O SUMIÇO

Ela foi atrás dele.

Desligou o fogo do fogão com as panelas do almoço, a mesa posta, as roupas no varal, a casa arrumada.

Sabia que ele não voltaria, mas deixou tudo pronto.

Faziam 5 meses que ele tinha saído para trabalhar, lá não aparecera, nem voltara para casa.

Dizia que estava insatisfeito com o emprego de pedreiro, pois o dono da construtora era mesquinho, arrogante, não pagava direito, que o salario mal dava para por comida na mesa e o aluguel.

No dia do desaparecimento ele estava mais arrumado, cheiroso e ela nem reparou na falta de algumas peças no seu pequeno armário, inclusive da mochila que levava quando ia visitar a mãe na cidade vizinha.

Tulio tinha o porte elegante, era moreno de olhos claros, cabelos pretos e um sinal perto dos lábios bem delineados. Às vezes dizia que tinha que ser galã de novela e menosprezava um pouco Maristela, embora ela fosse uma mulher de belas curvas, lábios carnudos, cabelos longos, mas extremamente ciumenta.

Não haviam casado. Se conheceram quando ela acompanhava seu pai, que era mascate, pelas cidades que passavam vendendo suas mercadorias. Sempre se viam e se enamoraram. Numa dessas viagens pediu ao pai para casar com ela, que a deixasse ali para fazerem o casamento.

Acabaram indo morar juntos. Estavam com três anos de relacionamento. No começo muito amor, mas o ciúme dela foi esfriando a relação. Ninguém podia olhar para ele que começavam a brigar, Tulio se enfurecia com isso, desentendiam com frequência.

Ela decidiu procurar por ele. Seu pai havia morrido fazia mais de um ano e deixara a caminhonete com a carroceria que levava sua mercadoria. Fechou a porta da casa, decidida foi a procura dele. Ninguém dava notícias de Tulio, ninguém o vira, nem sabiam de nada. Os que deviam saber também ficaram calados.

Maristela passou por várias cidades e não encontrou o marido. Teve que vender o carro e trabalhar de doméstica para sobreviver. Passaram-se 10 anos, ela trabalhando de casa em casa, quando de repente olhando a TV viu Túlio fazendo um pequeno papel numa novela. Mudou o nome para Tuliorrodas, mas ela o reconheceu, enlouquecida, pegou as economias, foi atrás dele em São Paulo, na TV TUPI.

Ele não era muito conhecido, pois fazia um papel secundário na novela. Após passar vários dias na porta da emissora viu ele chegando de mãos dadas com uma jovem linda, bem arrumada, a protagonista.

Logo que o viu começou a chama-lo. Ele a reconheceu, mas fez de contas que não era com ele. Entrou ligeiro e ela foi barrada pelos seguranças bem como vários outros fãs dos atores.

E assim Maristela fez por alguns dias, até que contou a sua história para um porteiro que falou com ele, conseguindo, então marcar um encontro num local próximo.

Logo que o viu correu para dar um abraço, mas ele a afastou. Tulio estava muito frio, disse que não tinham mais nada há muitos anos, que o deixasse em paz para sempre. Explicou que foi atrás do sonho de ser ator, que o havia alcançado e desejava que ela fosse feliz. Se retirou e não olhou mais para traz.

Maristela inconformada desejou se vingar, ainda não sabia como. Dias depois seu corpo foi encontrado no Rio Tiete.

Ana Amelia Guimarães
Enviado por Ana Amelia Guimarães em 30/01/2025
Reeditado em 31/01/2025
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