O HOMEM QUE LIA PENSAMENTOS

Em uma pequena cidade Tupã no interior, havia um homem chamado Paulo. Desde muito jovem, ele percebeu que possuía um poder incomum, algo que o separava dos outros. Paulo podia ouvir os pensamentos das pessoas ao seu redor. À princípio, achou que fosse uma ilusão, uma brincadeira de sua mente, mas logo percebeu que o que ouvia era real. Ele não controlava isso. Os pensamentos das pessoas vinham a ele como um fluxo contínuo, sem aviso, sem filtro.

Isso, no início, o fascinou. Ele começou a perceber segredos escondidos, desejos e medos das pessoas, coisas que elas nunca ousariam dizer em voz alta. Quando estava perto de alguém, não precisava ouvir suas palavras. Ele podia ouvir suas vontades mais íntimas. Mas o que parecia ser um dom se transformou rapidamente em uma maldição.

Paulo não podia impedir que os pensamentos das pessoas invadissem sua mente. Era como se ele fosse forçado a ouvir todas as suas preocupações, ansiedades e sentimentos mais profundos. E o pior de tudo era que ele não podia, de forma alguma, intervir. Ele não tinha o poder de ajudar ou mudar o que ouvia. Tudo o que restava era um turbilhão de vozes em sua cabeça, falando ao mesmo tempo, sem descanso.

Com o tempo, Paulo começou a se isolar. Ele evitava multidões, evitava até mesmo os encontros sociais. Os pensamentos dos outros eram tão intensos e caóticos que ele não conseguia mais distinguir a linha entre sua própria mente e a dos outros. Às vezes, ele se pegava pensando em algo e logo vinha o pensamento de alguém, tão claro e real quanto o seu próprio. Era uma mistura angustiante de vozes e sentimentos que o deixavam exausto, emocionalmente drenado.

Eram os pensamentos mais íntimos que mais o afetavam. Os medos das pessoas, suas frustrações, suas tristezas, tudo vinha até ele como uma avalanche de dor e desespero. Ele ouvia o medo de uma mãe que temia pela vida de seu filho, ou a angústia de um homem infeliz em seu casamento, ou o desgosto de um jovem que sonhava em ser algo mais do que o mundo lhe permitia. Paulo queria ajudar, queria gritar para eles, dizer-lhes o que fazer, como melhorar, mas ele sabia que não podia. Ele não tinha esse direito.

Sua vida tornou-se um emaranhado de sentimentos estranhos e contraditórios. Ele amava profundamente as pessoas, mas ao mesmo tempo, sentia uma dor terrível por não poder aliviar os sofrimentos que ouvia todos os dias.

Certa tarde, enquanto caminhava pelas ruas da cidade, Paulo se deparou com uma jovem chamada Lúcia, que estava sentada em um banco, aparentemente perdida em seus próprios pensamentos. Paulo se aproximou, e, ao olhar para ela, os pensamentos dela invadiram sua mente com uma clareza desconcertante.

"Eu não sei mais o que fazer. Estou perdida. Todos esperam tanto de mim e eu... eu só quero encontrar a minha própria paz. Mas eu não posso. Eu tenho que seguir o que os outros querem. Tenho medo de falhar."

Aquelas palavras, tão sinceras e doloridas, atingiram Paulo com força. Ele queria correr até ela, abraçá-la, dizer-lhe que estava tudo bem, que ela não precisava seguir os caminhos que os outros traçavam para ela. Mas ele não podia. Ele sabia que não podia fazer nada. Ele ouviu a dor dela e, como sempre, foi impotente.

Ele se afastou, tentando controlar o turbilhão de pensamentos que o invadiam. Mas algo diferente aconteceu. Ele se viu perdido em seus próprios pensamentos, tentando silenciar as vozes que vinham de todos os lados. Ele não podia mais distinguir o que era dele e o que não era. Seu corpo estava ali, caminhando pelas ruas, mas sua mente estava distante, lutando para encontrar alguma forma de paz.

Nos dias seguintes, Paulo começou a perceber algo peculiar. As pessoas, em sua maioria, não estavam mais ocultando seus pensamentos. Eles estavam mais desesperados, mais expostos. Havia um vazio crescente no mundo ao seu redor, e ele sentia como se esse vazio fosse um reflexo do próprio sofrimento humano. A luta interna das pessoas parecia mais forte, mais intensa. Ele ouvia constantemente pensamentos que diziam: "Eu não aguento mais", "Não sei por que estou vivendo", "O que há de errado comigo?"

Era como se o mundo estivesse em colapso, como se todos estivessem à beira do desespero, e ele, com seu poder, fosse incapaz de ajudar a salvar sequer uma pessoa. Os pensamentos deles se tornavam cada vez mais densos, como uma sombra imensa que ele não conseguia evitar. Ele sentia a dor de cada um, e essa dor o consumia.

Uma noite, após mais um dia exaustivo, Paulo foi até a velha biblioteca da cidade, onde costumava se refugiar para tentar organizar seus pensamentos. Ele se sentou em uma mesa vazia e fechou os olhos, tentando bloquear os pensamentos das pessoas. Mas, por mais que tentasse, não conseguia afastar a sensação de angústia. Ele estava sozinho em meio a um mar de pensamentos alheios, e aquilo o estava destruindo.

Foi quando ele ouviu uma voz, uma voz clara e tranquila, que se destacou acima de todas as outras. A voz parecia vir de dentro dele, mas ao mesmo tempo, parecia vir de alguém muito mais sábio.

"Paulo, você tem o poder de ouvir os outros, mas não se esqueça de ouvir a si mesmo. O que você está carregando não é o fardo de todos, mas o peso de sua própria incapacidade de se libertar."

Paulo abriu os olhos, surpreso. Ele olhou ao redor, mas não havia ninguém. A voz continuou, suavemente, como uma brisa tranquila:

"Você não é responsável por salvar os outros. Cada pessoa tem sua própria jornada, e você não pode viver por elas. O poder de ouvir os pensamentos dos outros não é um fardo, mas uma oportunidade. Você pode aprender com eles, mas também deve aprender a se proteger."

Paulo sentiu uma sensação de alívio, como se um peso tivesse sido retirado de seus ombros. Ele sabia, naquele momento, que precisava encontrar uma forma de controlar sua habilidade, de não se deixar consumir pela dor dos outros. Ele precisava aprender a ouvir a si mesmo, a focar em seu próprio caminho.

Nos dias seguintes, Paulo começou a colocar em prática o que havia aprendido. Ele ainda ouvia os pensamentos das pessoas, mas agora não se deixava consumir por eles. Ele aprendeu a discernir o que era útil para ele e o que deveria ser deixado de lado. Ele sabia que não podia mudar o destino de cada pessoa, mas podia ser um farol de luz para quem estivesse disposto a ouvir suas palavras.

Paulo nunca deixou de ouvir os pensamentos dos outros, mas, com o tempo, ele aprendeu a usar sua habilidade com sabedoria. Ele passou a ajudar as pessoas, mas sem intervir diretamente. Ele ensinava, ouvia e dava conselhos, mas sempre respeitando o livre-arbítrio de cada um.

E, ao longo dos anos, Paulo encontrou uma paz que jamais imaginou ser possível. Ele aprendeu que, às vezes, o maior poder não é o de mudar os outros, mas o de mudar a si mesmo.

CELIO SILVA O POETA DO AMOR
Enviado por CELIO SILVA O POETA DO AMOR em 03/02/2025
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