PAPAI NOEL EM SALVADOR

PAPAI NOEL EM SALVADOR

Nas férias de fim de ano de 1974, viajei de Maceió para Salvador, para passar alguns dias na casa de meus tios José e Maria. Eles não tinham filhos e gostavam de ter crianças por perto. Passei alguns dias também no apartamento dos meus tios Pedro e Marta. Era uma festa só!

O tio José era uma criança crescida, bagunceiro, farrista, desportista sem muita qualidade técnica, mas, que não admitia perder qualquer jogo, principalmente nas partidas de vôlei, lá no Clube dos Maçons, onde íamos nos finais de semana. Quem estivesse no time do tio José podia ter certeza que iria ganhar os jogos. Não que fosse o melhor time, mas por que ele fazia uma confusão tão grande, uma pressão, discutia, brigava tanto, que o juiz e os adversários costumavam abrir mão para que o atrito não chegasse às vias de fato.

Particularmente daquele final de ano, guardo uma recordação em minha memória, que me marcou profundamente, pelo fato de ser eu, àquela época, uma criança de 12 anos, passando o primeiro natal longe dos meus pais e das minhas irmãs, e no meio de pessoas estranhas, apesar de estar com meus tios e primos.

Acontece que, sem me consultar previamente, o tio José resolveu que eu seria o Papai Noel naquele natal. A véspera de natal era o dia da festa de confraternização da família de tio José, do pessoal da sua firma, e dos seus amigos da “Caravana da Alegria”, que era um grupo de vários casais que acompanhavam o tio José nas festas, onde quer que ele inventasse de ir.

Lá pelas vinte horas, como ele costumava falar, me vestiram uma roupa de Papai Noel, fizeram com que eu colocasse uma barba de algodão, um gorro vermelho, jogaram um saco também vermelho em minhas costas, e, como se não bastasse toda essa produção, ainda me fizeram subir no capô da Caravan do tio José, para dar uma volta pelas ruas e ladeiras de Matatu de Brotas, bairro em que moravam meus tios.

Imaginem a minha situação: um garoto tímido, vestido de Papai Noel, trepado no capô de um carro, segurando um saco de presentes com uma das mãos, e com a outra, tentando se segurar para não cair do carro, que para completar, era dirigido pelo próprio tio José. Para quem não sabe, ele era o pior e mais inconseqüente motorista com o qual eu já havia tido o azar de andar. Naquela época ainda não havia o Novo Código Nacional de Trânsito. Se houvesse, ele teria perdido a carteira de motorista definitivamente.

Depois de algumas subidas e descidas pelas ladeiras de Matatu, chegamos à casa de meus tios, onde todos já nos esperavam. As crianças fizeram a maior festa ao verem o Papai Noel!

Eu, escabreado, dando graças a Deus por aquele adrenalínico passeio ter chegado ao fim, desci do carro, todo entrevado de tentar me segurar em lugar algum, a não ser nas palhetas do pára-brisas, não lembro se borrei as calças.

Todos entraram na casa, e, entre comes e bebes, começou a distribuição dos presentes do Amigo Secreto, no qual eu não estava incluso.

Eu já estava todo amuado, com saudades de meus pais e de minhas irmãs, arrependido amargamente de ter ido passar o natal na capital baiana.

Logo após aquele desfile triunfal e àquela recepção calorosa, o Papai Noel perdeu a função e ficou pelos cantos, vendo todos receberem seus presentes, confraternizarem, e ele que trouxera presentes para todos, até aquele momento não recebera sequer uma caixa de bombons.

Muito triste, já quase chorando ao final da entrega de presentes, eis que alguém havia se lembrado do Papai Noel, isto é, de mim. Meus tios José e Maria haviam comprado um presente para me dar!

Comecei a desembrulhá-lo e, não sei qual foi a cara que fiz ao ver o presente. Eram óculos de mergulho, mas não eram daqueles Cobra-sub não. Eram uns óculos com duas lentes redondas de vidro, presas por borrachas tipo câmaras de ar. Era um presente simples, apenas uma lembrançinha, mas eu estava agora um pouco menos triste, pois, alguém havia se lembrado de mim.

No outro dia fomos à praia do Farol da Barra. Eu estava ansioso para estrear os óculos de mergulho! No primeiro tchibungo que eu dei, uma das lentes largou dos óculos e até hoje eu a procuro.

É por isso meus amigos, que eu lhes dou um conselho: se por acaso, algum dia, vocês forem convidados a fazerem o papel de Papai Noel, na dúvida, cobrem adiantado pelo menos o cachê!

Alberto Lins.