Desencontros ( ou A eternidade pode ser cruel)

E se apenas mais tarde me procurares, digo- te: encontrarás apenas a sombra do que hoje me atormenta, do que hoje lateja intimamente em mim. Saibas que aqui ainda existe a pureza de um coração de menina, mas eu me forçarei a arrancar impiedosamente tudo o que existe caso tu não corras para os meus braços depressa. Não tenho tempo para esperar a eternidade, pois o hoje pulsa descontroladamente em mim. Eu quero viver o excesso que impregna a minha alma e que me entrega às fantasias do meu glorioso e fracassado ser. Há ambição em mim: quero-te, quero-te logo, quero-te hoje, quero-te meu. Esperarei a tua mão em mim até a minha alma doer. Depois encontrarás apenas o silêncio das minhas palavras ausentes.

Ao ler essa anotação na agenda velha dela, ele perguntou-se por que havia sido tão covarde, por que havia sido tão desonesto consigo mesmo. Ela estava agora num lugar distante dali. Ele não sabia seu novo número de telefone, seu novo endereço. Ele apenas tinha em sua mente o olhar expressivo dela, o sorriso sereno, a fala doce... Imaginou-se ao lado dela: acariciando seus cabelos, sussurrando em seu ouvindo, beijando sua boca.

Questionou-se. Arrependeu-se. Ele sentiu o peso da ausência. Ele sentiu o peso do silêncio. Ele quis correr para os braços dela, mas nada encontrou. Ele quis ouvi-la, mas já não havia mais aquela voz. Desejou tê-la para, enfim, dizer que a ama. Entretanto, meu caro amigo, “o tempo existe, sim, e devora”. Não sabem eles que apenas uma palavra dele ou dela teria mudado o destino de ambos. Não sabem eles que vagarão em busca de algo que já encontraram e deixaram escorrer pelas mãos. A eternidade pode ser cruel.

A D
Enviado por A D em 06/05/2009
Reeditado em 04/06/2009
Código do texto: T1578770
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