra minha casa. Vinha faceira e ia logo me abraçando. Ela com 8 anos e eu já aos 13.
Estávamos lendo uma revista em quadrinho, deitados sem outro qualquer pensamento. De repente passamos a ri de um desenho na revista e...
Trocamos um olhar que pareceu como se tudo a nossa volta se enchesse de energia.
Não falamos nada. Apenas ficamos ali nos fitando sem piscar. Rosto bem próximo e, uma vontade de beijar aqueles lábios crescia assustadoramente. Seus olhos verdes pareciam duas esmeraldas jorrando energias sobre os meus, como se pedisse para beijá-la.
Mas era ainda muito criança e eu já na puberdade. Achei tudo aquilo uma loucura, sem saber o que explicar diante de tanta atração.
Tomei a decisão mais sensata. Levantei-me afastando para vencer aquela tentação. Ela continuava a olhar-me. Parecia pedir para que eu ficasse.
Uma semana depois mudou-se para o Rio de Janeiro.
Anos depois fui eu que viajei para o Amazonas a trabalho. Quando retornei de férias minha irmã confidenciou-me:
- Silvia passou as férias de julho aqui. Perguntou por ti e disse que em dezembro virá novamente e quer te ver.
- Como? Não poderei ter férias em dezembro. Em julho próximo virei.
Julho chegou e novo desencontro. Desta vez pareceu bem mais longo ter que esperar o próximo mês de julho. Estaria com 21 anos e ela com 16. Nunca a esqueci e muito menos aquele dia lendo revistas em quadrinhos.
Novamente julho chegou após longos meses de espera. Estava de férias esperando encontrar Silvia. Mais uma vez ela não veio passar as férias. Viria em dezembro.
Nunca nos encontramos. Sempre desencontros. Acabei casando e indo morar em Salvador.
5 anos depois em Salvador, ela havia conseguido com minha irmã o meu telefone. Ligou-me do Rio para pedir que eu indicasse um Hotel para ela e o marido. Estariam em Salvador dentro de dois dias.
Dois dias passaram rápidos. Num piscar de olhos ali estava Silvia e o marido. Nossos olhos se encontravam. Havia emoção saltando de dentro de nós. Havia um desejo guardado desde criança.
Sem a menor preocupação, ela diz ao marido.
- Já que está com tanto sono, vou conhecer as lojas aqui por perto em companhia dele. Alguma objeção?
- Não minha querida. Vá mesmo que eu estou sem dormir direito há duas noites seguidas. Não ia suportar ficar esperando você escolher o que comprar nas lojas.
Saímos quase que de imediato. Havia pressa entre nós. Andamos em silencio por uma quadra e...
Aquele olhar veio novamente. Segurei suas mãos percebendo que estavam geladas e as beijei. Sem trocarmos uma só palavra nos aproximamos, sempre olhando nos olhos.
Ali, em plena Avenida Sete, nossas bocas se encontraram após longos anos de espera. Um beijo que começou suave e em poucos segundos parecia que devorava a nós mesmos.
A respiração estava descompassada. Nossos corpos unidos tremiam de emoção. As pessoas passavam nos olhando e nem tomávamos conhecimento delas.
Tomamos um taxi e nos dirigimos a um Motel. Pouco nos falávamos. Havia ansiedade cheia de grandes expectativas.
Foram intensos nossos beijos e caricias. Queríamos aquilo tudo que acontecia ali naquele momento. Amávamos-nos e chorávamos de emoção. Toda a emoção de anos seguidos de
tão imensa espera, estava sendo ali consumido em beijos e caricias.
Era muito forte viver aquele momento de nossas vidas, tão lindo e que nos completava. Era um querer intenso, profundo com um amor que arrebatava de nós um sentimento que vinha de dentro. Vinha de nossas almas.
- Pensei que nunca ia te ver mais na minha vida... Acho que não tive paciência em te esperar.
Ela olhou-me com seus olhos verdes cheio de ternura, passou os dedos de leve em meus lábios para silenciá-los e disse:
- Não era pra ser. Somos primos e nossos pais jamais entenderiam. Nunca te esqueci. Desde muito tempo já sentia amor por você. Não sabia o que era, mas depois descobri que te amava e o destino nos separou.
Fez uma breve pausa para acariciar meu rosto e beijar-me antes de continuar.
- Se te encontrasse nas férias ia me entregar a ti. Não saberia resistir e era o que eu queria de verdade. Chorei na minha noite de núpcias. Queria que fosse você ao meu lado.
Agora, algumas lagrimas escorriam pelo seu rosto. Bebi-as com beijos e acariciei seus seios.
- Depois de hoje, me sinto a mulher mais feliz deste mundo. Realizei meu maior sonho, mas não vou te procurar nem te ligar. Tens família e eu também. Devemos deixar que o tempo se encarregue de nos mostrar que caminho devemos seguir.
Amamos-nos novamente. Desta vez não choramos, mas o amor vivido foi intenso... Muito intenso. Sentia que a cada orgasmo era como se o universo todo nos envolvesse cheio de seus mistérios. Perguntava-me por que teria que ser assim. O que de fato seriamos além de primos e por que tanto amor teria que parar bem ali.
Quatro horas mais tarde deixei-a na porta do hotel. Não desci do carro a pedido dela. Uma despedida com beijos ainda dentro do taxi e ela desceu sem olhar para trás.
A última imagem que guardei de Silvia foi seus passos apressados em direção a porta do hotel. Nunca mais a vi. Soube por minha irmã dois anos depois, que ela separou-se do marido, mas não nos encontramos mais.
Ficou a lembrança daquele lindo encontro em Salvador. Daquele amor que nunca pode ser vivido mais que por algumas horas. Ficou a lembrança de um amor marcado para sempre em minhas memórias. Ficou a certeza que mais vale vivermos a felicidade em toda a sua plenitude por algum momento, que procurá-la por toda a vida e nunca encontrá-la.