Uma história romântica

Ela apareceu assim, der repente.

Fazia anos que não a via, porém, todo esse tempo desapareceu quando ela sorriu... o mesmo sorriso tímido de que eu me lembrava.

Depois de um abraço demorado e beijos no rosto, conversamos sobre a vida. Ela me contou que tinha duas filhas e que estava separada. Estava no centro da cidade procurando emprego. Eu lhe contei que também estava separado e que tinha dois filhos.

O tempo todo em que conversamos, nossas mãos ficaram entrelaçadas, com leves apertos... eram carícias que nunca fizemos quando éramos jovens.

Tirei alguns retratos dela sozinha e depois comigo no meu celular.

Trocamos os números de nossos telefones e prometemos manter contato.

E assim como chegou, ela partiu... voltando e saindo da minha vida mais uma vez.

Peguei o telefone e fui ver as fotos. Revendo novamente o seu rosto, e as fotos que tiramos juntos, o meu coração disparou... a mente viajou pelas lembranças do passado e por possibilidades de como poderia ter sido.

Ela, era muito certinha e recatada. Não dava confiança para ninguém e eu era o que se chamava na época de “popular”.

Eram universos muito diferentes, mas que ocasionalmente se encontravam na escola em que estudávamos, entre as horas da entrada, saída e do recreio. Olhares se encontravam e se desviavam rapidamente, rostos que coravam e sorrisos disfarçados, davam o ar mágico à aquele flerte não declarado e não assumido, que duraram até o dia em que ambos completaram o ginasial e nunca mais se viram.

A minha mente viajou mais longe... imaginei a gente se reencontrando e dando vazão à aquele sentimento que não teve vez no passado.

Não fomos namorados. Nunca nos despedimos. Mas tínhamos uma história mal-resolvida.

Sai desse mundo de sonhos alucinantes e balancei a cabeça.

Não. Isso foi à muito tempo atrás... eu já havia tido a minha cota de desilusões amorosas e ainda haviam cicatrizes no meu coração... cortes bem profundos, que me deixavam com o pé atrás em qualquer relacionamento.

Ela já deve ter passado por poucas e boa também – pensei.

Não – balancei a cabeça negativamente, como que para convencer à mim mesmo da loucura que era tudo aquilo. Eu pelo visto, não havia perdido a mania de fantasiar... mas a verdade era uma só: aquele encontro inesperado mexeu comigo.

Decidi não pensar mais naquilo... sufocar aquele devaneio para não me ferir de novo, alimentando esses sentimentos guardados por tanto tempo.

Qual não foi a minha surpresa, quando uma semana depois, para o meu espanto, o celular tocou e quando olhei no visor externo, vi o nome dela piscar na tela.

Tremi. O estômago embrulhou e tudo aquilo que eu levei uma semana para esquecer, voltou com a intensidade de um vulcão em erupção.

Voltei à mim no terceiro toque... atendi com um “alô” desajeitado e com a voz firme igual à um rádio fora da estação. Ela perguntou por que a minha voz estava estranha e eu respondi que estava resfriado.

Mas procurei me controlar e lhe perguntei se estava tudo bem e ela me respondeu que sim, e que havia conseguido arrumar emprego no centro da cidade. Perguntou que horas era o meu almoço e eu lhe respondi que almoçava ao meio-dia. Ela me disse que era no mesmo horário que o almoço dela e que queria almoçar comigo no seu primeiro dia de trabalho.

É claro que eu aceitei na hora e combinei de encontrar com ela num restaurante que eu conhecia – e que não era muito caro.

Ao meio-dia, saí do meu trabalho e fui andando depressa ao restaurante. Cheguei primeiro do que ela e fiquei andando de um lado pro outro, impaciente.

Ela chegou minutos depois e se desculpou pelo atraso. Nos beijamos no rosto e entramos no restaurante de mãos dadas.

Depois que nos sentamos e pedimos nossos pratos, eu a parabenizei pelo trabalho e conversamos sobre o novo emprego durante o almoço.

- Recepcionista – ela disse – não é grande coisa, mas já é um começo, não?

Concordei com um aceno de cabeça. Após terminarmos de almoçar, caminhamos pelas ruas do centro da cidade e fomos parar na Praça Tiradentes. Nos sentamos num dois bancos da praça e falamos sobre os filhos, sobre a vida e assuntos banais.

O despertador do meu celular tocou, me avisando que faltavam dez minutos para que eu voltasse ao trabalho. Olhei para ela e ela me devolveu o olhar, mas logo baixou sua cabeça. Voltávamos no tempo, para os jogos de olhares da nossa juventude. Ficamos quase um minuto em silêncio... um silêncio ao mesmo tempo tão constrangedor e cheio de significados.

- Tenho que ir – murmurei.

Ela levantou a cabeça e nossos olhares se encontraram novamente.

- Eu sei – ela respondeu em voz baixa – eu também.

Levantamo-nos e nos abraçamos... e esse abraço demorou mais tempo do que o necessário à uma despedida. Foi um abraço diferente, sem a formalidade do primeiro... os corpos se encontraram totalmente e não houve resistência de ambas as partes para evitar que isso acontecesse. Havia uma entrega naquele abraço.

E então, lentamente os rostos foram deslizando... olhos fechados, respiração suspensa, um leve estremecimento... e os lábios se encontraram suavemente. Um beijo doce e inocente.

Depois de alguns momentos, eles se abraçaram mais forte e afrouxaram um pouco a pressão... os corpos foram se separando devagar, os braços deslizando um no do outro até que as mãos se encontraram e depois os dedos se tocaram e se desvencilharam.

Houve um breve olhar sem adeus e ela se virou e foi embora. Fiquei observando ela partir e sumir numa esquina.

Lembrei de olhar para o relógio do celular: faltava um minuto para eu voltar ao trabalho. Saí correndo em disparada pelas ruas da cidade. Parecia um louco, desviando dos carros, dos pedestres e das bancas de camelôs. Me sentia um colegial, um adolescente inconseqüente, um tolo radiante com o primeiro beijo.

Cheguei todo suado e ofegante no trabalho – mas consegui chegar no horário. Depois que a respiração acalmou e desacelerou um pouco, foi que eu pude pensar no que aconteceu.

Uma loucura... um sonho... mas foi real. Foi de verdade.

Mas o meu coração, começou a dar o sinal de alerta. Os medos e as feridas do passado, queriam que eu desistisse de tudo aquilo.

“Você já se machucou demais” – dizia ele – “É melhor parar enquanto é tempo” – insistia.

E eu fiquei com medo... com medo de que tudo acontecesse de novo, de me entregar à alguém, confiar de novo numa pessoa, só para ver tudo se repetir.

O dia passou e eu fiquei assim, meio desligado de tudo. Dentro de mim, uma luta feroz era travada... e o campo de batalha, era o meu coração.

Fui para casa e não consegui dormir. Cheguei no trabalho mal, com sono e cansado. Estava de mal-humor e respondia à todos rispidamente. Ninguém entendeu o meu comportamento, pois sempre era educado e atencioso com todos.

Olhei para o telefone. “Ligo ou não ligo?”. “Ligo ou não ligo?” – a cabeça doía – “Não” – respondi à mim mesmo – “Não vou ligar... mas e se ela me ligar? O que eu faço? Atendo ou não atendo?”.

A minha cabeça cada vez doía mais. “Ai, caramba... estou ficando louco... louco. Estou falando comigo mesmo. É o principio da loucura... o que vem agora? Virar um zumbi, sem dormir ou comer?”.

O dia custou à passar... não almocei e fiquei com a cara amarrada pelo resto do dia.

Fui para casa. Estava transtornado... o que eu estava fazendo? Eu sou um idiota... sabe quando uma oportunidade dessas acontece na vida de alguém? A primeira oportunidade de ser feliz em anos e eu a joguei fora por causa do medo de me envolver de novo... e o que isso me adiantou?

No outro dia, ele tomou a sua decisão: ia telefonar pra ela, sim. Decidiu arriscar tudo, pois não tinha mais nada à perder.

Quando deu dez horas, ele telefonou para ela. O telefone tocou uma, duas... no terceiro toque, ela atendeu:

- Oi – disse ela.

- Oi – ele respondeu – Tudo bem?

- Tudo... e com você?

- Não sei... mas quero descobrir. Gostaria de almoçar comigo?

A linha ficou muda do outro lado. E a voz do seu coração, soou zombeteira: “Viu? Eu avisei... está bancando o idiota”.

- Sim – a voz do outro lado respondeu – Sim, eu aceito... no mesmo lugar?

Dessa vez, a voz incômoda que vinha do coração machucado, não disse nada.

- Sim, no mesmo lugar – respondi com voz radiante.

- Te espero lá então.

- Ok... um beijo.

- Um beijo – ela respondeu e desligou.

Nunca a hora do almoço demorou tanto para chegar... mas chegou. Meio-dia, ele saiu correndo do trabalho. Desta vez, ela já estava lá lhe esperando.

Ele continuou correndo na direção dela. Quando a alcançou, tomou-a nos braços ali mesmo e fez o que já devia ter feito à muitos anos atrás: deu um daqueles beijos dignos dos melhores filmes românticos.

As pessoas passavam na rua assistiam à aquela cena: uns paravam e olhavam sorrindo; outros balançavam a cabeça em sinal de reprovação; algumas das pessoas não admitiam para si mesmas, mas queriam estar fazendo exatamente a mesma coisa.

Mas os dois não estavam nem aí para eles... só haviam os dois e nada mais importava.

Naquele dia, não houve almoço e eles se entregaram à companhia um do outro. Pedidos de desculpas e outras coisas mais não se fizeram necessários... não importava mais nada agora: eles estavam finalmente juntos, após tantos anos.

Ele a levou de volta ao trabalho e marcaram de se encontrar na hora da saída.

No decorrer da semana, foi assim: almoço juntos todos os dias e encontros na saída do trabalho. Falavam todos os dias ao telefone e quando estavam juntos, andavam sempre de mãos dadas.

Combinaram de ele ir na casa dela no final de semana. Ele estava nervoso e apreensivo em conhecer as filhas dela... será que elas iriam gostar dele?

No horário combinado, ele tocou a campainha do apartamento dela. Trazia um buquê de flores, uma garrafa de vinho e duas caixas de bombons para as meninas.

Ela abriu a porta. Usava um vestido preto. Estava linda e tinha o sorriso mais bonito do mundo.

Ela deu um beijo nele e ele deu o buquê de flores para ela. Ela agradeceu com outro beijo, pegou-o pela mão e o levou para dentro do apartamento.

A sala estava a meia-luz, mas ele pode ver uma mesa posta para duas pessoas.

- Mas.. e cadê as suas filhas?

- Foram passar o fim de semana na casa da avó – respondeu com um sorriso – Por que você não abre esse vinho, enquanto eu ponho as flores num vaso?

- Ok – ele respondeu.

Ela voltou e os dois jantaram à luz de velas. Os olhares se encontravam à todo instante – já não havia necessidade de desviar os olhos – e o vinho aquecendo ainda mais o fogo que já ardia no interior de cada um.

Quando acabaram, ela o pegou pela mão e o levou para o sofá. Sentaram-se bem juntos um dos outro e deram um longo beijo.

- Coloca uma música – ela pediu – quero dançar com você... faz tanto tempo que eu não danço.

Ele obedeceu. Quando se virou, ela já estava em pé, atrás dele. Os dois se abraçaram e começaram à dançar. Os corpos se tocando, sensualmente, as mãos explorando... conhecendo.

- Amor – disse ele com a voz ofegante – quero ir devagar... não quero te magoar.

Ela olhou para ele com ternura e disse:

- Já esperamos tempo demais... e eu quero recuperar o tempo perdido – disse com olhar insinuante.

Então eles não se contiveram mais. Se entregaram ao fogo da paixão e do Amor.

Em certo ponto enquanto eles faziam Amor, ele notou que ela tinha lágrimas nos olhos.

- O que foi, querida? – perguntou preocupado – Fiz algo que te desagradou? Por que está chorando?

- Não, meu querido – ela respondeu sem enxugar as lágrimas, que caiam – você não fez nada de errado... eu estou chorando é de alegria... de felicidade.

E então, ele a abraçou e a beijou... e enquanto faziam Amor, ele beijava suas lágrimas.

E fizeram Amor durante toda a noite.

Fim

Denis, O Dreamaker.

23/11+25,26/12/2006

02:42

Nota do Autor: Este texto é uma obra de ficção.

Confiram outros textos inéditos de minha autoria nos meus blogs:

Zona Literária (https://minhazonaliteraria.blogspot.com)

Terra dos Sonhos (https://sonhosdesperto.blogspot.com)

Caso gostem dos conteúdos, comentem e interajam!!!

Denis (Dreamaker)
Enviado por Denis (Dreamaker) em 02/05/2010
Reeditado em 16/02/2024
Código do texto: T2233585
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