Passa Fome, Pra Nada e o Espantalho do Capeta
Tudo começou quando Seu Epaminondas, o fazendeiro aposentado mais pão-duro do Grotão, resolveu colocar um espantalho novo na sua plantação de milho.
Mas não era qualquer espantalho.
— Fiz com roupa velha do meu cunhado e a cabeça é uma abóbora que brilha no escuro. Botei até um radinho com pilha pra tocar canto gregoriano de madrugada, disse, orgulhoso, enquanto mastigava um torresmo sem dente.
O problema? A partir daquela noite, todo mundo começou a ouvir uns sussurros estranhos vindo da roça. Gente jurava ver o espantalho mudando de lugar sozinho. O Zé do Armazém chegou a dizer que viu ele acenando.
— Isso aí é coisa do tinhoso! — gritou Dona Dandara, a beata do bairro, já com o terço na mão e óleo ungido no bolso.
Foi aí que Passa Fome teve a ideia genial:
— Vamo lá de madrugada, gravar tudo e vender como série de terror no TikTok.
— Cê quer gravar ou quer morrer, Passa Fome? — perguntou Pra Nada, segurando um crucifixo feito de palito de picolé.
Mesmo com medo, eles foram. Levaram uma câmera emprestada do sobrinho gamer da Dona Creuza, lanternas fracas, um pacote de Cheetos e um isqueiro.
Chegando lá, o clima era estranho. O radinho tocava uma missa em latim. A cabeça da abóbora parecia olhar pra eles. E o vento... o vento sussurrava:
— Vaaaai e não voltaaaaaa...
— Rapaz... acho que o milho tá amaldiçoado, disse Passa Fome, tremendo.
— Ou a gente tá muito chapado, completou Pra Nada.
De repente, o espantalho se mexeu. Juro! Levantou um braço.
Gritaram. Correram. Passa Fome tropeçou num pé de mandioca. Pra Nada perdeu o chinelo e a dignidade.
No outro dia, descobriram que era o sobrinho do Seu Epaminondas que tinha colocado um sistema com motorzinho e controle remoto. Tava testando pra um projeto da escola.
— Vocês é tudo doido, disse o moleque.
— Doido é quem planta milho com espírito!
Desde então, o espantalho virou atração turística. E Passa Fome vende pipoca na entrada da roça dizendo que foi “possuído por um demônio do agro”.