O QUE É O QUE É...
No tempo em que a tradição oral era vívida, meninos deitados em braços esplêndidos, aprendiam lorotas, histórias e brincavam de adivinhas, pega-pega, e muitas outras brincadeiras que aguçavam a mente.
Os mais velhos passavam experiências e sabedorias nas rodas de conversas e cantarolavam nas noites frias. Todos em torno do fogo para espantar o frio que a lua soprava ou em varandas apertados; risos e barulhos do chuvisco fino à noite, dividiam sinfonias de sapos que coaxavam na lagoa ou no brejo.
Cada um tinha sua vez para contar uma piada, um conto, uma profecia dos tempos e assim, ali, a hora chegava, alguns iam saindo para encontrar-se com suas tangas de redes e aquecer-se mais, e outros ali, encantados com mais e mais histórias permaneciam. Outros sorriam, às vezes, até chorar, a barriga torcia de tantos risos, uns saíam da roda, porque não aguentavam as gargalhadas que deixavam todos serotonizados, em noite de partilha de saberes populares.
Para encerrar a noite, alguém tinha que sair campeão ou campeã, ou seja, tinha que arrancar mais risos e fechar aquele momento com chave de ouro. Momento em que muitas gerações ali estavam misturadas, aprendendo e ensinando. E um dos netos, astuto, que sorria sem parar, avantajou-se ao círculo e se comprometeu em querer arrancar todos os risos da noite para sair ganhando e com um “o que é, o que é”, bem para a frente, como dizia minha avó, soltou:
- O que é o que é, é branco por fora, roxo por dentro, cabelos nas beiradas e um pinguelo dentro?
Quase ninguém sorriu, uns torceram os beiços para os lados, outros saíram horrorizados com tamanha audácia da adivinha. E logo, ele recebeu a ordem para se retirar da roda e ir deitar com a missão de no outro dia se explicar sobre tamanha coragem diante de avós, mãe, tios e vizinhos anciãos e garotos como ele, que até acharam engraçado, mas não pediram nem pra repetir, pois sabiam que a noite ali, dava-se por encerrada.
Todos foram se retirando, pegando seus tamboretes em rumo seus leitos, entrando um a um. Todos deram boa noite, numa infinidade de risos.
Na manhã seguinte, antes que o sol clareasse aquele dia que seria escuro para o netinho temeroso, ele foi ao pé de maracujá que subia rastejante na laranjeira, tangeu os besouros negros, mangangás, que polinizavam rodopiando. Pegou e levou a flor como resposta até sua avó e seus pais para se livrar daquele castigo que sabia que não escaparia. E após justificativa aceita ficou na responsabilidade de ser o primeiro da noite seguinte a apresentá-la para se desculpar do mal-entendido.