Casos e acasos.
Casos e acasos, certas coisas acontecem em nossas vidas e por mais que procuremos alguma explicação, nada parece fazer sentido. Às vezes tentamos traçar nosso destino a nossa maneira, mas expostos ao acaso, seguimos caminhos totalmente inesperados e isso tem sido constante em minha vida.
Prazer, me chamo Felipe, não tenho muito a dizer sobre mim, amo fotografar, guardar um momento, parar o tempo, talvez uma tentativa de impedir o acaso. Amante de um bom vinho, doce, amargo, não importa, apenas brindar o momento, o silêncio, a companhia, talvez uma maneira de fugir do acaso. Amo poesia, na verdade não a poesia em si, amo uma poetisa, que com tuas palavras, com teus pensares, parece me desvendar. Tuas palavras são únicas, palavras que dão vida a reais sentimentos, reais experiências, reais momentos. Dona de uma sensibilidade apavorante, capaz de descrever da pior das angustias ao mais intenso amor... Vivo cada poesia sua, entre angustias e amores, uma pausa para respirar, pensar, refletir. Minha poetisa na verdade, eu não a conheço, dona de uma face oculta, dela só sei o nome, sempre assinado abaixo de cada poesia, mas ela me conhece, me conhece como ninguém.
Enfim o acaso agiu a meu favor, curiosamente, andando sem rumo pela rua, me deparei com um imenso outdoor, anunciando um encontro de poetas em uma livraria a duas quadras, às oito horas da noite desse mesmo dia e lá estava o nome dela, aquilo me fez tremer, suei frio. Sua face ainda permanecia oculta, eu precisava vê-la, saber quem é a pessoa que me conhece mais até que eu mesmo. Ja estava decidido, eu iria até lá para vê-la. Quando dei por mim, olhei no meu relógio e me desesperei, ja eram seis horas, tanto tempo imaginando como seria, fantasiando, sonhando e poucas horas separam esse momento. Decidi parar em um bar antes, beber algo, procurar me acalmar, relaxar. Entrei no bar e caminhei até a bancada, ja procurando uma cadeira vazia... Sentei e
logo pedi um Red Label, o barman me serviu e eu não conseguia dar nem um gole sequer, olhando para o relógio e contornando meu dedo sobre a borda do copo, talvez numa tentativa de fazer o tempo passar mais rápido, no entanto, mais uma vez fui surpreendido pelo acaso... Ao meu lado sentou uma mulher, toda de preto, cabelos escuros e escorridos contornando sua pele clara como a neve e nos teus lábios carnudos, um batom vermelho sangue. Tentei não manter meu olhar sobre os teus traços, mas era inevitável, ela me intrigava... Foi então que nossos olhares se encontraram, um olhar penetrante, ela não olhava somente nos meus olhos, ela parecia enxergar algo além, me senti nu diante de tal olhar. Ela então acendeu um cigarro e desviou o olhar, segurava-o entre os dedos, destacando tuas unhas pintadas no mesmo tom do teu batom.
Uma tragada, um sopro, um momento... Ela então se levantou, e olhando nos meus olhos segurou meu copo, deu um gole não desviando o olhar, pude ver que teu batom marcou a borda do copo, eu observava cada traço, cada movimento teu, eu não conseguia respirar e num movimento ela se aproximou mais e mais, e logo estávamos frente a frente, teu perfume era doce, convidativo, assim como tudo que havia nela... Meus olhos se fecharam diante de tal intensidade, o calor do teu corpo ja tomava o meu e uma brisa me fez abrir os olhos e quanto dei por mim, ela havia sumido, ja não estava mais ali. A procurei por cada canto do bar e nada, olhei para o copo e lá estava teu batom provando sua real existência, eu não estava louco, aquilo foi real... Desapontado e intrigado, olhei para o relógio e notei ja estar atrasado para o encontro, não o encontro de poetas, mas o nosso encontro. Ainda sem entender o ocorrido, cheguei até a livraria e notei uma enorme fila, parece que houve um atraso. Passei pela fila e os boatos diziam que Isabelle Dacourt, a minha poetisa havia se atrasado, aproveitei para ir ao banheiro, lavar o rosto, respirar e aí a maior das surpresas... Andando pelo
corredor, me veio aquele perfume, eu o reconheceria em qualquer lugar, parei de frente ao banheiro feminino, onde o perfume era mais intenso e a porta se abriu... Lá estava ela, o mesmo batom, o mesmo olhar, a mesma sensação. Dessa vez eu não a deixaria ir, dessa vez eu que me aproximei, ela não exitou, na verdade não esboçou qualquer reação, apenas me olhava, um olhar desafiador, foi então que os nossos lábios se tocaram, meus olhos se fecharam, pude sentir tua pele macia sobre a minha, nossos corpos se encontraram... Nenhuma poesia seria capaz de suprir aquele momento, aquele toque, aquele beijo. De repente uma multidão apareceu, passando por nois e por conta disso eu ja não a sentia mais próxima a mim... Mais uma vez ela foi embora, sumiu em meio à multidão... Atravessei o corredor a sua busca e o maior dos acasos aconteceu. No centro da livraria, lá estava ela, sentada diante de todos, Isabelle Dacourt, a minha poetisa, aquele batom, aquele olhar, trazida pelo acaso.