SOLIDÃO
Ela queria simplesmente ter a atenção do marido, como sempre mereceu. Isso por que já não bastava à falta de compreensão em que ambos vem sofrendo há quase um mês. Por mais que ela tenha razão, sofria ao máximo, só de pensar que o companheiro poderia estar tendo outro relacionamento com uma mulher diferente a ela. Outra mulher, que podia oferecer aquilo que ele não tinha há muito tempo: o prazer. Não queria que isso viesse ocorrer, de modo que ela perdesse o tamanho amor e reconhecimento que ele sempre teve a sua pessoa. Fora o bastante em pensar, em como sua vida estava tomando rumo, em um caminho desastroso. Só queria ficar só, encolhida por algum canto da casa, sem ter a atenção de ninguém. Sentia que estava desfalecendo. Sentia que poderia nunca mais ser como antes. Uma mulher feliz, com um marido que a amava absolutamente ao ponto de no futuro ter uma família em que possa depositar o seu carinho, afeto e amor. O tão conhecido amor.
Onde ele poderia estar agora? Perguntou-se para si mesma, após sentar-se no sofá e ficar encolhida, com uma caneca de café na mão. Ficou olhando, sem reação nenhuma, para um extremo ponto do ambiente do apartamento. Não tinha mais idéia de como agir, diante de tudo. Fora como um tsunami de conflitos desconfortantes. Seus olhos lacrimejaram estáticos. A pele, porém, já não tinha mais a luminosidade como antes. Estava pálida, e sem vida. Susie, já não tinha disposição nem mesmo para cuidar de si mesma. Lá fora, a movimentação cotidiana, já se passava apenas como um pequeno barulho, num deserto infinito. Ao lado o telefone tocava a todo instante, sem atender. A voz da secretária digital soando pela sala, fazendo com que as pessoas deixassem recados como: - Alô Susie, aqui é a Mari. Por onde você anda? Tentei falar com você várias vezes. Por favor, ligue pra mim. Tchau!
Click... - Josh falando! Hei Susie, o que houve? Você não comparece ás reuniões há dias. Aguardo seu retorno. Click... -Susie! Susie, cadê você? Liga pra mim. Estou preocupada, Lyla. Click... Ficou sentada, ereta, escutando os recados. Bebericou um pouco do seu café, e se levantou lentamente, indo até a janela, parando devagar. Queria poder andar pelas ruas novamente, mais não conseguia. Estava sendo prisioneira dentro de sua própria casa. Por outro lado, imaginava se as pessoas (tanto amigos como amigas) estavam realmente preocupadas com sua ausência constante. Será que eles mesmos importavam tanto assim com ela? Ou simplesmente fora fruto de interesse deles? Não conseguia achar respostas para essas e entre outras perguntas. Não tinha forças. Não tinha mais nada. Só a solidão.
Satirizava-se pela sua vida levada a desgraça. A dor de ser portadora de um câncer, na qual não esperava obter. Para Susie naquele instante, era o fim. O final de tudo. Ao ver por sobre os vidros da janela, o céu azul lá fora, previu que dali, nas próximas horas não existirá mais. Seguira para outro plano, onde só poderá encontrar luz, ou quem soubesse a escuridão. As lágrimas já não era mais surpresa para sua alma. Já vivenciando dias e noites a perda do amor do marido e a companhia da doença, Susie só pensava em uma coisa: A morte antecipada e instantânea. Antes que pudesse agir, voltou-se para o interior da sala, deixando a caneca de café na mesa de centro. Andando pelos corredores, rumo ao quarto, foi logo trocando a roupa. Colocando um traje mais despojado e vívido, ao se passarem poucos minutos, lá estava ela novamente sobre a sala. Pronta para partir. O que iria fazer? Só no instante seguinte iria decidir.
Foi de novo em frente à janela, abriu-a escancaradamente, e sentiu o vendo semi-árido bater em seu rosto. Nervosa e muita aflita chorava sem ao menos dizer adeus a alguém. Levantou uma de suas pernas, e tratou-se logo de subir no vão da janela. Estava pronta para pular. Estava pronta para partir. Ao cinco segundos e poucos milésimos, Susie esticou seus dois braços, agarrando-se sobre as grades da janela. Deu um passo a frente, sentindo uma forte vertigem se intensificando à medida que fechava os olhos, quando de repente uma coisa inesperada fez com que ela parasse rapidamente ante o ferro gelado e escorregadio da janela, que gemeu sinuosamente. Um novo click soou no ambiente, e uma voz masculina veio lentamente aos seus ouvidos, vindo do alto-falante. Era George. O marido.
-‘’Susie. —Disse hesitante. —Sou eu, George! Quero dizer que... Que sinto muito por tudo. Gostaria de poder estar com você agora... Mas sabe como é. Tive tantos problemas ao longo desses mesês que... Que nunca dei atenção que você sempre mereceu. Em relação a... Bem você sabe do que quero dizer. Quero lhe falar que tenha forças. Muita força, Susie. George deu uma pausa no instante seguinte que foi possível escutar o breve chiado da linha ao fundo. Susie do outro lado recaia num mar de lágrimas profundamente, trêmula. —Se lembra quando eu te disse que tudo seria passageiro? Que tudo iria melhorar? Pois então... Sei que está me ouvindo agora, e sei que tudo vai se resolver. Enfim, não vou tomar muito seu tempo, eu preciso voltar ao trabalho, mas quero te dizer uma última coisa, Susie. Antes de eu ter deixado este apartamento, você achava que eu estava com outra mulher, mais saiba que não. Depois da noticia de sua doença, eu não consigo pensar em mais em nada, além de você. Estava com medo de que, eu pudesse atrapalhar em alguma coisa. A verdade era que eu na medida do possível, viesse a não conseguir cuidar de ti, como você merece. Iria me sentir um incompetente. — Ouve-se fungadas. George começa a chorar. — Me perdoa Susie. Me perdoa.Esse tempo todo fui um completo fracassado! Bem, é isso... Antes da ligação ser finalizada, Susie descontroladamente desceu a janela, indo até o telefone. Pegou em disparada, antes que George desligasse e... Click. A ligação caiu. Mesmo assim, Susie continuava com o fone na mão, chorando. Não acreditando na ligação inesperada do marido. De seu desabafo. — George! George! Eu... Eu te perdôo. — Caiu desajeitamente sobre o tapete da sala, completamente exausta e compulsiva. Deitou-se estendida, e começou a olhar para o teto de olhos arregalados, enquanto a depressão completa a tomava conta. Dali por diante foi só sonho. Um sonho a espera do marido, que um dia nunca mais voltou.