Lótus
Muitos anos depois, recurvado sobre o túmulo, haveria de lembrar do perfume adocicado de Lótus que aqueles cabelos ruivos, selvagens, traiçoeiros e promissores emanavam.
Monte Verde era incrivelmente frio e romântico no mês de Julho.
Os enamorados gostavam de ficar na varanda sentindo o vento envolver-lhes com aquele sopro gélido, para depois aninharem-se debaixo dos cobertores: os corpos mudando de temperatura e esquentando-se gradualmente.
O fim de semana estava quase no fim. Ela sabia que uma amante não tinha direito de exigir exclusividade, era condenada a contentar-se com uma pequena fatia do amor. Por saber disso que durante anos, tornou daqueles os momentos mais intensos, mas nos últimos meses a realidade havia mudado.
O segredo que guardara deveria ser quebrado naquele domingo: Teria que contar a verdade, mesmo que o ferisse.
Após relaxar na banheira deitou, ainda com os cabelos molhados, no sofá da suíte. Chamou-o e graciosamente tomou-lhe as mãos, prendeu a respiração e disse a frase, carregada de pesar, que mudaria completamente o curso da vida de ambos: - Meu amor, eu estou morrendo.
Ele não a questionou e consentiu, mas por dentro a dor corroía-lhe as entranhas. Beijou-a na boca pela última vez e adorou cada centímetro do corpo feminino que tanto o encantava, desejando tê-lo para sempre.
Tomada por aquele momento penoso e com o coração aos prantos, ela tentava manter a face serena, disse o quanto o amava e que queria ficar apenas envolvida no calor dos teus braços. Minutos silenciosos depois, selou as pálpebras e caiu em um sono eterno.
Durante horas, seu corpo foi banhado por centenas de lágrimas aflitas, derrubadas por aquele homem que estava fadado a sofrer por amor até que a sua própria morte cessasse aquela angústia.