DESENCANTO
Ele vinha sempre no mesmo horário, tomava seu ônibus e seguia, nem a percebia ali, na janela de seu apartamento.
Olhava seu jeito de andar, seu cabelo (às vezes esvoaçante, outro molhado e grudado na cabeça, mas nem por isso menos lindo), suas roupas jogadas, como se não se importasse com a vida, bem displicente.
Seu nome ela descobriu ao ouvir um amigo chamando: Oi Marinho, me espere!
Marinho!!!
Passou a sonhar com um homem, agora com nome.
Imaginava sempre os melhores momentos, os melhores lugares e as coisas mais loucas e gostosas que eles poderiam fazer juntos.
Sonhava com ele chegando e a pedindo em namoro, sonhava com os beijos, com o casamento, os filhos... tinha sempre a sensação que teriam uma filha linda como ele.
O dia passava, ela cuidava de seus afazeres e, ao cair da tarde, voltava para a janela e, por volta das 18h30min ele passava de volta. Ar cansado, displicente, nem sequer a notava e nem percebia nada a sua volta.
Era sempre assim ele ia e vinha sem se aperceber de nada, nem de ninguém, a não ser aquela vez que o amigo o chamou e ele apenas parou e esperou, mas nada disse.
Fim de ano. Fogos de artifícios, bebidas, algazarras numa praça próxima a casa dela. Ela está com suas amigas participando dos festejos quando, de repente, seus lábios se abrem em um sorriso feliz e seu coração dispara...
Lindo, em uma calça branca e camisa azul ele está parado. Seu rosto com um sorriso terno, apaixonado e vivo, sem aquele ar ausente. Ela fica feliz, continua a olhar imaginando uma forma de chegar perto dele e desejar feliz ano novo.
Ela percebe que com o seu sorriso iluminado e feliz, ele está olhando para outra direção... se vira e vê uma linda menina indo ao seu encontro com os braços abertos, e atrás dela está uma mulher também com o mesmo olhar terno e apaixonado olhando para ele...ela
Continua olhar e vê os dois se beijando.
Lágrimas brotam em seus olhos e ela continua a olhar para eles, não consegue desviar o olhar daquele casal feliz.
Ele parece perceber que tem alguém olhando para eles, vira e seus olhares se cruzam pela primeira e última vez... ela desvia o olhar e vai embora.
Acaba-se ali o sonho de um amor.
Kedma O’liver
Santos-janeiro de 2008