Vote No Final - Rogério deve assumir Felipe como seu filho? - CAP IV

Capítulo IV - Revelações

Quando Rogério desceu para o café já era quase meio-dia, normal todos acordarem tarde no dia 25, ainda mais para ele que demorara a pegar no sono, remoendo todas questões da noite anterior, da semana anterior. Mas estava como novo, tinha encontrado agora o ponto de equilíbrio e estava pronto para tomar uma decisão. Na mesa encontrou somente D. Margarida.

- Todos ainda dormindo, achei que seria o último a levantar. Bom dia.

- Bom dia, só as crianças, Soraya e Solange já foram a cidade, trocar presentes e fazer compras, o que é bom, assim podemos conversar mais à vontade Rogério.

- Imagino minha sogra, tanta coisa acontecendo, imagino que a senhora queira mesmo conversar sobre tudo isso comigo, até queria sua opinião sobre a casa que comprei, mas não queria estragar a surpresa, ledo engano, no fim eu que sai surpreendido.

- Sim, é claro, mas na realidade esse é o menor dos problemas, por mais que não venham mesmo morar aqui, imóvel sempre é um bom investimento, e essa região está se valorizando, dizem até que embreve teremos um shopping center, não sei o que isso pode trazer de benefícios para essa cidade, mas dizem que será bom para valorizar tudo ao redor, torço para que isso aconteça mesmo, até porque um dos terrenos que estão de olho pertence a nossa família. Mas não é sobre negócios que quero conversar com você.

- Enquanto tomava seu café, Rogério começou a se preocupar com o tom de D. Margarida, nunca falaram de outra coisa que não fossem negócios, não gostaria de ter que discutir com ela sobre a educação de seus filhos, ou a maneira que tratava sua esposa, era muito reservado quando se tratava de sua família.

- Ontem ouvi parte de sua conversa com Solange, por acidente obviamente, mas fiquei intrigada por esse seu interesse em querer se fazer pai de Felipe e principalmente por esse segredo que ronda vocês três, desde que Solange foi morar com vocês na capital sempre percebi um clima estranho, principalmente em relação a Soraya, que passou a beber após essa época.

- Acho que isso não tem nada a ver, com todo respeito minha sogra, a senhora está vendo coisas onde não tem, gosto do Felipe como um filho e queria muito que ele me visse como um pai porque vejo que o garoto sofre, e quanto a Soraya, ela bebe para curtir as festas, não é uma alcoólatra como a senhora parece estar insinuando. Nunca houve nenhum segredo entre nós três e a senhora me ofende dizendo o contrário.

- Me poupe do sua ingenuidade quanto aos problemas de sua família, de seu filho metido em drogas, sua esposa alcoólatra e sua filha reprimida, você não vê o que acontece porque tem medo de olhar dentro de casa e enxergar o que fez de tão grave um dia, que quer reparar agora, me diga Rogério? Você e Solange tiveram um caso? Vocês traíram Soraya? Felipe é mesmo seu filho? Ele foi concebido na cama de sua esposa, pela irmã dela? Vocês foram sujos o bastante para macularem um lar tão bonito, para quebrarem a confiança que Soraya depositou não em você, mas principalmente na irmã, a quem ela estendeu a mão, abriu as portas de casa e tratou como filha? Para quê? Para ser apunhalada pelas costas?

- Chega!!!!! - Solange gritou da porta, ela e Soraya estavam assistindo toda a cena caladas.

Rogério estava empaledecido, também não sabia o que dizer, aquilo era totalmente fora da realidade, ele nunca imaginou que as coisas chegariam aquele ponto, tudo o que pensara durante a noite. As decisões que havia tomado poderia mudar de rumo agora, ele estava perdido, levantou-se da mesa, sem dizer uma palavra, saiu para o jardim, Soraya foi atrás dele, D. Margarida ficou sozinha na sala de jantar enquanto Solange aos prantos subiu para seu quarto.

Rogério estava na sacada olhando o horizonte, quando Soraya chegou por trás e o abraçou, ele suspirou fundo.

- Seria essa a reação dela então?

- Isso é o que ela pensa, não é a reação ainda, não sabemos o que faria se confirmarmos essa história como verdadeira, Solange está muito preocupada, prefere deixar as coisas como estão, o Felipe se acostuma é novo ainda. Solange está levando-o num psicólogo sem que mamãe saiba, ele tem que entender que não tem um pai, ele tem que aceitar isso.

- É muito doloroso ver um garoto tão encantador como ele sofrer dessa forma.

Soraya o virou e olhou em seus olhos.

- E o seu garoto encantador, não é doloroso vê-lo sofrer também? Desde aquele dia você foge de ter uma conversa com ele, de entender o porque ele está agindo dessa forma, você precisa pensar em nós Rogério. A não ser... a não ser que queira construir uma família nova.

- Rogério abaixou a cabeça.

- Claro que não, minha família está aqui.

- Então cuide dela, para não perdê-la também.

- Soraya entrou, e encontrou Solange descendo as escadas desesperada, algo estava acontecendo, ela perguntou de Rogério, Felipe estava com muita febre e suava frio, precisavam levá-lo urgente para o hospital.

Logo que chegaram no hospital Soraya, Solange e Felipe entraram e Rogério ficou na recepção esperando por notícias, estava preocupado com o garoto, ele parecia muito doente, após um momento, chegaram D. Margarida, Pedro e Patrícia, os dois sentaram ao lado do pai e a matriarca logo entrou atrás de notícias do neto.

Os três ficaram um tempo mudos, abraçados, até que Rogério perguntou se haviam pensando sobre a mudança. Pedro olhou para o pai e Rogério viu muito de sua rebeldia juvenil no rosto do filho, ele era exatamente assim, sempre de mal com o mundo, mas no fundo um garoto doce, procurando somente um pouco de atenção.

- A gente faz o que o senhor quiser.

- Mas é isso o que vocês querem, se mudar para cá?

Eles não responderam mais, a resposta já estava dada se dependesse deles esse assunto de mudança, nunca teria vindo a tona. O problema todo é que Rogério não conseguia mais restabelecer a comunicação com seus filhos, não sabia mais como fazê-la e estava com medo de que dessa forma pudesse perdê-los para sempre, era uma posição arriscada agora, pois a capital tinha riscos que facilitavam a fuga dos garotos que perdiam a comunicação com os pais, como ele já estava provando com Pedro, enquanto que se os trouxesse a força para o interior o efeito também poderia ser devastador. Estava cada vez mais complicado resolver esse impasse, e só podia piorar.

Solange e Soraya chegaram a sala da recepção e pediram para que as crianças fossem ver o primo, sentaram ao lado de Rogério.

- E então o que ele tem?

- Não sabem ainda, estão fazendo exames, mas a febre não quer ceder, chamamos o psicólogo dele, ele deve estar a caminho, disse Solange em meio ás lágrimas.

- Como assim psicólogo?

- Ele está delirando Rogério, chama pelo pai o tempo todo, disse que o papai Noel o havia trazido, que o tinha visto e pergunta porque ele não estava lá de manhã, quando acordou. - explicou Soraya

- Não dá mais pra ser assim, você precisa ceder Solange, a gente precisa tomar uma atitude, se a febre não ceder, ele pode até mesmo,... meu Deus, não quero nem pensar nisso...

- Não sei o que pensar, por isso chamamos o psicólogo, como vamos explicar isso para ele, como vamos explicar que o pai dele é o tio, e a seus filhos? Não sabemos como minha mãe reagirá, você viu como ela nos agrediu só por desconfiar, nossa vida será um inferno.

- É a vida de seu filho que está em jogo agora, não mais os caprichos de um menino de oito anos – disse Rogério olhando nos olhos de Solange

Solange levantou-se, foi até a porta que dava para a rua e voltou decidida

- Vamos contar a verdade então, acabar com todas as mentiras, de uma vez por todas, não aguento mais viver assim.

Rogério se levantou e pegou nos braços da cunhada, quase que a abraçando

- A verdade não trará um pai para seu filho, e só um pai de verdade pode salvar a vida dele.

Soraya assistiu a toda a cena perplexa com as atitudes de Rogério, começou a perceber o quanto ele mudava perto de Solange e principalmente, o quanto ele se esforçava para poder assumir Felipe como seu filho. Estava tão empenhado nisso que esquecia que seu próprio filho Pedro estava com problemas e não sabia como resolvê-los ou não se esforçava como fazia com os de Solange e Felipe, uma idéia passou pela cabeça de Soraya, tentou afastá-la, mas no fim decidiu arriscar, deu uma desculpa aos dois e saiu do hospital.

Os dois sentaram na recepção e Rogério abraçou Solange, ela chorava, sentia-se perdida, não sabia como resolver essa situação sem que criasse tantos problemas em sua família. Foi quando D. Margarida aproximou-se dos dois e os chamou para fora do hospital, sua voz era seca, estava nervosa e não queria esperar um só segundo, perguntou por Soraya, os dois levantaram-se e Rogério disse que ela estava por ali naquele instante, que devia ter ido até o toalete ou algo assim. A matriarca pegou seu celular, teclou o número da filha e ficou ainda mais nervosa, resmungou que só dava caixa postal. Os três saíram do hospital e procuraram uma área onde não passava muita gente, D. Margarida os encarou.

- Conversei com os médicos, o psicólogo esteve lá também, não há nada com Felipe.

- Ele está melhor então? - perguntou aliviada Solange

- O quadro dele é o mesmo, o problema minha filha, é que a mente dele está criando esses sintomas, para chamar a atenção, para que o pai apareça.

- Mas isso é impossível, o que o psicólogo disse, tem como tratá-lo?

- Tem, mas é muito doloroso e demorado, sem contar que arriscado, pode ser que Felipe não aguente, que seu corpo sucumba aos sintomas que a mente está criando e entre em colapso, podendo levar até mesmo a morte. Ele indica que o melhor é mesmo chamar o pai do garoto e resolver isso de uma vez por todas.

- Não pode ser assim, mãe. Tem que haver uma forma.

Rogério colocou as mãos na cabeça, estava chorando e procurando em sua mente uma solução, D. Margarida indignada olhava para os dois, prestes a perder o controle, não se segurou mais, avançou na filha e segurou-a pelos braços.

Será que você não vê que a vida de seu filho está em perigo? Vocês cometeram o pior erro de suas vidas, mas uma criança inocente não pode mais pagar por isso.

Virou-se para Rogério e o agarrou pelo braço.

- Entre lá e assuma o filho que você fez. Seja homem pelo menos para isso, estou enojada por saber que vocês puderam trair Soraya dessa forma, mas agora não tem mais jeito, e se ela te perdoou, eu ei de saber conviver com você, mesmo que para mim você passe a ser um monstro a apartir de agora.

- Não é nada disso que você está pensando – Disse Solange com a voz serena e tomando conta da situação, se Rogério pensa realmente em entrar nesse hospital e assumir Felipe como seu filho, você terá que vê-lo a partir de agora como um herói, alguém que colocará em risco toda sua moral e família para admitir uma culpa que não é dele.

- Não diga mais nada Solange – Rogério se aproximou dela, querendo confortá-la, mas D. Margarida o interrompeu.

- Ela precisa saber toda a verdade, pelo menos ela. Há oito anos, quando eu morava na casa de Soraya e Rogério, eu ia a muitas festas, dessas de faculdade. E em uma dessas festas eu acabei bebendo muito, perdendo os sentidos, quando acordei percebi que estava nua, lembrava vagamente que havia sido estrupada não por um, mas por pelo menos uns dez rapazes que estavam na festa..... de todas as maneiras, foi humilhante.... quando cheguei em casa Rogério e Soraya perceberam que havia algo errado, conversaram comigo, eu mudei de turma na faculdade para conseguir terminar o curso, fiz terapia e fizemos um trato para que nunca ninguém mais soubesse sobre isso. Como pode ver, Felipe não tem um pai, e nunca vai ter, porque para mim é impossível conceber a idéia de estar com um homem novamente...

As duas se abraçaram chorando.

- Minha filha, todos esses anos, porque não me disse? Imagino quanto isso deve ser doloroso pra você.

- Hoje é fácil para você entender, ainda mais numa situação dessas, mas sei que na época, com papai vivo você não me aceitaria dessa forma.

D. Margarida engoliu a seco aquelas palavras, não podia discordar da filha, era verdade o que dizia, há oito anos o simples fato de Solange ter aparecido grávida foi motivo suficiente para que a trancassem na fazenda da família sem contato com o mundo exterior por pelo menos dois anos, imaginem se soubessem que ela havia participado de uma orgia, porque sim, certamente ela estava ali em busca de bebidas, drogas e outras coisas e acabou brincando com fogo demais do que pretendia. D. Margarida se voltou para Rogério e desculpou-se pelas palavras dura, agradeceu por ele ter cuidado tão bem de sua filha e perguntou se tinha tomado uma decisão.

- Gostaria de conversar à sós sobre isso com Solange.

Os dois ficaram sozinhos e Rogério olhou em seus olhos molhados, a vontade que tinha era enxugá-los e colocá-la em seu colo.

- Bem, acho que agora você deve estar se sentindo mais leve não?

- Não sei ainda, conheço minha mãe, existe muito preconceito dentro dela, sei que na primeira briga isso tudo ainda vai retornar e quero ver em que grau, para aí sim entender o que ela realmente achou de toda essa história. Mas e você, está pronto para assumir uma mentira para seus filhos, para meu filho, para o resto da vida a partir de hoje?

- Eles entenderão isso tudo como uma traição muito grande, não vão entender o porquê, será muito duro para Pedro, não sei como Patrícia pode digerir uma notícia dessas, tenho muito medo de prejudicá-los.

- Eu sei disso Rogério, por isso até hoje nunca lhe pedi esse favor, mas hoje é diferente, Felipe está muito doente, e pelo que estão dizendo só isso pode salvá-lo, só confio em você, não teria coragem de dividir meu filho com mais ninguém, tenho medo de um dia vir a faltar e ele ter que conviver com um estranho, vocês são minha família. Por favor aceite, tenha uma conversa com Pedro e Patrícia, eles são adolescentes, explique que foi um deslize infantil de nossa parte, que Soraya já o perdoou, mas me ajude. Serei grata a você para sempre, e estarei para sempre ao seu lado.

Rogério aproximou-se e se atreveu a dar-lhe um beijo na testa. Solange não viu malícia no gesto, entendeu como um gesto de carinho e entrou no hospital. Rogério respirou fundo e pensou em qual seria a melhor forma de resolver esse impasse em sua vida.