O matuto e o padre



José era um daqueles guapos sertanejos com braços e pernas bem torneados, pele morena,queimada pelo sol inclemente do sertão,cabelo da cor d'uma noite sem lua e sem estrelas,olhos amendoados quais um poço de pixe repleto de mistérios,barriga sarada na academia da enxada e a voz mais rouca que um trovão encolerizado.Era realmente um homem atraente perdido naquele bravo sertão! Costumava acordar às quatro da manhã para iniciar a labuta, ao meio-dia parava para comer o feijão da sua mãe, retornava ao trabalho e voltava às seis horas para um bom banho no banheiro improvisado que ele tinha feito no terreiro e saborear a gostosa carne seca assada na brasa com pirão de água que somente a sua mãe sabia fazer,no ponto, assim ele dizia. Muito religioso e não se deitava nem se levantava sem antes rezar o Pai Nosso e a Ave Maria que mandava diretamente para o santo da sua devoção: São José! 

Ultimamente José andava meio ressabiado, conversava pouco com a mãe, olhar perdido na paisagem que se desdobrava pra lá da janela da sala onde ele ficava ou para tomar as refeições ou para matar o tempo na companhia da sua mãe ou dos seus pensamentos. Filho único, a mãe viúva, moravam apenas os dois no pequeno rancho. A mãe vivia preocupada com as atitudes solitárias do filho mas ia tocando a vida assim mesmo, cuidando dos seus afazeres enquanto rezava baixinho para que Deus o protejesse e retirasse do seu peito toda a aflição. 

Ele, por sua vez, gostava de ir à missa que era rezada de quinze em quinze dias no arraial perto de onde morava. Ía sempre com a mãe e até se confessava e comungava, mas de uns tempos pra cá, ele tinha parado de se confessar e comungar porque algum pensamento lhe atormentava. Estava apaixonado! Não parava de pensar na dona Rosa a mulher do seu Joaquim que morava uma légua dele mas que todo sábado vinha trazer para a sua mãe, uma dúzia de ovos e alguns legumes da horta que eles cultivavam, em agradecimento pela bondade da sua mãe por lhe fazer companhia quando seu marido esteve muito adoentado e internado no hospital da cidadezinha vizinha. Como contar ao padre este pecado?! pensava ele.

Um domingo que foi para a missa com a mãe, ao entrar na pequena igreja o seu olhar cruzou com o de dona Rosa. Foi como se ele tivesse tomado uma descarga elétrica de alta voltagem. Isto não pode continuar
assim, pensou . Dirigiu-se ao confessionário encheu-se de coragem e prometeu a si mesmo que confessaria ao padre. E o fez! 

Quando terminou de contar ao padre tudo que sentia, pensava e desejava com a dona Rosa, ouviu-se um barulho tão grande no interior da Igreja, como se um trovão estivesse ameaçando tempestade. José em desabalada carreira porta afora rumo ao não sei bem onde , sendo perseguido por um homem alto,magro,cabelo grisalho, com óculos de aros dourados e uma negra batina esvoaçando ao vento: o padre! Correram até não mais lhes sobrar espaço para isto e José levou vantagem por ser bem mais jovem, porém sem compreender a reação do senhor padre. 

Mais tarde, a sua mãe quis saber o porquê daquela correria toda mas ele desconversou e fugiu do assunto. Passado um bom tempo, ele resolveu pedir desculpas ao padre pois talvez o tivesse ofendido com as suas palavras.Partiu para a igreja montado na mula, ao entardecer. Lá chegando foi atendido pela zeladora da Igreja que lhe informou o padre ter ido assistir um moribundo. Retornando para o seu rancho resolveu passar pela estrada que dava na porta da dona Rosa, quem sabe não a veria  de longe... Para o seu espanto, viu um vulto alto, magro, cabelo grisalho que brilhava na luz quase noturna, óculos na face, vestido com uma batina preta, pulando para dentro da janela da casa da mulher que era dona dos seus pensamentos.
       
Ué,pensou alto. Será que o marido dela adoeceu de novo? 
 Não, não,não...resmunga.Pois se a mãe me falou inda ontem que êle ia viajar mas que dona Rosa tinha dito que não ía precisar da sua companhia porque sua sobrinha tinha chegado pra lhe visitar...
Debaixo desse angu tem carne! resmungou e partiu para seu rancho matutando nas coisas da vida
...





Bjjjjjjjjsssoninha. PAZ!

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