Difícil Decisão

Era 6:00 am quando o despertador tocou, Nina acordou lentamente, e mais lentamente começou a se arrumar.

Uma hora depois, estava atravessando o portão quase fechado do colégio que estudava, em frente a seu condomínio.

A aula de português já havia começado quando chegou na sala. 2° ano colegial, as mesmas matérias monótonas de sempre!

- Nina, que cara é essa?

- Ai Mi, quase não dormi esse fim de semana!

- Nossa, por quê?

- Participei de um retiro, já não tinha te falado?

- Ah, é mesmo, você me disse!

As duas foram interrompidas por um olhar intimidador da professora e voltaram para “A Vida de Guimarães Rosa”.

- E as meninas?

- A Lili ainda ta doente e a Tati deve ter perdido a hora... Ah, tem uma menina te procurando.

- Quem?

- Não sei, uma garota do 1º ano, acho.

- O que ela quer?

- Não me disse.

Outro olhar, e a ameaça de retirá-las da sala cortou o assunto.

O sinal tocou, anunciando o intervalo. As amigas desciam conversando quando foram interrompidas por uma garota que as esperava ao pé da escada:

- Você é a Nina, não é?

- Sou sim, e você? - Direcionou o olhar para a estranha garota.

- Luiza... Acho que precisamos conversar.

Nina e Michelle se entreolharam e Michelle saiu em direção à cantina. No mesmo instante, um garoto se aproximou:

- Oi Lú!

- Oi Matheus, esta é a Nina de quem lhe falei.

- Ah sim, oi Nina! - Respondeu desempolgado.

- Oi, mas então Luiza, o que mesmo você queria?

- Você era namorada do Feliphe, certo?

- Era, por quê?

- Você ainda gosta dele, não é mesmo?

- Por que você quer saber? - Começava a se irritar, alterando, sem perceber, sua voz.

- Ele está namorando a Camila e sei que isto te incomoda.

- Não sei de onde você tirou isso... - Uma pausa, respira fundo, nervosa, não gostava de falar desse assunto. - Mas exatamente o que você quer?

Foi Matheus quem respondeu:

- A Camila, eu e a Lú sempre fomos amigos, e não é segredo pra ninguém que sou apaixonado por ela!

- É, foi muito chato o que a Mila fez com ele e ta fazendo com a gente! - Interrompeu a faladeira Luiza.

- E o que eu... - Antes que Nina pudesse terminar, Luiza voltou a falar:

- Temos um interesse em comum! - Tentava parecer mais adulta do que era, apesar da atitude infantil.

- Não me interesso em nada nisso tudo, mal tenho falado com o Fê! - Feliphe era seu melhor amigo, mas haviam brigado por conta de seu namoro.

- Acho que temos sim! - Retrucou Matheus. - Você conhece bem o Feliphe e nós a Camila...

- E? - Nina já não agüentava mais o papinho monótono.

- Com a sua ajuda poderíamos, é você sabe... Eles não se amam de verdade, ta na cara e...

Irritada com a enrolação do amigo, Luiza adiantou. - Acabar com esse namorico!

- O que, como assim?

E Luiza contou seu plano, emocionada como se falasse de seu filme favorito. O sinal tocou antes que Nina pudesse dizer algo, mas o assunto a atormentou o resto da aula: A idéia de ver Feliphe longe da garota que o “roubara” dela, misturada com a angústia de ir contra o que aprendera no ultimo fim de semana, mais o fato de que, apesar do que sentia, não queria mais nada com ele... Não pensava em outra coisa. Queria ajudá-los, mas isto ia contra seus princípios, e além do mais...

- Terminou senhorita? - O professor Alfredo interrompeu seus pensamentos.

Ãh? - Nina se deparou com uma lousa repleta de exercícios de química, e antes que pudesse responder, alguém bateu à porta e o professor foi atender. O sinal tocou.

- Tudo bem Nina, eu te empresto o caderno. - Michelle sorriu, como sempre muito prestativa. - Mas no que pensava? Você não parecia estar exatamente na aula de química!

Valeu, é que estou meio confusa...

- Com o que? - Enquanto conversavam, desciam as escadas em direção à saída.

- Nada, deixa pra lá...

- Tem a ver com a garota do intervalo?

- Tem, mas não é nada importante, deixa pra lá!

Michelle percebeu que a amiga não queria falar e se despediu. - Até amanhã.

- Até! - Nina se preparava para atravessar a rua, quando escutou um chamado:

- Espera! - Era Luiza, Nina não queria falar com ela naquele momento. Hesitou, disse que tinha que ir, mas mesmo assim a garota insistiu:

- Só precisa pedir para ele aparecer aqui, o resto é com a gente!

Nina encarou a garota em silêncio e saiu em direção ao condomínio.

Sentou no jardim, tentando tirar o assunto da cabeça, mas não conseguia, andava lentamente olhando as árvores, sem saber se ajudava ou não aqueles dois malucos. Pegou o celular, olhou a única foto que tinha de seu amigo, ficando cada vez mais confusa. Enfim decidiu subir, comer alguma coisa e assistir TV, ou quem sabe arrumando a casa não esquecia este assunto.

Entrou sozinha no elevador, 1º, 2º, 3º, 4º andar... a luz piscou, o elevador começou a ficar mais lento, 5º... 6º... de repente a luz apagou e o elevador parou. - Não acredito! - Reclamou para si mesma enquanto apertava o botão de alarme.

Aquele barulho estridente, o tédio e o escuro a fizeram pensar na idéia de colaborar com Matheus e Luiza. E ficou pensando, pensando... Pensou durante longas duas horas!

Chegando em casa, correu decidida para o telefone:

- Alô?

- Oi Marcelo, seu irmão está ai? É a Nina!

- Está sim, quer falar com ele?

- Por favor! - Nina esperava, enquanto condenava a si mesma por sua atitude.

- Oi Nina, nem acreditei quando o Marcelo disse que era você!

- Oi Fê, tudo bem?

- Tudo sim e você?

- Na verdade não. - Fez uma pausa, criando coragem. - Estou tão chateada com umas coisas...

- O que houve?

- Nina, desliga este telefone e vem aqui! - Ela imitou a voz da mãe. Sabia que o fato de uma suposta briga com a mãe e de não ter tempo de contar o que houve, não deixariam escolhas para o amigo senão atender a seu pedido. - É uma pena, mas preciso ir. Foi bom falar com você...

- Tudo bem, eu entendo.

- Aparece na escola amanhã. - Sua voz era chorosa e angustiada, e não precisou fingir nesta hora. - Estou precisando tanto de um amigo... E faz tempo que não te vejo.

- Nossa, você esta mal mesmo hein... - Nina balançou a cabeça em silêncio, como se ele pudesse ver, desligou o telefone chorando e tentou se concentrar nos exercícios de química.

No dia seguinte, Nina procurou Camila no intervalo. - Posso falar com você?

- Oi, fala! - Olhava confusa, estranhando a atitude da ex de seu namorado.

- Como vai o namoro? - Perguntava insegura, com o coração se despedaçando.

- Bem. O Fê anda um pouco triste porque você sumiu. - Falou com desdém. Odiava o carinho que Feliphe sentia pela amiga. - Mas entre a gente está tudo bem, por quê?

Ignorando a pergunta, Nina continuou. - E com os amigos, mudou alguma coisa?

- Não... - Pensou um pouco, cada vez mais confusa. - Pelo menos não que eu saiba.

- Mila! - Um sorridente Matheus apareceu. - Tudo bem?

Antes mesmo que Camila respondesse, Nina saiu andando, tentando não ser notada. Ela não entendia como aquela cara triste e olhos cheios de lágrimas que conhecera um dia antes, na frente de Camila podia ter mudado tanto.

Na hora da saída, Nina arrumou o material rapidamente. Antes mesmo que o professor liberasse os alunos, já havia se despedido de suas amigas. Logo que ouviu o sinal, correu em disparada pela escada, quase tropeçando, os olhos mareados atrapalhavam,-lhe de enxergar. Foi a primeira a passar pelo portão, ainda meio-aberto.

Exatamente como esperava, encontro Feliphe parado no portão, do lado de fora, com um sorriso triste de preocupação:

- Oi Nina, está melhor?

- Não dá pra conversar agora, vem comigo! - Antes que o amigo pudesse falar, puxou-o pelo braço. Saíram os dois correndo e pararam a alguns metros da escola.

- Nina, o que esta acontecendo?

Os olhos mareados soltaram uma lágrima - Ontem... - respirou fundo. - Ontem, dois amigos da Camila me procuraram... - Fechou os olhos, sem acreditar no que ia fazer. - Eles queriam minha ajuda para acabar com o namoro de vocês, me disseram que eu só precisava chamar você aqui e o Matheus beijaria a Camila na sua frente, enquanto a Luiza dizia algo do tipo “Eu nunca vi a Mila tão feliz como desde que começou a ficar com o Matheus, e ele então, nem se fala!” fingindo não notar você por perto. - Chorava muito enquanto falava. - Tentei falar com ela no intervalo, mas o Matheus se aproximou e eu não consegui. - Respirou fundo, em meio às lágrimas, olhou no fundo dos olhos de seu amigo tentando dizer mais alguma coisa. - Tenho que ir!

Feliphe segurou-a pelo braço, seus olhos se encheram de lágrimas, sem entender o porquê. Ficaram um tempo se olhando, sem mexer um músculo sequer. - Obrigado!

Ela abriu um leve sorriso e saiu correndo, aos prantos.

Feliphe ficou olhando ela se distanciar, sem entender o que sentia, sem entender porque Nina havia feito aquilo. Por um lado, se sentia feliz em saber que, apesar de tudo, ainda podia ver em sua ex-namorada uma amiga sincera. Porém, uma parte dele gostaria que tudo aquilo realmente acontecesse, que ele terminasse o namoro com Camila e pudesse voltar para perto de Nina...