Tio Domiro

Tio Domiro, a lenda...

Uns dizem que a inspiração é o Theodomiro Araújo, um senhor que viveu em Amambai até falecer há poucos anos atrás, de família conhecida, era pai do Alcibes Ribas de Araújo, este já foi vereador pelo município de Amambai. Contador nato de causos, negociador de gado, talentosíssimo nos negócios a ponto de nunca perder uma parada e de uma simpatia abençoada Theodomiro virou referência quando se ia contar alguma vantagem, algum negócio bem feito. Outros remontam aos causos dos tempos de Pedro Malazarte, conhecido “papudo” e “sabido”, que virou lenda de causos na literatura fronteiriça, outros ainda falam que na verdade, ele era tio de um tal de Laquicho, que largou as coisas por aqui e foi contar suas bravatas ali pelos lados de Dourados. O fato é que a lenda se tornou maior que o homem. É do personagem “Tio Domiro” que as pessoas falam e é dele que vamos retratar. Todo amambaiense sabe pelo menos uma história, um chiste, uma tirada, uma vantagem do Tio Domiro. Mentiroso??? Que nada seu moço, tá aí a Zefa vivinha da silva pra confirmar tudo, mas tudinho mesmo, até a história do papagaio...

1. O papagaio

Esta é a mais famosa tirada do Tio Domiro, ou como queiram o seu cartão de apresentação: Dizem que uma turma de corneteiros, reunidos ali perto da Gráfica do seu Antonio Delgado, o Vave nesta época já fazia estágio com essa turma, estavam sorvendo um tereré quando encontraram um esbaforido Tio Domiro, andando pelas ruas da cidade:

- Ô Tio Domiro, vem aqui pra contar uma mentira pra nós.

- Agora não posso, estou atrás do meu papagaio, que fugiu com gaiola e tudo.

2. A caçada

Daquela feita Tio Domiro resolveu caçar patos, gansos e marrecos. Armou sua cartucheira com 21 chumbinhos e se aboletou prum brejão que ficava pras bandas do Guaçuty. De longe já avistou uma lagoa lotada das aves que procurava. Largou o picassinho chupando umas guaviras, foi pé ante pé e “pum” disparou sem mirar. A moral da história é que tinha levado três tipos de chumbos, cada um já tava marcado pra abater um tipo de ave. Desse jeito, sem nenhum mais-me-quer, catou sete patos, sete marrecos e sete gansos e se mandou embora, pra Zéfa fazer um guisado, que já tava anoitecendo.

3. O picassinho

O picassinho era, por assim dizer, o xodó do Tio Domiro. Bem domado, obediente, inteligente que “só faltava falar” era o companheiro fiel pra todas as horas. Pois uma vez, o Tio Domiro foi vender umas par de rês chinfrim como se guzerá fosse, a um incauto paulista recém chegado ali pros lados do Sacarón , atual Iguatemi. Negócio fechado, com as guaiacas recheadas de “réis” se mandou de volta pra casa, que a Zefa tava preparando um puchero de levantar defunto. Mas não é que armou o maior temporal e uma chuva torrencial começou a cair justo quando ainda faltavam umas seis léguas pra chegar ??? O Tio Domiro não se deu por vencido. Esporeou o Picassinho e este correu tanto, mas tanto que a chuva não o alcançou totalmente, contou que as patas de trás do cavalo jogavam barro e as patas dianteiras levantavam poeira. Eita nóis...

4. Sonho de Ícaro

De outra feita, o Tio Domiro, foi caçar umas onças malhadas que tavam dando um trabalho danado prum fazendeiro amigo seu, pois já tinham comido umas vinte rês, inclusive um cherolês tarudo de uns 400 quilos. Uma judiaria. Pois bem. Armou-se com sua guaiaca de cabo de guavira, que tinha herdado de um seu avô – este viera corrido lá do Rio Grande do Sul, a pretexto da guerra dos farrapos mas que na verdade tinha deixado ‘uma vinte prendas prenhas por lá’- e se bandiou pra esperar as onças. Acontece que quando tava chegando perto da sua ceva, inadvertidamente caiu num poço de areia movediça. Quanto mais se mexia mais se afundava, não teve outra alternativa, se agarrou nas pernas de uns patos que tavam por ali, amarrou outros dois na cinta, deu um ‘upa’ e saiu voando, tranqüilo, tranqüilo, conduzido pelos patos até um lugar seco. As onças ??? Fica pra uma próxima....

5. Concurso

Diz que outra vez inventaram um concurso de mentiras, aqui mesmo no Distrito de Nhu-Verá e vieram mentirosos de todos os recantos do Brasil, que o prêmio era bom uma barbaridade. Três dias na zona, de uma rapariga correntina chamada Dolores, tudo por conta do Comitê Organizador. Assim que chegaram, os mentirosos já foram se ladeando pra onde vivia o Tio Domiro, já naqueles tempos afamado contador de causos, pra checarem se era ‘verdade’ tudo aquilo que diziam dele. Não o encontraram. Tava ali na soleira da porta o seu neto, de uns sete ou oito anos de idade, que informou que o avô não estava porque fora atrás de uma abelha que fugira do criâme. - Atrás de uma abelha só??? Como vai conhecê-la??? Lá isso é possível moleque ??? - Não, não é não. Pois sabem o mar morto ??? Foi meu avô que matou. Os contendores desistiram da empreitada, pois se o neto era assim, imagina o avô...

6. O pescador

Pois não é que Nhá Zéfa tava naqueles dias, esperava o oitavo filho do casal - dos 18 que tiveram - diz que este é o mais sabido de todos, já nasceu sabendo ler, escrever e fazer conta de tabuada. O fato é que deu desejo na patroa de comer peixe na brasa e não podia ser qualquer peixe, tinha que ser um dourado, justo o mais difícil e já viu né, desejo de mulher barriguda é uma ordem, e Tio Domiro, não queria ver o rebento nascer com cara de peixe. Não se deu por apertado, pegou a garrucha e se mandou pro rio amambai que ficava pertinho, umas duas ou três léguas de distância. Lá chegando, viu que tinha uma pitangueira que cobria toda a extensão do rio, e o rei, pulava dava umas mamadinhas numa fruta e tchibum mergulhava profundamente. O Tio Domiro, puxou a garrucha esperou o peixe pular para chupar a fruta e atirou na sombra que o bicho que fazia no rio. Pá, buf. - Mas na sombra Tio Domiro, porque não atirou direto no peixe? – E ia estragar o couro meu fio? Parece que bebe. Recolheu o douradão e se foi preparar o bicho que o fogo já tava pronto e a patroa ansiada.

7. Educação

Falando em filhos, diz que o Tio Domiro, nunca conseguiu bater em nenhum deles, qualquer arte que aprontavam, corriam e subiam nas grimpas de um pé de mandioca que tinha na frente de sua casa. Inalcançáveis.

8. Sucesso

Uma vez um dos fihos do Tio Domiro gravou um LP, sucesso total e absoluto na pequena Nhu-Verá de então. Com o intuito de expandir o sucesso do filho, o zeloso pai pegou mil LP’s, encilhou o picassinho e se mandou pra Ponta Porã, uma praça maior, ia estourar nas paradas, tinha certeza. Na altura do rio amambai encontrou um jaguaretê e travou uma luta medonha com a bicha, unha a unha, até que não agüentando os coices do picassinho, que claro, ajudava o dono, a fera se mandou de volta pra mata. Chegando ao seu destino Tio Domiro, deu por falta de um disco, só tinha 999, decerto este tinha se extraviado na luta com a pintada. Paciência. Deixou os discos numa loja e combinou com o dono que semana próxima voltava para pegar o dinheiro, ia vender tudo, garantia. Os discos devem de tá lá até hoje, mas essa é outra história. O fato é que quando retornava para sua casa, na mesma altura onde tinha ‘aloitado’ com a fera, Tio Domiro, reconheceu a voz do filho cantando: “amor eterno, amor...”. Foi ver, pois não é que o disco tinha caído em um pé de araçá, o vento o fazia rodar e o galho da planta servia como a ‘agulha’ e toda vez que encostava no disco este tocava ???