Os Olhos do Faraó - Parte 2
O Faraó tirou um dos colares de seu pescoço. Um que continha uma bela e misteriosa pedra de coloração azul escura. Ele então o colocou no pescoço de Anath.
-Não ouse nunca tirar esse colar. Ele indica que és meu e de mais ninguém. Agora vem, e olha nos meus olhos novamente, pois hoje eu te amarei, meu filho, assim como farei todos os dias que se seguirão. – Disse tocando delicadamente o rosto de Anath para em seguida beijá-lo nos lábios.
Anath assustou-se a princípio, mas os carinhos do Faraó eram tão doces e confortantes que o jovem entregou-se. Os suaves beijos eram distribuídos por sua pele morena, seu pescoço, seu forte peito, causando-lhe prazerosos arrepios.
Aquele homem, aquele Deus, olhava para o jovem servo com a mais pura adoração. Anath sentia-se amado e respeitado por aqueles olhos. Sem dificuldades, entregou-se completamente ao faraó, e naquela noite os dois se amaram, assim como fizeram por todas as noites que se seguiram.
Mas esse amor despertou a ira da rainha contra Anath, afinal, semanas se passaram e nem ela, nem as concubinas eram chamadas ao quarto do Faraó.
-Eu gostaria de saber o que tu tens de tão especial para meu irmão apreciar tanto a tua companhia... Tu não passas de um pobre escravo hebreu. - A rainha falava maliciosamente enquanto analisava e passava a mão pela pele morena de Anath. Ela estava aproveitando a ausência do Faraó para iniciar sua vingança. – És belo, é verdade, mas apenas isso não justifica, uma vez que meu irmão pode ter quem quiser, inclusive pessoas mais belas que tu... Deves então amar de uma maneira espetacular. Isso! Só pode ser isso! Por que não me mostras como amas?
Anath porém apenas ignorava tudo o que ela falava. A olhava como se ela não existisse, e a falta de reação dele a irritou.
-Vamos! Ame-me como fazes com meu marido! – Esbravejou, arrancando suas próprias roupas, exibindo suas belas curvas. – Não vais amar-me?! – Gritou com o escravo, desferindo-lhe um tapa no rosto em seguida.
Anath apenas virou o rosto de volta para encará-la e respondeu secamente:
-Sou apenas de Nasu.
-Maldito! – A rainha ia bater-lhe de novo na face, mas teve a mão segura.
-Não compreendeste que não tens o direito de tocar em meu filho? – O Faraó repreendeu sua rainha muito irritado. – Agora te veste e some daqui!
-Vocês irão me pagar por essa humilhação! - A rainha prometeu, sentindo-se muito ofendida e saindo em seguida, com suas roupas nas mãos.
A rainha compreendeu bem que o Faraó só poderia estar realmente apaixonado pelo escravo, a ponto de repreendê-la daquela forma na frente dele. Mas ela não iria perdoar nem seu irmão, nem o escravo que tomou seu marido de si. E a ardilosa rainha já até planejara tudo, usaria os próprios sentimentos do faraó para puni-lo. E para isso, tiraria aquilo que lhe era tão valioso: Seu Anath. Vingar-se-ia dos dois de uma só vez. E depois, caso seu irmão não se arrependesse, tirar-lhe-ia o Egito, para que sua desgraça fosse completa.
No dia seguinte, Anath foi encontrado morto na cama do Faraó. O linho manchando de vermelho e uma profunda ferida no peito do jovem, bem onde ficava o colar que recebera de presente, fizeram com que um grito de dor saísse da garganta do Faraó. Seu peito se enchia de rancor a cada segundo que olhava aquela cela cena desesperadora.
-Maldita! Por que fizeste aquilo? –Adentrou irado no quarto de sua irmã. Nunca em sua vida ele sentira tanto ódio.
-O quê? – Perguntou sem dar atenção, fingindo-se desinteressada, olhando pela janela.
-Deixe de ser dissimulada! –O Faraó gritou com sua esposa, sacudindo-a com ira. – Sei que mataste meu filho!
-Pare! Estás a me machucar!
-Tu mereces morrer! – Disse, tomando o pescoço dela entre suas mãos e lentamente começando a sufocá-la.
-Matarás tua irmã, que tem teu sangue, por causa de um escravo? – Falou com dificuldade, mas sem perder a arrogância de sua voz e o brilho de seus olhos.
-Tu tiraste meu filho de mim! – O Faraó já não mais conseguia controlar suas emoções, que se revelavam mais humanas na medida em que lágrimas escapavam de seus olhos.
-Teu filho está em meu ventre. - Proferiu triunfante, tendo a pressão sobre seu pescoço prontamente retirada. Ela tossiu algumas vezes, mas logo se recuperou, recuperando também o sorriso que emanava maldade.
-É mentira! Tu és seca, eu sei bem! Por anos tu não engravidaste!
-É a mais pura das verdades, Nasu. Tenho já três luas. – Aproximou-se do faraó e o abraçou. – Oh, Nasu, será tão maravilhoso! Seremos tão felizes!
Mas a perda de Anath doía muito ainda, e o Faraó sentia seu coração despedaçado.
-Oh meu irmão! Animai-vos! Não vês o quão afortunado sois? Terás um filho! Não adotado ou de concubinas! Um filho legítimo, que tem o sangue divino vindo de mim e de vós! O vosso sangue! O sangue poderoso daquele que controla o Nilo e controla o povo! Vós sois a vida do Alto e Baixo Egito!
-De que me adianta tudo isso, se não posso trazer de volta meu Anath?
O sorriso da rainha se desfez em uma expressão de ódio.
-Posso vos ajudar então, meu rei. Encontre aquele maldito escravo na outra vida, então! –Tirou de suas vestes uma adaga dourada, e com ela apunhalou o coração de seu irmão.
O Faraó então sentiu a dor aguda da traição. Seu coração lentamente parava de bater à medida que seu espírito saía de seu corpo, e junto dele foi-se sua divindade. O infinito deixou seus olhos, que agora não precisavam mais olhar apenas para o Egito. Ele estava livre para se devotar a o que quisesse.
Naquele dia a tristeza assolou o Egito, e todos os servos e concubinas do Faraó foram sepultados junto dele, excerto sua rainha, pois ela carregava o herdeiro dos deuses.
E depois de cinco luas, o novo Faraó nasceu, dando continuidade à dinastia que mantinha o Egito.
Mas no outro mundo, o mundo dos mortos, nada disso importava, pois lá o antigo Faraó encontrou seu amado Anath, e lá para sempre haveriam de ficar juntos.