Ônibus Suburbano
“De repente, não mais que de repente” À Natália Alves
Vinícius de Moraes Ao som de Ray Charles
“Baby, It’s cold outside”
Ele subiu no ônibus. Um com um número que ele raramente subia. Mas, desta vez, era preciso que subisse naquele. Mais preciso do que ele imaginava. O dia estava frio, o que era incomum para uma tarde de janeiro. Não chovia pesadamente, mas a garoa caía com intensidade, dando a sensação de estar mais frio do que estava realmente. Antes de fazer o sinal, fechou a gola da jaqueta até em cima, arrumou a mochila nos ombros e bufou.
Enquanto pagava ao cobrador com o dinheiro trocado, olhou em volta, procurando um assento vazio. Os dois olhos percorreram rapidamente assento por assento, fileira por fileira. Desde o primeiro assento até o último. Desde a Senhora de Quarenta Com Filho de Colo, até o Operário Suado E Estafado de Um Dia de Trabalho. Sentiu nojo. De todos naquele ônibus. Não era coisa nova para ele andar de ônibus, mas a maioria dos ônibus lhe dava aquela sensação de asco. “Asco”, pensou, “nojo, embrulho no estômago”. Ainda mais com todas as janelas fechadas devido àquela garoa fina e fria. Olhou de novo e de novo e não encontrou nada. Nenhum assento vazio. Dirigiu-se ao fundo do ônibus, agradecendo por não ter que se espremer entre as pessoas em pé, pois era o único sem-assento, até aquele momento. Antes de olhar para fora, pelo vidro embaçado e úmido de um ônibus, numa tarde de janeiro, seus olhos se demoraram um pouco num assento que não tinha dado atenção, antes. Sentado nele, havia uma garota que, ao contrário de todos naquele ônibus, não tinha o semblante desanimado, ou estafado, nem lhe causava asco. Ela era como uma rosa perfumada em meio a um monte de entulho. “Moça jovem, perto dos 22 anos, cheia de planos e sonhos a realizar”, ele pensou, como se fosse mais velho do que ela, ou do que qualquer outro naquele ônibus. Os olhos claros dela, atrás dos óculos de aro fino, estavam fixos na janela. Não havia nada bonito para se ver lá fora, ele sabia, mas qualquer coisa lá fora era melhor que aquele ônibus. A blusa branca subia e descia lentamente, à altura do busto, ela respirava calmamente, calculadamente, ele diria. Suspirou mais uma vez e olhou para fora.
*
Ela o vira subindo no ônibus. O vira antes, pela janela, fazendo sinal para o ônibus, fechando a gola da blusa, arrumando a mochila nos ombros: “Puro charme vão”, pensou. Olhou-o passando pela catraca, um tanto desajeitado. Não deu muita atenção, ninguém daria. Não havia nada nele de especial. Se algo havia para ser destacado dele, seriam os cabelos, um tanto compridos (e desarrumados, devido à chuva) e os tênis brancos, reluzindo em meio ao jeans escuro e a jaqueta preta. Olhou-o depois, enquanto ele fazia uma certa cara de desânimo, quando não encontrou um assento vazio. Apesar de não ter nada nele que se destacasse fisicamente, ao vê-lo ela não sentiu a mesma sensação que sentia quando olhava outra pessoa daquele ônibus. Aquilo que ela não sabia denominar. Um certo enjôo, mal-estar.
Olhou-o, ainda, enquanto ele vinha em sua direção, ou melhor, em direção à porta de trás do ônibus, e então, só então, desviou o olhar para o lado de fora do ônibus. Para além dos camelôs, além dos ambulantes, além de tudo e todos, como se ela fosse aquele olhar, se distanciando cada vez mais. Sentiu seu coração disparar, quando dirigiu os olhos bruscamente para fora daquela forma, como se olhar alguém fosse proibido. Tentou controlar a respiração, sem tirar os olhos do que quer que seja que olhava naquele momento, ela já não via mais nada. Se tentava ver algo, era silhueta dele, pelo canto do olho. Evitava olhar para o lado, mesmo antes de ele subir no ônibus. Ao seu lado estava o Senhor de Meia Idade Que Gosta de Puxar Conversa, e ela queria evitá-lo.
Surpreendeu-se ao sentir um vazio repentino no assento ao seu lado, mas decidiu não olhar. Ficou onde estava, exatamente como estava. Olhando fixamente para além do vidro úmido, além das ruas úmidas, alem de. Sentiu, poucos segundos depois, algo tomando o espaço do banco vazio ao seu lado. Ouviu um “Com licença”, um pouco abafado, mas de uma voz masculina jovem, um pouco rouca. Sentiu o vento de uma mochila sendo colocada no colo, cheiro de chuva e desodorante. Mas decidiu, ainda, não olhar.
*
Ele se distraía com os pingos de chuva que escorriam pelo vidro úmido do ônibus. Pensava em coisas longínquas, que provavelmente jamais viriam a acontecer; ele era assim: sempre pensando coisas, fantasiando coisas, sonhando coisas, em todo o tempo. “Desligado”, sua mãe dizia. Os pés latejavam um pouco. Não havia caminhado muito, mas os tênis já bem gastos não ajudavam muito. De quando em quando virava a cabeça de um lado para o outro, procurando um assento. Seu corpo se movia inconsciente, pois sua mente não estava ali. E era melhor assim. Dentro daquele ônibus asqueroso, cheirando a suor, desânimo e conformismo, nenhuma mente poderia agüentar muito tempo. Os olhos dele se moviam às vezes para um lado e para o outro, mas ele nada via. Ou melhor, via. Ele conversando com ela, naquele dia fatídico. Quantos dias fatídicos ele teve. As lágrimas dela sendo impedidas de escorrer pelo indicador dele, levemente flexionado, percorrendo com ternura o caminho que a lágrima havia percorrido, só que no sentido contrário. Via tudo o que poderia ter acontecido e não aconteceu. Essa lembrança voltava à mente dele com freqüência. Mas, desta vez, o filme lento em sua mente foi interrompido abruptamente. Alguém se levantara.
Dirigiu o olhar para o banco vago e surpreendeu-se ao ver, ao lado dele, a moça de olhos claros e blusa branca. Enquanto sentava-se ao lado dela pediu licença, mas sua voz não saiu. Era como se ele nunca tivesse falado antes. Era normal. Nossas vozes costumam omitirem-se quando são usadas para bons-modos vãos do dia-a-dia. Quando sentou-se, não percebeu movimento algum da parte dela. As pessoas, geralmente, afastam-se um pouco, acenam brevemente com a cabeça. Nem o olhar ela virou para ele. “Talvez ela já tenha desistido dos bons-modos vãos típicos da sociedade.”, ele pensou pesaroso, pois já tinha tentado fazer o mesmo há muito tempo. O pensamento viajou uma vez mais. Sem que ele percebesse, seus olhos insistiam em fitar a garota ao seu lado.
*
Ele se sentira atraído por ela, não só fisicamente, mas algo entre suas mentes, ou qualquer coisa superior dessa magnitude, se interligava. Eles estavam tão perto. Ela pensava em por que ele não parava de olhá-la daquela maneira. Algo sussurrava coisas em seu coração. Coisas que ela não entendia. Ainda assim, preferiu continuar olhando pela janela daquele ônibus de subúrbio. Ele pensava em por que ela se mantinha tão distante. Pensou em tentar conversar. “Oi, você tem horas?”, ou “Que chuva, não?”, essas coisas banais que se diz quando a gente tenta se comunicar com um desconhecido. “Se ela se virar, eu falo”, pensou. “Ele vai dizer alguma coisa”, ela pensou. “Oi, gatinha, a gente já se viu por aí? Talvez naquela balada?!”; não, ele não tinha cara de quem freqüentava baladas, ou de quem falava gatinha. Ele parecia ser mesmo diferente do tipo de rapazes que existem por aí, hoje em dia. Ele pensava em algum verso de improviso; alguma frase de efeito, quem sabe? “De repente, não mais que de repente”, não... Ela não parecia gostar de poesia. Mesmo assim, Vinícius nunca falha. Não. Melhor ficar quieto. Ela acreditava em amor verdadeiro. Mas não acreditava em casualidade. Ele já havia tentado o amor verdadeiro muitas vezes, em vão. Acreditava em Deus.
Estavam ali, os dois. Lado a lado, no mesmo ônibus, tão perto. Mais perto do que muitas pessoas chegam umas das outras. Mas estavam separados. Cada um em seu mundo. Não havia contato físico, nem visual. Não havia contato. Poderiam ser a metade um do outro, mas estavam distantes um do outro. E estando, física e mentalmente, isolados em seus próprios mundos, mesquinhos e fechados, qual a possibilidade de se encontrarem no mesmo ônibus, sentarem-se um ao lado do outro e se conhecerem e encontrarem no outro o que acham faltar em si? Um contato, um olhar, um toque, bastava para acabar com aquele isolamento dos dois. Como uma bolha de sabão que os envolvesse, bastava uma leve brisa para separá-los para sempre e um simples toque para fazê-los esbarrar e entrar em contato com o outro.
E, segundo ele, graças a Deus; segundo ela graças a falta de tato dele, esse contato aconteceu. Ela baixara a guarda para arrumar algo na bolsa, quando ele tirou o papel e a caneta do bolso para anotar algum devaneio, o cotovelo dele bateu no braço dela.
- Desculpe! - ele disse, agora com a voz já firmada.
- Não foi nada! - ela respondeu com um sorriso meigo nos lábios.
- É que eu sou meio desajeitado – e retribuiu o sorriso.
- Então somos dois – depois de ter deixado algo cair da bolsa.
- Eu pego. – abaixando-se.
- Pode deixar. – abaixando-se.
*
Então aconteceu. Aquela cena de filme, que acontece ao menos uma vez em nossas vidas. Às vezes despercebidamente, às vezes significativamente. Nesse caso, aconteceu significativamente. As mãos se tocaram. Depois foram os olhos que se cruzaram. E, dentro daquele ônibus asqueroso, suburbano, cheirando a cachaça digerida, cigarros já fumados, sonhos perdidos, desilusões, trocados, moedas, numa tarde fria de janeiro, as bolhas finalmente estouraram. Uma cena tão bela, tão magnificamente romântica e ninguém parou pra ver. Estavam todos ali dentro daquele ônibus separados daqueles dois. Todos dentro de uma mesma bolha, com a ilusão de individualidade, separados daqueles dois, agora já livres de todos os bons-modos vãos e de todos os muros, barreiras, bolhas, que os separavam.
Ela corou, ele também, mas os olhares não desviaram, desta vez. Sustentaram-se. Foram subindo junto com os corpos, de volta aos bancos. As mãos se separaram abruptamente, porém sem vontade. Sentaram-se e falaram. Falaram de tudo o que havia para falar. Em entrelinhas falavam daquela escória que pegava aquele ônibus suburbano. Ela disse que, quando subia num ônibus daquele, sentia um enjôo, algo bem aqui, que parecia que ia. Ele a ensinou a expressão que tanto gostava: asco. As-co, ela repetiu e se sentiu satisfeita por poder expressar todo aquele nojo. Falaram dos bons-modos vãos que a sociedade impunha nos tempos de hoje. Falaram de música, de MPB, de como a música foi se degradando ao longo do tempo, de Ray Charles, que ele estava aprendendo a gostar, de Beatles, que ela nunca ouvira direito. Falaram de Vinícius, que ele tanto amava; de Clarice, que ele não havia lido ainda. Falaram. Falaram como se o tempo não existisse. Como se fossem ao mesmo lugar.
- Seus olhos são lindos. – ele disse, corando e se sentindo um romântico antiquado e imbecil que não se adaptava ao século XXI, onde as pessoas civilizadas não dizem mais tais coisas dentro de um ônibus.
- Sua voz é doce. – ela disse, corando e pensando que o que ele disse já fora dito à ela tantas vezes, mas desta vez, só desta vez, soava como verdade.
- Eu não quero perguntar onde você vai descer.
- Eu prefiro não saber onde você desce.
- Não quero saber sua idade.
- Se soubesse sua, provavelmente, nem teria falado com você.
- Isso magoa. Estereótipo do século XXI, onde a idade define o caráter e o nível de maturidade de alguém.
- Desculpe.
- Só me olhe novamente, e te perdôo pra sempre.
Ela sorriu. Ele também. O coração batia acelerado no peito de ambos. Se tal som fosse audível, se ouviria apenas um som. Ritmicamente sem ritmo. Ele queria tocá-la. Ela queria beijá-lo. Não fosse tão novo. Não. A idade não importava. Es-te-re-ó-ti-po, pensou, memorizando para escrever em algum lugar depois. A conversa cessou. Só havia os olhares, agora. Os rumores daquele ônibus do subúrbio eram inaudíveis para os dois. Não havia lembranças, bolhas, ascos, estereótipos, palavras, peitos palpitantes, nem nada. Somente os olhares.
Ficaram assim durante muito tempo. Tentando decifrar os olhares um do outro. Talvez telepatia, nirvana, qualquer coisa que os ligasse além daquele olhar. Ele fechou os olhos um segundo, aspirou o perfume dela, cautelosamente, para lembrar-se depois; de olhos fechados tentou desenhá-la: era fácil. Ela o viu assim, de olhos fechados e pensou em um beijo; fechou os olhos, também, e tornou a abri-los, quando não percebeu movimento algum da parte dele; ele não faria isso, ela pensou; clássico demais para isso. Ela tocou os cabelos dele; eram macios, úmidos por causa da chuva lá fora. Chuva. Nem se lembrava mais da chuva, nem de lá de fora, nem de nada que não fosse aquele ônibus sujo, onde o havia encontrado. Ele tocou os cabelos dela, depois o rosto, os lábios... Resolveu repousar a cabeça nos ombros dela, para evitar qualquer deslize. Ela suspirou. Ele também. Amavam-se. De uma forma tão pura e tão simples que era impossível que acontecesse num ônibus daquele, numa tarde fria de janeiro. Mas amavam-se, não importava o que qualquer um dissesse naquela hora, ou viesse a dizer depois.
*
Ela abriu os olhos, um pouco ofuscados. O sol mostrava-se lá fora. De repente, não mais que de repente, como se caísse em si percebeu que seu ponto era o próximo. Não queria descer. Não queria. Mas era preciso. Com delicadeza, tirou a cabeça dele dos ombros, aspirando o último cheiro dos cabelos dele. Ele a olhou nos olhos claros. Ela o olhou nos olhos castanhos.
- Meu ponto. – ela disse, um pouco triste.
Ele não sabia o que dizer. Agora seria hora de um beijo, talvez dizer “Fica”, qualquer apelo romântico que acontece em todos os filmes de amor. Mas isso era a vida. Num filme o ônibus jamais pararia, os dois ficariam ali, para sempre. Se amando pra sempre. Ele recostado no ombro dela, ela olhando o dourado do sol, campos de trigo ao fundo. Mas não. Lá fora havia a garoa intensa, pessoas apressadas, sem tempo para o amor, para a poesia, para os filmes de romance. Ela se levantou, decidida.
- Fica – ele disse, mas sua voz voltara a ser abafada e inconstante.
- A gente se vê. – ela disse, com uma falsa esperança, uma piscada breve.
A porta se abriu. Ela o olhou novamente nos olhos. Ele viu novamente a blusa branca subindo e descendo, agora rapidamente. Ela já o vira em pé antes; ele não. E como era ainda mais bela. Nem era tão mais alta do que ele. Eram tão iguais. E, quando ia perguntar pelo nome dela, um endereço, um telefone, qualquer coisa que os levasse ao reencontro, a Senhora de Quarenta Com Filho de Colo e o Operário Suado E Estafado de Um Dia de Trabalho a levaram para o lado de fora do ônibus. Ele pulou para o banco onde, segundos atrás, sentava-se seu grande amor. Tentou dizer algo pelo vidro úmido daquele ônibus sujo de subúrbio, fazer qualquer gesto, mas não encontrou nenhum. Pode apenas vê-la seguindo seu caminho. Ela disse algo, mas o ônibus já havia se afastado.
Ela balançou a cabeça negativamente, com um semblante desanimado, mas esperançoso. Desistiu de gritar seu nome. Continuou seu caminho. Chegou em casa, sentou-se na cama, depois deitou-se, fechou os olhos, cheirou os dedos e encontrou um resquício do cheiro dos cabelos dele. Ele. Ela o chamaria assim para sempre. Não sabia o nome Dele. Renato, Maurício, Miguel, nenhum nome a satisfazia tanto quanto aquele: Ele. Levantou-se, foi até a cozinha, pegou o caderno e a caneta em cima do microondas, colocou seu prato dentro do mesmo, programou para dois minutos e sentou-se. Colocou o caderno sobre a mesa, destampou a caneta, chupou a ponta do dedo onde ficara um poço de molho de tomate e pôs-se a escrever. E começou escrevendo: asco...
*
Ele ficou no ônibus ainda por muito tempo. Olhou para fora, para dentro, fechou os olhos... Nada adiantava. O ônibus voltara a ser aquele ônibus sujo de subúrbio, cheirando a asco. Deu espaço para o Senhor Aposentado Que Gosta de Puxar Conversa, colocou os fones no ouvido e fechou os olhos. As lembranças voltaram, novamente. As lágrimas escorrendo, as mãos se tocando, o indicador levemente flexionado, a porta do ônibus se abrindo, as lágrimas molhando um sorriso, a blusa branca subindo e descendo ritmicamente, ela indo embora, Ela indo embora. “Ela”, pensou. Desceu do ônibus, ajeitou a mochila nos ombros, balançou os cabelos e bufou. Chegou em casa, deu um “Oi”, com a voz abafada, foi para seu quarto. Jogou a mochila no chão, tirou os tênis, a jaqueta, ligou o computador. Foi a cozinha, pegou um doce qualquer, sua caneca de café (a preta que havia comprado só para ele), voltou ao quarto. Fechou a porta. Mordiscou um pedaço de doce, tomou um gole de café, colocou tudo sobre a escrivaninha e deitou-se na cama. Tentou recompor o rosto Dela. Não conseguiu. Tentou lembrar do perfume dela. Não conseguiu. Tateou até achar a jaqueta, pegou-a, trouxe-a até as narinas. Aspirou a gola profundamente, até encontrar o cheiro dela. Sorriu. Levantou-se, sentou-se ao computador e pôs-se a escrever. Pensou em começar pelo nome dela. Mas não o sabia. Ela. Seria sempre e pra sempre Ela. Se houvesse um nome, talvez, a história ficaria mais real. Fernanda, Clara, Lúcia, Sofia... Não. Ela era o mais satisfatório dos nomes. Não importava o quão inacreditável ficasse. Era Ela, e seria sempre.
Todos os dias, desde então, Ele pega um ônibus, aleatoriamente, pedindo a Deus para que seja naquele. Ela faz o mesmo, mas não pede nada a ninguém. Ele aprendeu a deixar os bons-modos vãos da sociedade de lado e Ela largou os estereótipos que a sociedade, ou a mídia, impõem. Eles agora suportam o cheiro de cachaça digerida, cigarros fumados, sonhos perdidos, desilusões, cansaços, histórias... Sempre que pega um ônibus Ele imagina como teria sido... Ela não desgruda os olhos da janela, olhando para além dos camelôs, ambulantes, vendedores, de tudo e todos, querendo que alguém se sente naquele assento vago ao seu lado e diga com a voz abafada “Com licença.”.
Eles jamais se esqueceram daquele dia em que encontraram de repente, não mais que de repente, o amor de suas vidas, num ônibus suburbano sujo, de vidros úmidos, numa tarde fria de janeiro.
William G. Sampaio [28/1/2009]