Vida de Penadeiro nas PNAD de 1972 e 1973

Informo-vos que já dantes 1969,residia com minha mãe Maria Odalia nos fundos da casa do senhor Mário Salomé à R. José Maria de P. Rodrigues, 472.

Após meses em casa desocupado, só estudando e jogando snooker com o que ganhei nos censos, o IBGE voltou a me chamar para a Listagem da PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1972. Isso também com o Nilson (Gabiru), o Berenildo (Berê) e Túlio (Maneu), onde saímos para vários municípios selecionados pela sede do IBGE no Rio de Janeiro e pertencentes à supervisão da agência de Jandaia do Sul: Maringá, Floraí, Japurá, Alto Paraná, Paranacity, Tamboara, Paranapoema, São Pedro do Ivaí e Barbosa Ferraz. Viajávamos de Variant I do chefe da agência, deixava cada um no seu seu setor, depois de alocar os quartos nos hotéis quando eram localidades distantes; ganhávamos um salário mínimo por mês e mais as despesas de hospedagem e alimentação. Era PNAD porque era amostra de Municípios – de Setores – de Domicílios. Seguem algumas curiosidades dessa PNAD.

Floraí: o município dos meus primeiros trabalhos de PNAD, Listagens e Entrevistas, sendo que o chefe da Ag. de Jandaia do Sul , o Azambuja, foi quem me levou de Rural Willys oficial, desta feita! Lá chegando se instalamos no Hotel Ritz, geralmente numa segunda-feira. Instalado, tomei um café reforçado e sai a listar os DPs da área A do setor "X" selecionado pelo RJ; fui descendo dentro dos limites principalmente da Estrada para São Carlos do Ivaí e Ribeirão Genúncia..., fui listando, tomando cafezinhos, injeitei vários almoços, só cafés! Fui descendo, descendo...! Lá pra 14 horas terminada a listagem da área A e como na pasta estava também o material, croqui e fôlhas, "garrei' fazer a área B. Fui descendo, descendo, desviando das vacas aonde tinha pastagens e retornando na parte baixa, onde geralmente os colonos fazem suas casas às margens dos rios, ribeirões, córregos, restingas, sangas, etc.! Fui descendo e terminei a 2ª listagem às 18 horas lá na divisa com São Carlos do Ivaí. Já escuro retornei pelo "estradão" sentido Floraí, bancos de areiais, já escurecendo e escuro foi difícil pegar uma carona, ainda mais eu de pardo de cabelo "black power" e de calça listrada (tipo pano de colchão)...! Aí começou bater a fome, o cansaço, mas fui retornando, vencidas as subidas descansava um pouco nas ribanceiras de areia, depois nas descidas dava os galopes! As luzes da cidade bem "pertinho", mas demorei umas 4 horas, chegando ao hotel mais ou menos às 22. A dona do hotel, que não lembro o nome, ainda fazendo sala para o chefe, pá daqui pá de lá, o Azambuja disse que foi ao meu encontro, vasculhou o setor e os informantes diziam que eu já tinha passado! A senhora me perguntou se queria jantar...! Disse sim e ela chamou a cozinheira, uma pretinha, e essa esquentou um arroz e um feijão, fitou um bife e um "relógio de pulso", comi, fui para o quarto e dormi com a luz acesa, porta aberta, cansado mesmo,, mas não mais com fome! No outro dia, terça, o chefe me chamou às sete para o café e disse: - bora tomar o café e retornar pra Jandaia, pois os serviços era para três dias...! Mas eu, como era p. nova, não sabia! Depois na segunda fase, as Entrevistas por amostragem dos Domicílios Particulares (DPs), o Chefe me levou a cada um, aguardando na viatura!

Marcamos a quilometragem e deu 22 km, de lá da divisa com SCI até Floraí...! Estimei que na primeira fase andei uns 50 km, então; costurando o setor...!

São Pedro do Ivai: no Bairro 14 ou Bairro Galhardo, o chefe deixou de manhã o Adiones no setor para Listagem; à tarde passou na estrada pra lá, passou prá cá e, como não viu o Listador, veio embora! Eu, o Adiones ainda viu a viatura passar, desta feita uma Rural Willys ano 1969 da cor preta e chapa branca, mas “mula manca”, isto é, tração em duas rodas! Como escureceu rápido, não consegui carona e dormi debaixo de um pé de café atrás do ponto de ônibus antes da matinha; de manhã peguei a primeira jardineira! Seria serviço pra dois dias, mas como eu era “Puta Nova” ou muito “Caxias”…! São 35km de Jandaia.

Barbosa Ferraz, região do Distrito de Tereza Breda: fiquei numa pensão, listei o meu setor terminando-o debaixo de chuva, utilizando um guarda chuva, acertei as despesas de hospedagens e jantas e retorno à Ag/IBGE há cerca de 100 km de carona com a camioneta Toyota da Colari (laticínios), Mandaguari PR; viria na carroceria junto aos galões, mas chovendo mesmo fraco, o motorista pediu pra eu vir na cabine, juntamente com o seu ajudante! Deixei as mochilas de roupa e a pasta com a Listagem em cima! Em São Pedro do Ivaí paramos para tomar um “café de combate à friagem”, mas a pasta de plástico com a logotipo, vazou…! O motorista foi gentil e voltamos até próximo de “Tereza” aonde desci pra “boléia” e perguntava para as pessoas da estrada se tinham achado! Nada.

Fazer o quê? Relatei o fato ao Coordenador e Chefe da Agência e na outra semana ele retornou comigo ao setor, tempo estiado, e nos primeiros nomes, uma senhora falou: - meu filho achou a pasta ao que dê-lhe Cr$ 20,00 (vinte cruzeiros) e retornamos para Jandaia do Sul, contentes e sorridentes… As Fôlhas de Listagens eram remetidas para Curitiba para o sorteio dos domicílios (Tabela de Números Aleatórios) a serem entrevistados na segunda fase.

Ainda em “Barbosa”, na segunda fase, entrevistei uma família de 22 pessoas, sendo 20 filhos não gemelatos, o mais velho 20 anos e o caçula de 1 ano, sendo que naquela segunda-feira de manhã desci o carreador olhando para as melancias do cafezal fechado que no questionário constou 10 Alqs. Pauls. (10 X 24.200m2) de café, a casa, a “tuia” de armazenagem e o terreirão secagem.

Como o chefe do DP (dom.part.) estava pelando um porco morto de uns 300 kg não quis de jeito nenhum informar os dados na Fôlha de Coleta e nos Questionários de Mão-de-Obra, individuais de 10 anos ou mais, o filho mais velho o chamou de “jaguara” afirmando que esse ibgeano não era malandro e deu um “toque” para eu retornar…! Sentei-me debaixo de uma árvore Santa Bárbara (*), o rapaz chegou e perguntou: - o que precisas? Respondi: - todos os nomes dos moradores desse domicílio, data nascimento de cada um, escolaridade, dados sobre a fecundidade das mulheres de 14 anos e mais, mão-de-obra das pessoas de 10 anos e mais! Ele retornou e veio com uma malinha de fibra com 21 documentos! Foram duas horas de entevistas bem feitas; autorizou a “almoçar” quantas melancias aguentasse e, confidenciou que o pai não deixava plantar milho, feijão, arroz, pra não prejudicar a produção cafeeira! Fiquei pensando naquela geada de 1975…

Paranacyty e Tamboara: ainda nessa PNAD 1972, o Adiones (Ponga) e o Túlio (Naneu) estavam nas entrevistas de vários setores nesses municípios vizinhos e o nosso dinheiro quase acabou, após quase uma semana por lá! Chegamos de jardineira até Nova Esperança e juntamos o pouco din-din para o Túlio jogar “Vida” no snooker, melhor que eu, para angariar fundos para hospedagens e passagens até Maringá e Jandaia do Sul, há cerca de 60 km. Perdeu e fomos dormir nas arquibancadas do estádio de Nova Esperança. Na sexta-feira de manhã fomos à Prefeitura e o prefeito fez doação das quatro passagens…

Vida de Penadeiros…

(*) Também é conhecida popularmente como cinamomo, jasmin-de-caiena e lilás-da-china (de nome científico: Melia azedarach L).

Autor: Adiones Gomes da Silva, o Ponga – titular cadeira nº 36 da ALACCNP.