QUANDO EU ERA UM EXCELENTE COBRADOR....( I )

 

 

 

- Lá pelos anos 1978/1979, Eu estava terminando meu Curso de Direito, dava Aulas num Colégio Público pela manhã e trabalhava na antiga EBCT no período vespertino na área telegráfica, era um Deus nos acuda,  tentava ganhar dinheiro de todas a maneiras para pagar a minha Faculdade, as coisas estavam difícil, o Município não pagava, os Correios estava com os salários congelados, falta dinheiro sempre. Estava parecendo o “macaquinho namorando a girafa” ou seja: Corria pegava na mãozinha e depois subia pelo pescoço e dava um beijinho no final do namoro o macaquinho estava morto de tanto subir e descer.

- Foi quando um amigo de meu Pai, Espanhol de nome Sr. Fernandes visitando-nos em um final de semana  perguntou se eu não queria fazer uma cobrança, topei na hora. Acertamos os percentuais, atualizamos o principal, peguei as Notas Promissórias e indaguei, quem é o devedor? O espanhol respondeu meio sem graça é um dono de uma Loja de Macumba!!!

- Caramba!!! É sacanagem, agora que me conta!!!, se falas antes, eu cobraria mais caro, a coisa é complicada,  tudo bem vamos lá. Passa o perfil do elemento.

- É uma pessoa de conversa mansa, tranqüilo e cheio de malandragem. Não paga nem o dízimo para o Pastor.

- Analisei, cheguei a conclusão que era um especialista em comprar e não pagar, 171 puríssimo.

-   Mas empreitada é empreitada, pedi a foto e outros detalhes que me forma repassados. Passei o restante do Domingo a bolar um plano, feito “007” coisas da juventude, principiante inocente.

- Escolhi um terno preto (o único), sapato brilhante, camisa branca e uma gravata cinza, peguei minha pasta também preta (parecia um agente funerário), elevei meus pensamentos a Deus e não dormi pensando como iria atacar.

- Naquela segunda-feira não tinha aulas, então acordei bem cedo, coloquei a minha armadura e sai do quarto quando me deparei com o meu Pai, ele assustou e indagou depois de olhar de cima a baixo, onde vai ser o velório???? Meio sem graça respondi que estava preparado para fazer “a cobrança”!! Ele deu uma risada, se você não tiver cuidado poderá ficar sem o seu futuro diploma, ele é muito esperto, vai te enrolar como uma sucuri devorando um carneirinho. Animador, meu primeiro serviço na advocacia e todos estão contra mim.

- Tomei um café com torradas e sai para pegar o ônibus, na varanda percebi que meu avô estava chegando e gritou ei menino!! Vai fazer exame de sangue? Olhei  meio contrariado e falei até o Senhor!! Meu Pai neste momento informou, ele vai receber uma conta para o espanhol, de um dono da loja de artigos religiosos. Meu avô olhou e disse, para receber conta tem que falar pouco e mostrar que quer receber tudo, senão vão te empurrar , galinha, roupa usada, cueca furada, tudo menos dinheiro, vai lá e depois me conta, qualquer coisa eu vou resolver com a minha alemanzinha (metralhadora antiga).

- Cheguei ao ponto e percebi que todos estavam olhando para mim. Tentava disfarçar, mas como se disfarça um pingüim em uma avenida onde todos estavam a paisana. Logo chegou um senhor e disse, o Douto, eu queria uma informação, o senhor trabalha para o Prefeito ou Governador, eu tenho uns pedidos para fazer? O meu bom senhor não trabalho para nenhum dos dois, então o Douto é do SNI, não amigo, eu sou pensei, sou o que...  “.articulador de recebimentos creditícios de pessoas inadimplentes.”  Há bom, ainda bem, deve ser muito importante, desculpe, vai com Deus, pegou na minha mão e saiu e o ônibus chegou.

- Sentei na frente, todos continuaram a olhar para mim, perdido e fora do ar, continuei sentado manuseando uns documentos em pleno disfarce.

- Uns 20 minutos depois, cheguei ao ponto, desci e visualizei    a loja do elemento do outro lado da rua, atravessei e entrei.

- Bom dia, gostaria de falar com o seu João,  a atendente, uma morena forte, bonita cabelos compridos, pele de canela, corpo perfeito, um pouco mais alta que eu, olhou-me nos olhos mansamente e disse, meu pai não está, qual é o seu problema??

- Olha senhorita, qual é o seu nome? Marinalva, mas pode me chamar de Mara. Certo, então vamos lá, seu Pai está devendo uma importância para o Espanhol e ele solicitou que eu recebesse, então estou querendo resolver o problema conversando com o seu Pai.

- Olha meu querido, você fica aqui e eu irei  chamá-lo em casa, tudo bem...

- Perfeitamente...

- Ela saiu andando suavemente pela porta, em movimento  natural, desaparecendo na esquina. Fiquei sozinho no ambiente, olhei para um lado umas velas estranhas, rostinhos diferentes de outros, uns livros, caixinhas de defumadores diversos (chama dinheiro, quebra azar, olho gordo, invoca marido e outros) cada um mais interessante, repleto de baralhos, búzios, cavalos marinhos, estralas do mar,  cordas de palha, panelas de barro, umas imagens grandes de santos e pretos velho,  ou seja tudo referente ao assunto, era uma loja sortida.

- Uns quinze minutos chega a morena cravo e canela e seu Pai, um senhor baixo, forte, atarracado,  atarracado, cara fechada dizendo, qual é o problema, porque aquele filho da mãe não veio pessoalmente, eu gostaria de fazer uma quizumba para ele, costurar umas boca de sapo e colocar o nome dele no formigueiro e ladainha a fora, eu disse, calma, calma seu João estou aqui para resolver o problema e não para complicar.

- Depois de escutar a versão do devedor irritado, o que deixou mais manso, analisei profundamente problema, com estilo arbitral conciliador e perguntei, bem como o senhor quer pagar??

- Ele respondeu esta conta eu não pago!!! não tenho dinheiro, não tenho movimento na loja, e não estou vendendo nada, então pega a conta e manda ele enfiar no .....,

- Bem o senhor não tem nenhuma proposta, vamos tentar negociar (entrou um pouco do árabe), nunca se diz não, vamos encontrar uma melhor saída;

- Tenho sim, eu pago a conta, primeiro ele tem que dar um desconto e depois um prazo de 120 dias, para eu resolver tudo, caso contrário, ele vai pegar esta conta e (.....)

- Muito bem, eu vou passar a proposta para ele e vou retornar logo que possível,  tudo bem, seu João olhou para mim e disse, meu filho, estou fazendo isto pelo pedido de minha filha,  pela sua sinceridade, e honestidade, porque aquele  cavalame (é o que sobra de um cavalo que vira salame) não vale nada, nem um cibasol (antigo comprimido usado para dor de barriga)  vencido, despedi também de sua filha que ao apertar a minha mão transferiu um calor intenso ao meu coração.

- Ao retornar para casa fui confabulando algumas idéias, opções para apresentar ao Espanhol, mas aquele calor da morena ainda estava em minha mão.

- Fui direto para a casa do espanhol, encontrei-o no quintal cuidando de sua parreira de uva rocha, grandes e suculentas, não oferecia  para ninguém , apenas para uns poucos escolhidos, com a tesoura na mão gritou e ai, trouxe o dinheiro !! Não mas vamos tabular uma maneira de receber o dinheiro, primeiro temos que sentar e conversar, porque o homem e duro na queda e não quer pagar de forma alguma. Os olhos dele ficaram esbugalhados com a preocupação do prejuízo, abaixou a cabeça e pediu para que eu contasse toda a história do encontro.

- Veja bem espanhol, o homem está sem dinheiro, o que ele tem você não quer, então temos que montar um plano para conseguir receber. Ele franziu a testa e perguntou como?

- Primeiro, eu quero um desconto nesta conta de 50%, o homem virou bicho, ta louco.., ta louco, não vou dar este desconto, então eu expliquei, olha o seu principal é  “X” com os juros + taxas + honorários = 3X então vamos dar 50% e você terá ainda 1,5 X, com os meus honorários você terá o seu principal intacto e não terá prejuízo, com um prazo de 120 dias. O espanhol olhou para mim sério  e me deu um abraço e um beijo na testa feliz da vida, concordando com a proposta. (Caro amigo leitor, foi publicado o número II, a conclusão..)

Kulayb
Enviado por Kulayb em 21/04/2008
Reeditado em 23/10/2008
Código do texto: T955813
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