Olhares

Olhares....

Já cansada de dirigir, ela faz uma parada num desses postos de rede, das grandes rodovias. O cansaço agravara-se pela anterior reunião de trabalho:...sempre as cobranças!

Sempre as novas metas mais audaciosas! Sempre as cifras mais necessárias!!!

Tão absolta estava em seus pensamentos, que automaticamente pediu um café e um pedaço de bolo. Já sentia ansiedade pela incerteza de não poder cumprir as exigências do escritório central.

Enquanto mexia seu café, enfadonhamente, percebeu um vulto que passou por ela e foi até o outro lado da “ilha” do balcão, bem a sua frente. Levantou os olhos atraída por um timbre de voz masculina tão agradável quanto foi a visão da figura do homem que pedia um café.

Maduro, já grisalho, esguio em sua roupa social, rosto bonito e um sorriso contagiante, que mesmo simplesmente fazendo seu pedido, parecia contar uma gostosa anedota.

Distraída observando o moço, não pode evitar quando seus olhares se cruzaram. Rapidamente abaixou a cabeça, completamente desconcertada, e rindo de si mesma.

Instantes depois, a curiosidade a fez levantar o olhar, e novamente se entreolharam, ela com uma expressão de quem foi pega em fragrante, ele tão a vontade que já exibia um sorriso maroto.

Num gesto espontâneo ele levantou a xícara como a propor um brinde, mesmo estando totalmente sem graça, ela repetiu o gesto, como a se mostrar tão natural quanto ele estava.

Por mais que ela tentasse desviar o olhar, não conseguia parar de olhá-lo. Então percebeu que ele chamou a garçonete, pediu pra que ela servisse no balcão da frente, a mesma coisa que a “moça”

consumia, só que para dois, e naturalmente caminhou até onde ela estava.

Ao perceber sua aproximação, uma invasão de sensações pulsantes a dominou. Ela zangou-se consigo mesma, temendo que fosse perceptível, esse seu descontrole. Porque isso? Era só um café e

uma pequena conversa sem qualquer outra conseqüência! Que mais poderia acontecer ali?

Ele chegou ainda sorridente e já falando:

_ Como não gosto de brindar à distância tomei a liberdade de pedir outro café, pra brindar aqui, com

o tradicional “tim tim”....sorriu, numa pausa...já que não sei se é hora, ou se é possível, que seja uma taça de espumante!!

Ela só conseguia sorrir entre o encantamento do charme e iniciativa dele e a tentativa de dissimular sua “sem grasses”....

_Então..reiterou ele, ficamos no café?

Controlando seu desconcerto, respondeu coma maior naturalidade que lhe foi possível:

_ Sim...mesmo sendo já, as últimas horas da tarde, melhor manter o café! E brindes ganham graça na intenção não no componente...

_ Muiiito interessante...isso mesmo, as intenções!!...falava ele com clara satisfação.. Olha, chegou o café, agora me diz ao que você vai brindar??

_ Mas foi vc quem propôs o brinde, é justo que seja você a dizer primeiro, sua intenção. Ela dizia tentando ganhar tempo para pensar no que responder, já que o que tinha em mente, não seria conveniente!

Mas ele logo retrucou:

_ Como cavalheiro que sou, passo a vez para a dama que me acompanha... e sorrindo completou, E não nego que seja também, uma estratégia de sondar, como conduzir a minha intenção!!..Ah, lembremos que o café esfria rápido... Sorriu ainda mais maroto.

_ Bom eu brindo à agradável surpresa que a vida pode nos presentear, mesmo na tarde mais chata e pesada, dos nossos dias!!!

Diz ela, convencida de que se saiu bem.

O sorriso e o olhar dele mudaram completamente, sem esconder a envolveu com um olhar de sedução e um sorriso de satisfação.

_Aos presentes da vida, para que nunca sejam desperdiçados ou desvalorizados e a sincera intenção de “desembrulhar”, com você, este presente...

Sentindo as pernas bambearem, e o batimento do coração entrarem em descompasso, pediu socorro à razão, para com certa dificuldade, conseguir responder:

_Não é certo que alguns presentes devem ser guardados, imaculados, para que não percam o encantamento?

Não é prudente que o levemos intocado, para não caírem no “lugar comum”?

_ Não!!! Não!!..não é isso o correto, ninguém recebe um presente, e o guarda sem desfrutar! Vamos sair daqui, sem medos, sem perguntas, sem buscar a razão ou explicação. Vamos viver o desejo deste momento...Venha!.. diz ele, já a conduzindo pela mão.

Passam pelo caixa, quase atônitos, e só param diante do carro dela!

__Deixa teu carro aqui, que eu a trago de volta, tão lo...Ia continuar, mas ela o interrompeu:

_ Não posso fazer isso, é loucura, insensatez, nunca nos vimos antes e eu sou casa..

_ Somos!! Interrompeu ele..somos os dois casados. Se está certo ou errado não sei, sei que o que importa é que queremos!

Está nos teus olhos , estás nos meus, que queremos!! Não se preocupe. Toma, guarda contigo a minha carteira, não sou nenhum bandido, nem nenhum tarado que seduz mulheres em cafés das estradas...mas quero viver o que estou sentindo. Quero estar com você!..É tão raro esse tipo de empatia e atração. Porque não??

Ela sabia que não devia, que nunca fizera nada parecido antes, mas a intensidade do desejo era bem maior que qualquer sensatez.

Só conseguiu responder com um sorriso!

Ele a abraçou carinhosamente e abriu a porta do carro. Seguiram quase calados, já que não queriam perguntas , nem envolvimento.

Falaram tão somente do momento anterior, das sensações despertadas. De quando em vez, ele levava a mão dela

aos lábios, tentando acalmar o tremor perceptível.

Entraram no primeiro motel, e tão logo a porta da garagem se fechou, ele a beijou longamente. O beijo desejado desde os primeiros olhares. Beijo intensamente correspondido. Beijo de descobertas de sensações e emoções que pareciam anteriores. Beijo que não se resumiu a apenas desejo sexual.

Subiram as escadas, completamente entrelaçados, como se não fosse mais possível que os dois corpos se separassem.

Entre carícias e peças de roupas que caíam, havia uma sofreguidão não só do prazer da química da pele, mas dos

olhares profundos, dos sorrisos cúmplices, dos murmúrios e gemidos tão expressivos.

Os momentos seguintes não poderiam ser medidos em espaço temporal. Carregados de tanta intensidade de emoções,

certamente quebraram os limites do tempo, do espaço e da dimensão. Descrever essas emoções ficaria pequeno, diante de como foram sentidas!!

Mas, a vida lá fora os chamava de volta. E diante da mais indesejada decisão, saíram os dois do chuveiro, se vestiram e desceram até o carro. O silêncio agora não era mais um aliado, era um carrasco a impedir tantas coisas que queriam ser ditas. Mas acordos anteriores foram feitos. Sem perguntas, sem envolvimento, isso era o mais prudente.

Quando ele estacionou seu carro ao lado do dela, já no meio da noite, quis dizer algumas palavras, mas ela balançava a cabeça negativamente tinham que ter juízo, recobrar o juízo.

A despedida foi um apertar das mãos unidas, como se ambos buscassem copiar as impressões digitais do outro, um olhar de tanta profundidade que os olhos dos dois marejaram. Ela saiu apressadamente antes que chorasse, entrou no carro e saiu sem nem olhar para trás, temendo a fraqueza de não resistir, e voltar!

Dirigia sem pressa, entre o relembrar de cada instante anterior, e a tentativa de se convencer de que tudo fora um sonho bom, mas já passado, e que a vida seguiria normalmente, mesmo que lágrimas rolassem pelo seu rosto.

Já havia seguido alguns km, quando percebeu q um farol se aproximava rapidamente, piscando como se a sinalizar. Entre o susto de que fosse algo grave e a esperança de uma surpresa, deixou que o carro se emparelhasse ao dela, a buzina tocou e ele grudou no vidro do passageiro um número de celular!

Com um sorriso incontido, ela buscou rapidamente uma caneta, anotou no canhoto do recibo do pedágio e ficou observando o carro que logo desapareceu, na primeira saída da rodovia!!!

m.raposo*

UmaMonalisa
Enviado por UmaMonalisa em 08/03/2009
Reeditado em 08/03/2009
Código do texto: T1476331