Ciúme
O problema de muitos homens é julgarem-se diferentes do que realmente são. Há aqueles que acreditam que são o D. Juan reencarnado. Outros julgam-se talhados para uma vida de astronauta ou de médico, quando não têm capacidades para ultrapassar profissões como as de pedreiro ou de mecânico. Há o professor que não sabe ler. Há o cantor que não tem voz. Há o político sem ideias nem retórica.
Costuma-se dizer que a vida é demasiado curta. Pois bem. Talvez se possa garantir que um homem que se engana é alguém que nunca teve tempo para se aperceber dos seus erros.
Frank era escritor por acaso. Não era dotado de uma grande capacidade criativa, tinha pouca (mesmo pouca) imaginação. Além disso, raramente escrevia. Era uma espécie de escritor que não conhecia palavras. A única coisa que levava Frank a escrever era um terrível sentimento: o ciúme.
Marta era bela e lasciva. Adorava o conceito de bigamia. Estava casada com um escritor consagrado e rico. Convinha-lhe andar por perto do sucesso e do dinheiro. Por ter todos os dias vários pretendentes a disputarem-lhe a cama, não poucas vezes se via obrigada a fornicar com mais de um homem em simultâneo.
De certa forma, Frank era beneficiado pelas tropelias de Marta, já que escrevia. Se ela se tornasse fiel, ele deixaria de saber manejar a caneta, deixaria de se torturar e de sofrer. Todavia, como todos os maridos traídos, Frank não tinha certezas quanto às escapadelas da mulher. Por esse motivo, escrevia frases como estas nos seus cadernos: «Queres acreditar que tudo o que te vem à cabeça é mentira, mas sabes mais do que ninguém que os teus pensamentos fazem sentido e que, por isso, poderão estar correctos.» Ou como estas: «Se, da mesma forma que podes alterar o teu interior – os teus sentimentos –, pudesses mudar aquilo que te é exterior – os outros –, serias um pouco mais feliz.»
Em certa ocasião, Frank sentiu-se mais inclinado a pensar que Marta trazia para casa o cheiro de outro homem. Esse cheiro excitava-o, dava-lhe vontade de espancar, de violentar, de matar. O cheiro de outro macho no corpo da sua fêmea despertava-lhe instintos malignos. Deixava-o com vontade de esmurrar, de partir. Os ossos da cara de Marta não estavam a salvo.
A consciência de Frank: «Olha para a mulher. Repara na forma como ela se movimenta quando faz sexo contigo. Já alguma vez te ocorreu a possibilidade de ela fazer isto com outros?»
Marta, a perfeita princesa, era de todos. Enquanto assim fosse, haveria comida naquela casa. No entanto, naquele dia, Frank viu-se obrigado a mandar a esposa para o hospital.