Diário de primavera
De longe senti o aproximar do frio, já era primavera no sudoeste europeu, as ruas exalavam o cheiro advindo da nova estação. Senhoras abastadas em seus luxuosos automóveis desfilavam na cidade, outras nem tanto usavam o cachicol próprio para a época. Casais nas ruas a contemplar as flores do jardim público, pronunciavam a paixão em seus beijos magmáticos.
O olhar apaixonado primaveril anunciava o compromisso futuro e no meio de tantas juras deparei-me com uma cena se não curiosa, encantadora. Conheci uma jovem chorosa aos pés de uma araucária, era tão interessante a sua sonora que balbuciava algo entre os constantes soluços, ao me aproximar da moça, disse: Porque choras? Num tom suave e em doce riso, ela disse: É que meu namorado olhou-me nos olhos e declarando-se enfatizou: Te amo, Lia, e como não possuo recursos financeiros para comprar um "bouquet" dou-lhe meu coração como a maior prova de meu amor por ti, logo após em lágrima ele saiu.
Era dia dos namorados na bela Lisboa, os rapazotes passeavam em suas modernas bicicletas a enamorar as raparigas, que sempre acompanhadas por seus responsáveis respondiam à paquera através do leve sorriso.
Lia depois de contar-me sua história disse não entender o porque da saída súbita de seu amado. Seria vergonha ser pobre? Ou desmérito me amar? Entre automóveis e cachicóis, o que vale mesmo é essa sensação de amor que exala em nossas corações, afinal existe maior prova amorosa que remeter tempo e sentimento para a pessoa a quem se quer?
Ao terminar sua fala Lia encontrava-se mais aliviada pelo desabafo frente ao desconhecido, mesmo assim permanecia cabisbaixa, quando viu aproximar de ti um homem que carregava um pequeno objeto em suas mãos, na verdade o sujeito estava num estado farroupilho, descalço e de trajes de banho. Lia embranqueceu-se ao ver a face do homem, era Léo, seu namorado, que sorria timidamente ao olhar para o rosto inocente e aconchegante da amada.
A rua estava tomada de pessoas, além do convite próprio da estação era tempo de férias escolares e os pais também participavam da recreação dos filhos.
Lia ergueu-se e como ao receber uma flecha Léo declinou-se em joelhos, abriu o "simples e rico" embrulho, tão humilde, artesanalmente feito com papel de pão, retirando-o do mesmo o anel de compromisso, dizendo: "Na vida me faltam muitos ítens, dinheiro, roupa, carro, mas querida Lia, mesmo sem tudo isso me sentiria completo, se tivesse eternamente você. Lia olhava-o admirada, suas mãos gélidas deflagravam a tensão do momento, a timidez tomava conta de sua aparência em tom avermelhado que estendia-se pela face.
Eram 19 horas na agitada Lisboa, os pássaros já tinham se recolhido, as estrelas já assistiam do alto o troféu celestial: a vida vivida com amor.
De repente um riso desesperado tomou conta da moça, que paralelamente abraçou o seu amado, rolando-se na relva e gargalhando como uma apaixonada. só então ele a parou dizendo: "Meu doce amor, antes tinha quase nada, acabei vendendo a roupa do corpo em troca da minha felicidade, agora possuo tudo, pois o espaço que faltava em mim foi preenchido.
Agora já tenho sonhos,
tenho força,
tenho pés,
tenho você!
Sob o estrelado céu, amaram-se em paz.
Em 24-01-09.