O Jantar

O Jantar

O telefone toca.Do outro lado do apartamento Sara desvia-se de caixas enormes de papelão,precisava chegar logo a ele.Várias vezes havia ficado ao lado do aparelho esperando...Contudo agora,distraída na cozinha esquecera-se dele.Quando conseguiu desviar de uma pequenina caixa ao chão o aparelho ficou mudo.Mesmo assim levou o fone

ao ouvido ,apenas o zumbido da ligação desligada.Olhou pela janela a chuva intensa mal deixava os carros transitaram na rua.Olhou o relógio tinha alguns minutos até a janta.

Do outro lado da cidade ,numa ampla casa preparativos para um jantar estavam sendo realizados.A dona da casa uma senhora de sessenta anos aproximadamente andava de um lado ao outro,organizando tudo.Num escritório estava seu marido,um homem de porte avantajado,com uma espessa barba,lendo um jornal e comendo um sanduíche.

-Mauro!Como pode já estar comendo!Espere o jantar está bem.Disse a senhora numa voz reprovadora e firme.

O casal costumava esperar os convidados uma vez por mês em sua casa.Alda,a esposa era cuidadosa na escolha do cardápio e atenta as bebidas.Seu marido nunca participara destes afazeres.A ele cabia somente fazer as vezes de um bom anfitrião e divertir os convidados com seus casos de escritório.Era arquiteto.

Diante do espelho Sara examinava a maquiagem.Possuía olhos castanhos amendoados,sua pele morena possuía uma suavidade natural que mal precisava de retoques.Colocou um perfume ,olhou o relógio e chamou um táxi.

Lá embaixo ,na entrada do edifício estava frio,cobriu-se com uma manta grossa e sentou-se no carro em direção a parte sul da cidade.

Os convidados iam chegando,a maioria casais de meia idade ,outros mais novos e alguns solteiros.Alda recebia a todos com seu melhor sorriso e Mauro agitava-se,dizendo um gracejo aos que passavam por ele.

Um rapaz que havia chegado sozinho,trouxe flores a dona da casa e com um sorriso simpático apresentou-se como Murilo.Era novo na cidade e estava começando no escritório de Mauro.Ofereceram a ele um lugar perto de uma moça loira,tímida que havia também chegado sozinha.Era uma parente de longe de Alda.Todos começaram a conversar informalmente.Alda olhava o relógio._Será que ela conseguirá chegar a tempo?Comentou baixinho ao marido.

O carro transitava devagar,havia um engarrafamento.A chuva ainda forte havia alagado algumas ruas o que dificultava o fluxo de carros.Sara ligou o celular.Alguém do outro lado atendeu e ela informou o quanto demoraria.O motorista comentou sobre outro trajeto o que ela aceitou.Durante o desvio ela voltou a lembrar-se do dia que decidira sair de casa.Como foi difícil a decisão e como sua mãe relutou em deixá-la ir.Agora que havia conseguido um bom emprego e um bom apartamento,tinha certeza da escolha certa.

Na enorme sala de jantar Mauro desandava a contar os fatos picantes de alguns empregados,provocando risadas de alguns e consternação de outros.O jantar agradava a todos.Alda observava a reação de cada convidado desde a entrada até o último prato.O que lhe causava a sensação de acerto.Olhou para a parede e o enorme relógio de sua mãe na estante acusava o atraso dela.Alda olhou o marido ,mas este nem percebia a ansiedade da esposa.Incrível como que para ele tudo não passasse de fatos divertidos. Um telefone tocou ao fundo .Alda levantou-se ,ao atender uma voz do outro lado dizia se atrasar.-Faz meia hora que iniciamos a jantar Sara!Vou pedir para alguém buscá-la!Seguiu-se uma breve discussão até alguém chamar a anfitriã.

Na sala ,Murilo conversava com a moça tímida,trocavam idéias sobre filmes,livros e teatro.O que fez Mauro lembrar de outro caso e iniciou um longo relato.Murilo,observava os convidados,era novo não conhecia ninguém ,seus olhos passavam lentamente pela mesa até se deparar num porta retrato ao canto de um balcão,nele estava a foto de uma moça,chegou-se mais a frente para visualizar bem,algo lhe chamou a atenção.-O casal Costa possuí uma filha?Indagou a sua companheira de lugar.A moça olhou-o sério e acenou com a cabeça desviando o olhar rapidamente.O que deixou Murilo mais curioso._Onde ela está?A moça levantou-se e pedindo desculpas dirigiu-se ao lavabo.O rapaz não se deixou perder.Comentou em voz alta a beleza da moça da foto.Um silêncio se fez.Mauro ficou atônito e com a taça de vinho na mão ficou estático ,como se em algum lugar de sua mente algo houvesse despertado.Alda agradeceu o comentário e comunicou que logo Sara iria chegar.

Para Murilo que era novo ,tudo aquilo era muito estranho,como o pai não se referia filha em momento algum do jantar ,a mãe, fria ,comportava-se como se a menção da filha fosse imprópria.Logo ele que pertencia a uma família grande onde todos os domingos seus pais recebiam seus irmãos e ele.

A campainha tocou,e da porta surgiu uma moça ,morena,bonita em seus cabelos cacheados,manejava uma cadeira de rodas.Desviando de móveis ia cumprimentando a todos.Sara havia sofrido um acidente quando adolescente e não possuía as pernas.Havia passado por muito sofrimento até reconstruir sua vida.Decidira morar só,aprendera a se virar,o que sempre deixara sua mãe desgostosa.Alda era uma mulher dinâmica e controladora.Nunca aceitara a tragédia e tão pouco acreditava na possibilidade da filha conseguir viver só.

Murilo ao ver a cena ,entendeu a forma fria dos Costa em lidarem com o assunto.Mauro um homem fanfarrão ,sempre debochando dos casos do escritório,fazia isto para disfarçar a tristeza de sua filha.Alda seca,ignorava a filha como se fosse algo grotesco.O rapaz sentiu uma forte necessidade de conversar com ela,perguntar-lhe sobre sua vida,fazer-se presente.

Sara acomodou a cadeira em frente a Murilo,seus olhos se trocaram,o rapaz sorriu e ela correspondeu,iniciaram uma conversa animada sobre chuvas ,trânsitos e desvios.Sara falava pausadamente e delicadamente gesticulava as mãos.Murilo acompanhava cada gesto .

Terminado o jantar,Alda convidou a todos para se dirigirem a outra sala.Murilo esperou por Sara e acompanhou-a.Conversavam bastante,esquecendo-se dos outros convidados.Ele comentava sua chegada a cidade e as novidades do trabalho.Ela sobre sua nova rotina e a agradável sensação de liberdade.Do outro lado da sala,olhos atentos observavam os jovens.Alda séria ,avaliava aquele homem que conversava com sua filha.De uma poltrona ,Mauro com um sorriso percebia como a filha estava bonita e com um brilho no olhar diferente do que quando vivia na casa.Gostara do rapaz desde que este chegara ao escritório e ao contrário da esposa o via com boas intenções.

A noite ia se prolongando,algumas pessoas iam se despedindo,outros mais efusivos resistiam na saída.Sara pegou sua manta e ia se preparar para pedir um táxi,quando Murilo se ofereceu para levá-la.Alda se antecipou dizendo que o pai a levaria.O que de imediato foi recusado pela moça.-Mãe eu irei com Murilo!Afirmou sem vacilar, com os olhos aguçados para a mãe.A batalha entre as duas nunca chegava ao fim.O táxi aguardava e os jovens entraram.

A noite continuava fria,a chuva ainda caia,agora com menos intensidade.Naquele táxi iam dois jovens cheios de planos,sonhos e esperanças.Dentro daquele auto iam duas pessoas com força para prosseguir não interessasse os obstáculos que surgissem em seus caminhos.Eram dois sobreviventes.Eram dois vencedores.

Violetta

Violetta
Enviado por Violetta em 09/08/2009
Código do texto: T1744241
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