O libertino e a prostituta
Se me perguntassem
há algum punhado de anos
como nasce o amor,
eu não saberia dizer.
Se me perguntassem enquanto eu
passava pela minha
sebosa adolescência,
eu responderia que os amores são frutos das macieiras
e de toda a doçura cabível no mundo.
Mas hj,se me perguntarem hj,
de qual berço nasce o amor
eu lhes contaria uma história:
A historia do amor entre um libertino e uma prostituta.
...
Fazia um frio regular na cidadezinha de Browkin,
era fim da tarde
e o sol ja se despedia sonolento.
Numa rua qualquer, em um prédio marrom desbotado,
sentado numa cadeira não menos feia,
uma figura de blusa branca
e cabelos revoltosos observava a rua.
À mão, pena e papeis avulsos.
na cabeça, idéias borbulhavam como sopa quente
enquanto os olhos se mantinham fixos, grudados no contexto da pacata ruazinha.
Golava um pouco do vinho
e voltava ao papel,
no papel se perdia, as palavras sumiam.
Era so ele, a vontade de escrever e a cor pálida do papel.
-Maldito trio-.
Se não fosse o branco,
e a temida falta do que escrever
ele não teria tido o infortúnio
de ver a criatura fogosa que passava apressada.
De imediato, levantou-se cambaleante
de sua confortável cadeira
e pos-se a observar
a bela moça desconhecida.
Ela tinha cabelos compridos e escuros
e tinha também uns lábios vermelhos,vermelhos.
Carregava um cesto de maçãs,estas, já
desbotadas, diante dos vivos lábios.
Ela usava uma saia comprida,que se estendia até os pés
e um corpete apertado
que lhes fazia saltar da roupa os seios fartos.
E que colo macio ela parecia ter...(ele pensou)
Ele ja não sabia
se voltava ao papel,
se sairia a caça dessa cigana, ou simplesmente continuaria ali.
Assim, como estava.
Permaneceu.
Não por vontade de ficar,
mas pela impossibilidade de se mover.
Havia sido surrado
na noite anterior.
Consequência
de uma mente devassa
e de um dom poético inacreditável.
Sua pele era um mapa
de pesadelos em carne viva.
Ele ainda podia sentir o sangue incessante pulsar quente.
Ela ja havia sumido dentro da neblina densa.
e teve todos os passos que dera na rua Fiups
acompandos pelos olhos escuros,encantados e desejosos do libertino.
Ele sentou-se novamente
esboçando um sorriso normo,
tomou outro gole do vinho frio
e desvirginou o papel ja amassado.
Pos-se a escrever sobre a desconhecida,
sobre a mulher que era apenas: cabelos,lábios,seios e maçãs.
Escrevia, pensava, apagava.
Às vezes apagava antes mesmo de escrever.
Em atos impensados, apagava o próprio branco, feria o papel.
Apagava pensamentos.
As horas corriam
e a tarde ia embora.
A noite ai ja descia com seu manto escuro
bordado com diamentes luminosos.
Vencido pela frouxidão de suas palavras
e pelo instinto pulsante de um homem
cobiçoso, deixou o varanda.
Com cabelos ainda desgrenhados
e roupas ainda manchadas de sangue, ele saiu.
A lua fria continua suspensa,
costurada num céu avermelhado e as ruas ja estavam vazias,
quando ele dobrou a primeira esquina e entrou num bar.
Homens, sexo,
bebida,jogatina, cigarros e poesia.
Ali, seu canto preferido
era mais a sua casa do que qualquer outro lugar.
Chegou, sentou e bebeu.
Uma mulher velha e pelancuda lhe ofereceu
cigarros.Ele negou.
Lhe ofereceu sexo, foi ignorada.
Naquela noite,
o que ele precisava era de alguém.
Não de alguma coisa, como mulheres velhas lhe oferecendo cigarros ou seios.
Sentado e já cansado
com a cabeça latejando,ele resolveu ir embora.
Quando de repente a música parou de tocar
e todas aquelas vozes agudas deram lugar a um silencio
confortável.
As pessoas congelaram
quando ele viu entrar pela porta descascada
a figura por quem havido se encantado.
Linda como o sol.
Não, não, linda como o lua.
Besteira, linda como...só, linda!
As pupilas dele vibraram com a vista
daquela mulher
enquanto ela o fitava interessada.
O ambiente ao redor, tudo, tudo
havia parado.Até mesmo o ar circulava retraído
com aquele encontro.
Ele se aproximava
e ela ia.
Ele a olhava
e ela correspondia.
Ela sentia nele alguma coisa diferente,
alguma coisa
que não via nos outros,
não era só um olhar admirado.
Pq ele a olhava com respeito e até delicadeza.
Ele tinha uns olhos tristes,expressivos,
remetiam tanto calor...
Ela pode sentir na pele
aqueles olhos deslizantes.
Caminhou até ela
e sem dizer palavra, segurou em sua cintura
e a levou embora.
Caminharam calados pelas ruas
que agora, pareciam pegar fogo
e subiram até o quarto empoeirado o qual ele chamava de casa.
Ela chegou,
sentou na cama e suspendeu o vestido, abrindo as pernas.
Ele sentou ao lado.
E não seria exagero dizer,
que de tanto observa-la ele chegou a ver seus orgãos internos.
Porém, esticando seus longos dedos calejados ele
abaixou o seu vestido dela
e a beijou.Somente...
Nascia ali o amor.
Da poesia que eles viviam naquele momento.
Da recusa dele
e da infinita beleza e paz que partia dela.
Vendo-a a meia luz,
durante quase toda a noite,
ele dormiu sob o corpo marcado da prostituta.
Ela lhe acariciava
e esboçava sorrisos tímidos.
Na manhã seguinte,
antes da bela moça abrir seus olhos esmeralda.
O libertino caminhou até a varanda e rasgou os papéis
que havio escrito.
Entendeu ali, que a melhor poesia é a vivida.
O sol voltava a brilhar.
Ainda frio, com o início da manhã.
Porém, mais forte.
...