PAI E FILHO

Sentados no banco do jardim todo florido, com muitas árvores, pássaros cantando, um pai já vivido em anos contempla o filho bem vestido, Doutor, que lia o jornal do dia sem lhe dar a mínima atenção.

O pai então, vendo um passarinho num galho, pergunta ao filho:- filho, que passarinho é este? responde o filho meio contrariado ao ter sua leitura interrompida. Pai, é um pintassilgo e fica quieto.

Novamente o pai interrompe sua leitura ao ver um lindo beija-flor chupando o néctar das flores e pergunta:- filho, que passarinho é este? Pai, é um beija-flor e continua sua leitura.

Nisto um Bem-Te-Vi pousa noutro galho e solta seu canto estridente.

Filho, que passarinho é este? É um Bem-Te-Vi demonstrando já uma certa irritação. Outro passarinho canta bonito no outro galho e o pai interrompe novamente o filho, entretido em sua leitura.

Filho, que passarinho é este que está cantando muito bonito? É um sabiá laranjeira, e pede ao pai que não interrompa mais sua leitura.

Nisto, um esquilinho esperto desce pelo tronco da árvore e apanha rápido uma castanha e sobe ligeiro sumindo no meio das folhas.

Filho, que animalzinho é este que desceu pelo tronco tão rápido e já subiu, levando uma castanha? Nisso, o filho demonstrando muita irritação, fala ao pai:- é um esquilo, velho, você conhece, porque fica me perguntando as mesmas coisas repetidamente?

O pai, com a cabeça baixa, se levanta, vai até a biblioteca, pega um diário, traz ao filho e fala:- leia, filho, porque quando você era criança perguntava muitas e muitas vezes que passarinho é este e eu respondia todo orgulhoso:-É um sabiá laranjeira, que canta no alvorecer, e seu canto tão lindo deixa a natureza em silêncio, gosta de bicar as laranjas, que é seu alimento e por isso, tenho muitas laranjeiras para ele vir até aqui, cantar e depois se alimentar.

Que passarinho é este pai? É um joão de barro, vem até nosso quintal catar uns gravetos para juntar com barro e fazer sua casinha, está vendo bem ali, escondidinha entre os galhos?

Depois de pronta, ele vem com sua namoradinha fazer seu ninho e depois que ela bota os ovinhos, os filhotinhos nascem e assim sua espécie nunca se acabará. É o arquiteto da natureza, meu querido filhinho. Que passarinho é aquele, pai, voando, parando no ar, enfiando seu biquinho no meio das flores? É um lindo beija-flor, ele se alimenta do néctar das flores, parecendo um doce mel e no biquinho leva para outras flores o pólen, fazendo que muitas lindas flores venham enfeitar nosso jardim tão bonito, pois esse pózinho faz elas se multiplicarem.

Que bichinho é aquele que está descendo do tronco da árvore para pegar aquela castanha que o senhor deixou no terreiro? É um esquilinho que móra bem na copa dessa árvore tão bonita, que dá sombra para a gente se sentar neste banco e ficar batendo um papo tão gostoso, viu seu tagarelinha? Depois, quando era noite, levava você para sua caminha, contava muitas histórias, seus olhinhos brilhavam até que devagarzinho eles se fechavam e o sono vinha rápído, e eu ficava olhando seu rostinho tão maravilhoso por muito e muito tempo, até apagar as luzes e fazer meus afazeres, porque eu queria que você se formasse um Doutor.

O filho deixou seu jornal, leu o diário bem cuidado, as páginas um tanto amareladas e toda a sua vida estava ali, desde quando nasceu, foi criança, adolescente, estudante, adulto, até se formar um Doutor, competente, honesto, orgulhoso de sua profissão.

Lágrimas então foram derramando pelo seu rosto e quando terminou, olhou fixamente para aqueles olhos azuis já cansados, o rosto com rugas, perfil de homem sem as vitalidades que ele lembra tão bem, brincando de lutar, oferecendo seu ombro para cavalgar como se fosse um cavalinho, apostando corridas e fingindo sempre perder, pescando no rio de água cristalina e muitas brincadeiras tão gostosas, que ele lembrava tão bem, para sempre guardadas em sua memória.

Levantou-se, chorando copiosamente, abraçou seu pai demoradamente e afirmou:- Meu velho, meu querido velho, me perdoa pela minha arrogância, minha impaciência, minha falta de educação e pode ter certeza, neste banco de jardim, de hoje em diante, vamos ter muitos papos para recordar tudo de bom que você me transmitiu e me fez homem de caráter, honesto, com um diploma de Doutor em minhas mãos, enquanto você só teve o curso primário.

Assim termina meu conto, que muitos filhos deveriam ler para jamais tratarem seus pais com desprêzo, como se fossem descartáveis, chatos, fóra de época, impertinentes, que só atrapalham porque hoje estão velhos, mas que fizeram sacrifícios para que eles tivessem um futuro melhor, muito diferente do que viveram, com calos nas mãos, trabalhando duro para com muito orgulho dar-lhes um diploma e serem Doutores.

21-05-2010