Não haverá outra vez

Dirigindo meu carro, naquela chuva, não tinha medo de mais nada, exceto da reação dela ao saber da notícia.

- Onde você está? Disse que já estava chegando... – ela perguntou ao telefone.

- Estou quase aí, aguarde cinco minutos.

Dentro de mim havia várias coisas, inclusive um sentimento muito obscuro que parecia ser uma mistura de alívio com tristeza e felicidade. Realmente não sabia o que falar à minha amada. Ela iria chorar, chorar, chorar... eu até poderia esconder, mas não acho justo, ela deve saber o que está acontecendo comigo.

Cheguei, estacionei o carro embaixo de uma árvore, e ela veio, mesmo em baixo de uma chuva torrencial, me abraçar.

- Ai que saudade, meu amor! – ela disse logo ao lado do meu ouvido enquanto seus braços me envolviam fortemente, com tamanha ternura.

- Também estava com saudades! – sentindo o calor daquela linda mulher que se entregara a mim, meus olhos encheram de lágrimas e eu abri um sorriso amarelo.

- Me diz, você foi ao médico, o que ele falou? – ela perguntou preocupada, mas com um toque de felicidade no olhar

- É disso que eu vim falar, vamos entrar.

Nós entramos dentro de um barraco de madeira, onde a gente sempre se encontrava quando nos víamos. Aquele barraco tinha presenciado tantas coisas! A primeira vez que a gente se viu, nosso primeiro beijo, nossa primeira briga... Sentei-me no chão, em cima do monte de edredons, lençóis e cobertores, que formavam uma mera caminha desconfortável. Ela sentou à minha frente. Segurei as mãos dela forte, olhei em seus olhos e suspirei, procurando o que falar e já, o que acalmar aquela fêmea.

- Ai meus Deus, o que o médico disse? – ela percebeu minha angústia a parecia mais angustiada que eu.

- Bom... a minha doença, durante o tempo que tomei os remédio, fiz o tratamento, enfim, só se agravou. Não teve resultado nenhum todos aqueles remédios e tratamentos, e eu só piorei. – engoli em seco enquanto via seus olhos encherem de lágrimas – Eu não queria te dizer isso, mas... eu posso... morrer, a qualquer momento. – As lágrimas que até então se seguravam nos olhos belos daquela moça, rolaram com veracidade na face dela, e as minhas lágrimas, simplesmente rolaram como as tantas outras ao saber da notícia.

- Mas... você não pode morrer! A gente nem... meus pais nem te conhecem, e eu nem conheço seus pais. A gente não devia ter demorado tanto pra deixar isso sério, agora a gente nem tem mais tempo! E a filha que a gente queria ter?! A casa? E o nosso amor? Ele não pode acabar assim! Não pode. Você não pode ir, não pode me deixar! Por favor, não me deixa! – Desesperadamente ela me abraçou forte, como se já fosse a ultima vez e meu ombro se encharcou de tantas lágrimas, tanto quanto o ombro dela. – Eu te amo tanto, não posso viver sem você! Eu temia que isso acontecesse, mas não pode acontecer! Me belisca pra mim acordar desse pesadelo, pelo amor de Deus!

- Eu vim pra passar meus últimos dias com você, meu amor. Minha mãe e meu pai vão vir pra cá daqui três dias, por que... Bom... Você quer se casar comigo? - ajoelhei-me após dizer a frase que todas as moças do mundo esperam por toda a vida e mostrar um anel muito bonito que tinha comprado a ela, sorri feliz, enquanto minhas lágrimas não se continham dentro do meu olho e rolavam pela minha face.

O mesmo acontecia com ela, sorria e chorava. Não era irônico? No meio de uma situação tão trágica, nós dois ali, sorrindo de felicidade, e chorando de tristeza.

- Ah meu Deus! Ela apanhou o anel, olhou-o mais de perto e sorrio. Ajoelhou-se em frente a mim e me beijou, me abraçou. – Sim! Vamos nos casar em três dias! Ai Felipe, eu te amo tanto!

- Eu também te amo, Juliana. Muito! – e nos abraçamos de novo, cada vez mais forte. – Sabe Ju, dizem que quando... a gente morre, o anjo que vem nos buscar pergunta o que a gente mais gostava aqui. Se eles me perguntarem, eu vou dizer que é você.

Amanheceu, e eu acordei com o barulho dos passarinhos e com um beijo estalado de Juliana. Quando me dei conta, havia uma toalhinha sobre o chão, e sobre ela, um café-da-manhã esplendido, com morangos, suco, pão...

- Nosso primeiro café da manhã juntos. – seus olhos brilharam, e ela tentou disfarçar sua tristeza.

- Oh, meu amor! E eu sorri.

Tomamos o café, estava delicioso! E depois, como dois preguiçosos, ou talvez, dois apaixonados, deitamos e ficamos lá, simplesmente deitados, juntos.

- Vamos sair! Vamos passear! A gente não pode ficar aqui dentro o tempo todo! – ela riu como uma criança, o que era música para meus ouvidos. E saímos. Fomos passear.

Nós andamos de bicicleta, nadamos, corremos, demos risada... Eu fui com ela, e ela escolheu o vestido do casamento. Quando ela saiu do provador naquele vestido, nossos olhos encheram de lágrimas. Ela era, com certeza, a mulher mais linda desse mundo! Quando a vendedora descobriu que eu era o noivo, ela quase me expulsou da loja, dizendo que o noivo não pode ver a noiva antes do casamento! Mas comigo e com a Juliana, era diferente. Tudo era diferente com nós dois.

Gastei todo o dinheiro que me restava. Comprei o vestido de noiva dela, comprei meu terno, nossas alianças... Por incrível que pareça, naquele dia, nós simplesmente esquecemos da tristeza, e não parávamos de sorrir. Sem nem mesmo lembrar que poderia ser o último sorriso.

À noite caiu, e poucos minutos antes de entrar no banho, senti uma coisa muito estranha dentro de mim, como um sinal.

- Amor! Vem aqui um pouquinho? – gritei calmo, para que ela viesse.

- Sim, meu noivo! – disse ela, usando o vestido que usaria no dia de nosso casamento, no dia seguinte. – Diga.

- Venha cá. – pedi sorrindo. E ela foi. Abaixei a alça do vestido de pedi para que fizéssemos amor.

Ela, apesar de estar um pouco assustada, concordou. Tirou o vestido e me amou. Tomamos banho juntos, fomos para o monte de cobertores, que pode se chamar de cama. Nós nos amamos. Sentir o calor daquela mulher foi a melhor coisa que me aconteceu durante toda a vida. Foi algo inexplicável. Não foi sexo, foi amor! Ela percebeu que não haveria casamento, que não haveria outro café da manhã, que não haveria mais esse calor que sentíramos. Ela e eu suspiramos ao mesmo tempo e disse:

- Juliana, meu amor. Promete-me que você nunca irá se esquecer que eu te amo! Que você foi e independente do que acontecer, sempre será a mulher da minha vida. Eu te amo.

Juliana, com os olhos brilhando de novo, cheios de lágrima, olhou em meus olhos e sorriu:

- Eu prometo. E eu também te amo muito! Nunca ninguém irá te substituir. E ela me abraçou forte, segurou em meu peito que ficava cada vez mais gelado e a última coisa que senti foi um beijo e uma lágrima escorrendo sobre nossas faces.

Isabela Pereira Viruel

Pietra Sobierre
Enviado por Pietra Sobierre em 14/03/2009
Código do texto: T1486067
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