AMOR A VIDA

AMOR A VIDA

No ano passado, em uma de minhas muitas viagens à cidade de Formiga, a 68 km de Divinópolis, cidade onde resido, conheci um carreteiro do sul do país e, para ser mais exato, do Rio Grande do Sul.

Ele era um rapaz claro, de olhos azuis, alto e de boa aparência, com um papo muito agradável.

Jantamos juntos e, entre uma conversa e outra relacionada à vida, família e causos de estrada ele narrou-me um acontecimento que me comoveu bastante. E este vou contar a vocês.

“Disse-me que estava voltando para a sua casa com a carreta vazia pois tinha uma carga pronta à sua espera lá pelas suas bandas, aguardado a sua chegada.

Seria apenas o tempo de ver os filhos e a mulher. Deveria dormir aquela noite em casa e, na manhã seguinte, retornar à estrada. Sua vontade de chegar era muito grande, pois há mais de vinte dias não dormia com sua família. Pensando em chegar depressa, a saudade maltratando demais, começou a pisar fundo sem pensar nos riscos que corria.

Ao sair de uma determinada curva, ainda no estado de São Paulo, deparou com a patrulha rodoviária que o fez parar. Um guarda ainda muito jovem veio até ele e pediu-lhe os documentos, indo em seguida para parte de trás de seu caminhão. A demora do guarda o deixou intrigado, então desceu da boléia, pegou uma nota de cinqüenta e foi até o policial, certo que teria que pagar o “café”.

_Tudo certo, seu guarda? -perguntou o motorista.

_É rapaz, você estava com pressa! Pegamos você no radar. Rodava acima dos cento e vinte km por hora.

_Tem razão “sô” guarda, eu que estou há tempos fora de casa... A saudade me fez esquecer o velocímetro.

Certo de que o policial fosse pedir dinheiro, enfiou a mão no bolso ansioso pela demora em pedir o seu “justo cafezinho”.

_Moço... -disse o policial. Venha comigo, precisamos conversar.

Então pensou que lá ele iria pedir o suborno. O policial colocou a mão sobre os seus ombros e foram caminhando lentamente à beira da estrada. Para grande surpresa, ele disse:

_Se eu recebesse este suborno que, com certeza você está querendo me oferecer, ao sair daqui, continuará como se nada tivesse acontecido. E se eu lhe der uma multa, ao estar fora de meu alcance, vai pisar até avermelhar o motor do caminhão por raiva de mim. Posso então lhe fazer algumas perguntas?

_Mas é claro! -Ele estava pronto a responder.

_Bom... Se você atrasar uma hora em sua viagem, sua família vai lhe esperar?

_É lógico seu guarda, eles me amam.

_E se você atrasar um dia, mesmo assim eles estarão à sua espera?

_Estarão sim, mas, aonde o senhor quer chegar? Naquela hora, ele pode ver os olhos daquele policial molhados de lágrimas.

_Sabe amigo, meu pai também era caminhoneiro. Bebia, fumava, corria, assim como você mas, nós: minha mãe, meus três irmãos e eu, tínhamos a maior adoração por ele que, na verdade, era um grande pai e marido. Eu tinha sete anos e meu pai saiu para uma de suas jornadas rotineiras. Despediu-se de nós prometendo chegar na sexta feira mas, até hoje, estamos à sua espera. Sofremos muito e eu não quero que seus filhos fiquem lhe aguardando, assim como nós ficamos. Meu pai bateu sua carreta de frente com outra, houve um incêndio e, não sobrou nem mesmo o seu corpo para ser velado. Meu amigo, pense sobre isso e, tenha uma boa viagem!

Foi então que se abraçaram, ele e aquele bom homem e, dali para frente ele nunca mais teve vontade de correr.”

Agradeci e agradeço ao amigo que me contou este fato e ao bom policial que o parou naquele dia, onde quer que estejam.

Ao término de sua história, pude perceber que os olhos muito azuis daquele novo amigo brilhavam invadidos pelas lágrimas.

Tonho Tavares

tonhotav@yahoo.com.br

ANTÔNIO TAVARES
Enviado por ANTÔNIO TAVARES em 13/01/2010
Código do texto: T2027502