Temporada de Caça

Cardoso I.

O cheiro de terra molhada ainda pairava no ar quando os primeiros tiros ecoaram pela mata. O grupo de caçadores avançava silencioso, movendo-se como sombras entre as árvores altas, com os olhos atentos a qualquer movimento.

Joaquim, o mais experiente, liderava o grupo. Ele conhecia aquelas trilhas como ninguém e sabia onde os animais costumavam se esconder. Mas naquela noite, algo parecia diferente. O vento estava parado, e os sons da floresta haviam se calado. Nenhum grilo, nenhum pássaro. Apenas o farfalhar das folhas secas sob suas botas.

— Estranho… — murmurou Davi, ajeitando a espingarda nos ombros. — Parece que a mata inteira tá segurando a respiração.

Os homens riram baixo, chamando-o de medroso. Continuaram a caçada. Mas, pouco depois, viram algo que os fez parar. Havia pegadas no chão, grandes e fundas, mas não eram de onça, nem de javali.

— Isso aí é o quê? — perguntou João, franzindo a testa.

— Parece gente… mas não é — respondeu Joaquim, agachando-se para observar melhor.

As pegadas seguiam na direção do rio. Resolveram seguir. Depois de alguns minutos, encontraram uma clareira. No meio dela, havia uma fogueira apagada e, ao redor, pedaços de ossos espalhados pelo chão.

— Isso aqui não é coisa boa… — sussurrou Davi, o rosto pálido.

Antes que pudessem reagir, um som baixo e gutural veio da escuridão. Algo se movia rápido entre as árvores. Os caçadores ergueram as armas, mas nada viam além da névoa que começava a se formar.

Então, um deles gritou.

Joaquim se virou a tempo de ver João sendo arrastado para a mata, sua lanterna girando no chão, iluminando por um segundo um rosto inumano, de olhos fundos e dentes afiados.

O pavor tomou conta do grupo. Eles atiraram para todos os lados, mas só ouviram a risada rouca ecoando entre as árvores.

Um por um, os caçadores foram sumindo na escuridão.

Na manhã seguinte, os moradores da vila encontraram as espingardas jogadas no chão e marcas de sangue arrastadas pela trilha. Nenhum corpo foi encontrado.

Naquele dia, os mais velhos disseram apenas uma coisa:

— A floresta também tem sua temporada de caça.