Selvagem

Eu fiquei sozinha há mais ou menos um ano. Brigamos, choramos, tentamos novamente e novamente brigamos. Isso já vinha se repetindo há muito tempo. Até que um dia ela pegou algumas coisas e foi embora. Depois, voltou na minha ausência e pegou o restante das suas coisas. Fiquei grata por ela ter feito assim. Nós duas sabíamos que qualquer despedida seria pior. Mergulhei na escuridão.

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Foi numa noite de quinta feira, há muito, muito tempo que eu a conheci. Eu estava passeando pelo shopping, olhando as vitrines sem nenhum objetivo definido, quando a vi trabalhando de balconista numa loja de lingerie. Foi impossível vê-la ali parada, sem que logo em seguida, meus olhos não voltassem para ela. Olhei, e olhei novamente. Ela me sorriu. Caminhei pelo corredor olhando outras vitrines até que meus pés resolveram voltar. Parei bem em frente à loja e fingi muito sem jeito, olhar alguma coisa, mas o que eu queria era olhar novamente para ela. Ela veio até mim e com um leve sorriso, perguntou

-você gostou de alguma coisa que viu?

A pergunta me pegou de surpresa. Fiquei em dúvida quanto ao objetivo dela. demorei alguns segundos para me recuperar, e aí respondi sorrindo e olhando direto para ela:

-gostei sim! Só não sei ainda se vou poder levar.

-se você gostou mesmo, só não leva se não quiser. Venha comigo.

Eu entrei na loja com ela. Durante todo o tempo ela ficou falando frases com duplo sentido, com o objetivo claro de me provocar. Comprei duas calcinhas que ela me sugeriu. Eram as menores calcinhas que eu já tinha visto. Depois que eu paguei, ela me entregou a sacola e disse:

-você fez uma ótima aquisição. Eu tenho certeza de elas vão ficar lindas em você. Pretende usar para alguém especial?

Olhei para ela e vi um sorriso cheio de malícia e um olhar mais malicioso ainda.

-talvez, quem sabe ainda hoje..........se a pessoa pedir com jeitinho!

Desta vez fui eu que respondi olhando para ela e sorrindo de forma maliciosa. Eu já estava de saída, quando de repente perguntei meio sem pensar:

-que hora você sai?

-às vinte e duas no portão nove.

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Agora eu não queria ver ninguém. E por dias não falei e não vi. Depois, tive que voltar a falar com as pessoas, mesmo não querendo. Não existe alternativa. Mas era como se eu mesma não estivesse presente. Parecia que existia outra mulher falando através de mim. Quis me mudar dali para não sentir aquela sensação renitente, de que a qualquer momento ela entraria correndo na sala e saltaria sobre mim como uma gata selvagem. Me derrubaria no chão e começaria me beijar. Mas não me mudei. Daria muito trabalho. E eu queria ficar quieta, só ficar quieta. Eu me perguntei um dia: se o amor é uma coisa boa, porque somos castigados de uma forma tão dolorosa por perdê-lo? A resposta veio nos dias que se seguiram: eu não perdi o amor que tive, ele continua a existir, apenas tenho de conviver agora com a ausência dele.

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Ela entrou no meu carro como se estivesse sendo empurrada por um furacão. Usava um vestido curtinho e bem rodado, com a cintura apertada bem embaixo dos seios, que deixava ela muito sexy. Quando ela praticamente pulou para dentro do carro, seu vestido subiu totalmente, ficando todo embolado na altura da cintura dela, deixando à mostra suas lindas pernas, e o pequeno triangulo branco da sua calcinha. Ela entrou rindo e me olhando com o mesmo olhar que eu tinha visto lá na loja. De repente sem nada dizer ela pulou sobre mim e me beijou. Ela subiu no meu colo, montando em mim com as pernas abertas, e me enlaçando com seus braços sem em nenhum momento soltar minha boca dos seus lábios. Sua boca na minha boca, suas mãos no meu corpo me fizeram perder um pouco a noção do tempo. Parece que foi muito e parece que foi pouco. Quando ela me soltou havia menos carros no estacionamento do shopping do que quando ela me pegou. Estávamos ofegantes e minha blusa tinha sido rasgada em um dos lados. Suas mãos haviam arrancado meu sutiã e arrebentado uma das laterais da minha calcinha. Eu sentia minha boca entorpecida e um pouco inchada pelos beijos dela. Mas ainda não estava satisfeita. Nunca consegui ficar. Enquanto ela continuava a me beijar repetidamente e rapidamente me olhando nos olhos e a respirar muito forte, eu liguei o carro e fomos embora.

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O tempo foi passando e como não podia deixar de ser, a dor foi ficando menos latente. Ficava escondida bem no miolo do meu coração. Já não pensava nela o dia todo, apenas, de vez em quando, meu pensamento ia buscar uma lembrança doce. E eu sentia novamente uma agulhada no peito. Mas eu sabia também, que o fundo do poço já tinha ficado no passado. Comecei a sentir um pouco de paz. Fazia muito tempo que eu não sabia o que era isso. Quando estávamos juntas, nunca tivemos paz. Nós duas sempre guerreamos. Fosse nas discussões quase diárias, ou fosse no amor, que entre nós, era quase sempre uma batalha campal. Por isso mesmo nossos momentos foram tão bons. Sempre de uma intensidade indescritível. Mas o preço cobrado por uma relação assim, acaba sendo alto. Vivíamos sempre no fio da navalha.

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No meu quarto, seus beijos vieram mais suaves. Mais saborosos. Mais molhados. Se espalharam pelo meu corpo. No meu quarto finalmente eu pude olhar para ela como eu queria, e me deliciar com a sua beleza moleca, embora ela nunca ficasse parada para eu poder gravar todos seus contornos na minha memória. Finalmente eu pude beijá-la. Eu pude beijá-la. Brinquei no vale dos seus seios, no redemoinho do seu umbigo e fui em busca da minha saciedade no encontro das suas coxas. Ali encontrei uma bucetinha toda depilada, linda, carnuda e perfumada. Eu senti que por minha própria vontade, nunca mais sairia dali. Fiquei por minha vontade e pelas suas mãos que me prendiam naquela posição. Só então eu a senti ficar quase imóvel enquanto eu absorvia o seu dom de me fazer feliz. Sua imobilidade foi sendo substituída por um movimento leve, depois forte, depois intenso e no final desesperado. Senti suas coxas me pressionarem muito forte enquanto suas mãos enterravam minha cabeça entre elas, quase me sufocando. E então com um grito rouco e longo ela se jogou de costas toda tremula, sobre a cama. Nossa luta daquela noite estava começando. Não demorou mais que alguns segundos, e ela já estava segurando minhas mãos para traz, de forma a ter meu corpo todo à sua disposição. Ela me segurou com força, e me torturou com seus lábios.

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Com a paz chegando mansamente, eu sem perceber fui saindo da sombra. Fui em busca do sol. O brilho dele ainda me maltrata, mas estou conseguindo enfrentá-lo. Há alguns meses eu estava caminhando no calçadão da praia, quando vi uma garota correndo na direção oposta à minha. Fiquei olhando-a distraidamente, enquanto ela vindo na minha direção. Ao passar por mim, ela me olhou direto nos olhos por alguns segundos, e um sorriso rápido passou pelos seus lábios. Continuou correndo e foi embora. Parei minha caminhada e me peguei sorrindo ao lembrar daquele olhar e daquele sorriso. Quis voltar e ir atrás dela, mas não a vi mais. Mesmo assim continuei com meu sorriso. Ela havia me olhado. Olhado diretamente para mim! Pensei comigo: estou voltando! Alguém me viu. Parece que aquele tempo em que eu fiquei transparente, estava acabando. Na verdade eu me fiz transparente durante esse tempo. Ao chegar em casa, senti vontade de vestir alguma coisa bem legal e sair à noite. Mas era muito avanço por um olhar e um sorriso. Aquele sorriso iluminou meu dia, mas à noite, eu sabia que haveria sombras.

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Nunca houve um dia sem luta, mas também nunca houve um dia sem guerra. Discordávamos de tudo. Tínhamos ciúme de tudo(eu e ela). Eu ficava acordada à noite para vigiar seu sono. Queria saber o que ela sonhava. Queria saber se eu estava nos sonhos dela. Queria impedi-la de sonhar sonhos nos quais eu não pudesse estar. Sem querer eu estava roubando dela o que ela tinha que mais me encantava, que era seu jeito espontâneo de menina sapeca. E ela tinha tirado definitivamente minha paz. A cada cobrança minha, ela se tornava mais rebelde. Não me contava mais nada. Ate que um dia, ela não voltou no final da tarde. Só chegou na manhã seguinte. Eu senti como se es tivessem arrancando um pedaço de mim.

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Voltei a freqüentar a praia. Passei a correr todo dia na areia. Fiz amizade com um pequeno grupo e corríamos diariamente, sempre no finalzinho da tarde. Depois sentávamos na areia para conversar e beber água de coco. Estava ficando feliz. Nós somos interessantes como pessoas. Quando alcançamos uma sensação de felicidade, logo em seguida começamos a ansiar por alguma coisa, que não temos no momento, só para não nos sentirmos totalmente felizes. Eu voltava sempre a pensar naquele sorriso. Eu precisava dele. Foi com o sorriso dela que eu senti que estava voltando à vida.

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Fizemos as pazes, e ela me perseguiu pelo apartamento rindo e gritando enquanto arrancava minhas roupas. Beijos, lágrimas, toques, recomeço, prazer, beleza. Muita beleza. Nunca vi tanta. Seus seios como frutas candentes sendo oferecidas a mim. Bicos sendo passados lentamente nos meus lábios, e não sendo permitido que eu os engolisse. Tortura e graça. E no dia seguinte a realidade dos nossos temperamentos, nos trouxe de volta o inferno da incompreenção. Até que ela se foi.

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Numa manhã de muito sol, eu voltei a ver a moça do sorriso. Passou correndo por mim e não me viu, mas desta vez eu pensei rápido e corri atrás. Comecei a correr ao seu lado, e ao me ver ela sorriu novamente para mim. Eu não consegui acompanhar seu ritmo por muito tempo e tive que parar. Ela prosseguiu por alguns metros e depois retornou até onde eu, parada e com as mãos apoiadas nos joelhos, tentava respirar. Ficou me olhando e sorrindo. Depois disse maliciosa:

-você tem que correr mais se quiser conseguir alguma coisa.

Eu consegui sorrir recuperando o fôlego e disse:

-estou atrás de você!!

gilsi.35795@yahoo.com

Gilsi
Enviado por Gilsi em 16/06/2010
Reeditado em 24/06/2010
Código do texto: T2322693
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