APNÉIA
Jogou na fonte uma moeda aguardando a realização do pedido recém formulado. Se fosse antigo o desejo, talvez não houvesse tanta ânsia. Debruçada sobre a fonte, observando a moeda, cuidando para que nenhum mendigo viesse furtar sua fé, ansiava pela rápida realização.
O mendigo arremessou a mulher para dentro da fonte. Não era justo ela vestida daquela maneira, possuindo como possuía, se debruçar daquele jeito para tomar para si o desejo de outros.
O desejo do mendigo era matá-la por que um dia ele também fez um pedido e ninguém estava interessado em saber qual era. Ao contar sobre o pedido, as pessoas rapidamente guardavam as moedas nos bolsos para arremessá-las apenas depois que ele se afastasse. Desejava matá-la porque, de certa forma, seu pedido ainda estava ali, ainda aguardava que se concretizasse.
Cabeça submersa, ela segurou com último suspiro, com a força suficiente para que não lhe escapasse das mãos, sua moeda em meio às outras. Pediu novamente, resoluta. Era mesmo de sua vontade — e agora tinha certeza —, então que viesse lenta.
Morreu aos poucos.
Pouco a pouco o mendigo puxava a mulher. Aos poucos para ter certeza de que não fingia como tantos outros fingiram.
Realmente, estava morta! Certificara-se que não havia mais vida ali beijando os lábios frios da mulher morta.
Beijando os lábios, certificara-se de que não era ela. Experimentara e novamente não teve o desejo realizado. O gosto ainda não era o que lhe faria recordar a esposa morta. Faltava ainda o sal, mas o mar estava tão distante e, afinal de contas, ninguém se debruça sobre o mar.
A mulher se debruçara sobre o desejo atendido. Sem o homem que lhe fazia segura, melhor ser agarrada pelos pés, mergulhar no fundo da desilusão, ser dramática o suficiente para desejar morrer por não haver como tê-lo de volta. Melhor morrer de um amor-romântico-absurdo que pedir em moedas para sentir o seu gosto e vê-lo dissipado na água, prendendo a respiração a cada engano de costas.