O Amor é Eterno

“Não. Não pode ser. Não era ele. Quando tempo não o via? Vinte, trinta anos? Não é possível. Não deve ser ele!”

Ela e o marido estavam em viagem pela Bahia, numa segunda lua de mel. Quando, no aeroporto, embarcaram naquele táxi que os levaria ao hotel, estava entretida com a paisagem, enquanto o marido conversava com o taxista, contratando um passeio para mais tarde. Foi quando, sem querer, ela olhou no espelho retrovisor do carro. Algo fez o seu coração disparar. Não tinha certeza, mas parecia que o conhecia de algum lugar. Como estivesse de óculos escuros e chapéu, podia olhar aonde quisesse sem que isso fosse percebido. Por muito tempo continuou absorta, enquanto o observava.

O marido perguntou algo, e o motorista descrevia detalhes do lugar. Quanto mais ele falava, mais certeza ela foi tendo. A voz rouca, grave, difícil de entender, e também de esquecer. Cada vez mais a certeza crescia. Nem mais prestava atenção no que diziam. Simplesmente ouvia. Seu pensamento não estava ali. Tinha viajado no tempo. Aquela voz, aqueles lábios, aquela noite... De repente ouviu alguém chamando. A voz era distante, mas vinha do presente: era o marido. Preocupado, ele perguntava se estava bem. Sim, disse, eu estou bem! Queria falar alto, para que ele ouvisse sua voz, mas só conseguia balbuciar dizendo que era apenas cansaço, ao que o marido completou, dizendo ser da viagem, e que ao chegarem ao hotel ela ficaria melhor.

Quando o carro parou, demorou a descer. Olhou, como fizera durante toda a viagem, por trás dos óculos escuros. Fixamente. Sem admitir completamente, sentia-se frustrada por ele não a ter reconhecido. Ao desembarcar, gentilmente ele trouxe sua nécessaire. Quando a recebeu sentiu o roçar em sua mão. O toque a deixou estranhamente contente. No hotel, deixou-se cair na cama. Parecia que tinha caminhado quilômetros. O marido perguntou se ela gostaria de tomar um banho. Disse que sim, mas depois. Descansaria um pouco antes. Logo estaria bem. Seu marido desfez as malas e foi ao banho.

Foi irresistível. Correu à janela na esperança de tornar a vê-lo. Sua vontade era descer correndo atrás dele, fazer o que deveria ter feito há muito tempo, mas fora covarde para tal. Era o medo. Não, isto não aconteceria novamente!

Logo à saída do hall do hotel, tomou um susto. Ele lá estava. Fora do carro, recostado sobre o capô, como quem esperasse. Quando ela se aproximou, ouviu: - Maria! Maria! Reconheci você assim que a vi, com chapéu e óculos escuros.

- Mas como? Ela quis saber.

- Estás igualzinha a quando fomos à praia pela última vez, de óculos e chapéu.

Só então ela se deu conta de ainda estar com eles. Não se tocaram. Ficaram parados, olhando um para o outro, vendo-se da mesma maneira antiga, como se o tempo não existisse. Entraram no carro. Foram para um lugar qualquer. Que importa qual? Beijaram-se por vinte anos, amaram-se por trinta anos. Riram. Contaram histórias. Falaram de si, da família, da vida, do quando e do quanto se amavam. De como o destino era cruel em juntá-los agora.

Ela disse que não iria mais abandoná-lo. Que não mais seria covarde. Ele ficou quieto. Por amá-la mais que tudo no mundo é que faria isto: deixá-la ir. Ela ouviu isso em silêncio, enquanto ele materializava um redemoinho de pensamento.

- Preste atenção, você já imaginou se tivéssemos nos casado? Você não teria a sua filha, e eu, os meus filhos. A história que vivemos até agora não teria existido. Quis Êle que primeiro escrevêssemos uma história ao lado de outras pessoas. Histórias de lutas, histórias de alegrias, de tristezas de perdas, de ganhos e também de muito amor. Mas faltou escrever a nossa, talvez por isso Êle quis que nos encontrássemos novamente.

Um grande amor. Sim, era isto. Era para não duvidar, que existia sim, e que poderia ser vivido, mesmo que de maneira efêmera. É um amor que em nós durará para sempre. Em Sempre não Há Tempo. O Amor é Eterno. Neste nosso tempo finito, não refaremos nossa história, a não ser dentro de nós mesmos, no nosso coração.

Após ouvir todas as palavras dele, compreendeu que a alma de um poeta é leve, delicada como pluma, e o amor, uma brisa suave e terna que a levava para onde soprasse. Bebeu cada gota de cada sílaba que ouviu. Sabia que ele estava certo e o amava ainda mais. Amá-lo-ia para todo o sempre. Beijou-o ternamente. Acariciou-lhe os lábios, lembrando-se de poemas que anos antes ele escrevera para ela. Sorriu. Queria que aquele momento durasse pra sempre, que fosse o último da vida dela.

Ele tomou-lhe o queixo entre as mãos. Olhou em seus olhos. Chorava. E ela também. Era um choro contido, leve. Choro de saudades do passado e do futuro. Beijou-lhe os lábios. " Tchau Amor! Toda vez que chover, deixe a chuva molhar o seu rosto. Na chuva estarei molhando o meu. Não serão gotas de chuva a cair sobre nós, mas lágrimas do céu abençoando o nosso amor.

Adeus!"

Isidoro Machado
Enviado por Isidoro Machado em 15/11/2009
Reeditado em 02/03/2010
Código do texto: T1925110
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