A Lenda de Caxias

Tem uma lenda aqui em Caxias que disque ninguém pode assuvia depois da cinco sinão um coiso aparece pro cê. Desdi cedo a mãe já avisa as criança de mode que és nem consiga pô o beiço pra frente direito, de medo. Até os professor du colégio avisa e explica pra nóis: “ num mexe com issu de jeito nenhum”. Nóis cresce tão apavorado que até evita de dá celim nas moça, com medo de faze biquinho e acabar saindo argum baruio.

Acontece qui um celim causô foi um desastre na minha vida e na da Leninha. Ê que saudade que tenho dela. Cume que vô esquece aquele cabelo preto escorrido e a sombranceia grossa? Ficava é muito formosa de uniforme da escola e eu ficava é doido pra conversa cum ela depois da aula. Todo dia nóis ia embora junto. Eu ficava todo sem jeito e falava umas bobera sem tamanho e ela ria. Mas num ria escandalosa não, era cum jeitinho.

Além de bonita era inteligente. Fazia umas conta enorme rapidinho. Já eu quase num conseguia resolvê uma divisão. Minha mãe, esperta que só ela, pediu pra mãe da Leninha deixa ela me ajuda com as conta. Eita!! Não cabia de alegria. Então, fico combinado de na terça-feira, às quatro da tarde, ela ia vim me ajuda depois da escola e meus pais em agradecimento ia dá treis quilo de açúcar para os vizinhos.

Eu adorei a ideia e a Leninha também. Eu nem pra disfarça só falava nisso. Nóis se gostava muito. A terça-feira foi o dia mais feliz da minha vida. Ficâmo ali a tarde resolvendo as contas e eu pensando como é que eu ia arrancá um celim da Leninha. Coisa de criança besta. Eu tava quase terminando a conta desgraçada, quando ouvimos uns baruio na porta. A pessoa bateu e bateu. Mas meu pai tinha deixado bem craro pra nós num abri pra ninguém até eles chegá do Armazém, pois na roça as vezes vinha uns andarilho doido. Se meus pais tinha a chave, num pudia ser eles.

“Quem é?” Gritei da cozinha ainda com o lápis apertando a foia. A Leninha olhou assustada pro lado e aperto meus braço. “Calma, deve ser andarilho”. Oiei pra ela tentando não mostra medo. “Abre aí que eu quero água”. A voz era de homem, mas nóis num conhecia não. O homem ficou insistinu e esmurrando a porta cada vez mais forte. A Leninha começou a chorar e eu entrei em desespero. De repente, paro de bater na porta e começou a ronda a casa. Dava pra ouvir os passos arrastado.

O disconhecido entrou na oficina dos fundo. Fuço lá dentro e parecia tá com pressa. Ficamo espiando na berada da janela pra vê se conseguia enxegar quem era. Quando o desgraçado saiu da oficina trazendo uma enxada, nós teve um susto: era o Zé Bandulaque. Leninha me perguntava o que nóis ia fazê e eu nem conseguia responder. Essas horas a ideia do celim tinha ido embora faz tempo. Todo mundo sabia que o Zé Bandulaque era doido e andava pra rua a fora fazendo arruaça.

Na hora do desespero, lembrei da espingarda do meu pai. Corri pro quarto pra pegar, mas não achava de jeito nenhum. Enquanto eu fuçava no baú e a Leninha segurava a tampa, nóis ouviu um estrondo na porta da cozinha e logo em seguida o barui das panela caindo. O home tinha conseguido entrar. Entrou gritando que queria água, Leninha começou a gritar e eu não achei a espingarda. O Zé entrou no quarto, olhou pra nóis dois encolhido no canto e catou a Leninha pelos braço e foi arrastando pra casa a fora até jogar ela no quintal. Eu fui correndo tentar ajudar, mas ele mostrou a enxada e começou a me ameaça.

Corri pra dentro pra procura a espingarda de novo, quando ouvi a Leninha chamando meu nome. Foi eu cruzar a porta e o Zé tava me esperando atrás da parede. Pegou meu braço e me jogou no chão. A enxada tava encostada no bera da porta. Procurei a Leninha com zóio e vi ela encolhida perto do muro sem sabe o que fazê.

O Zé xingo nóis de uns nome estranho. Não deu nem tempo de eu levantar e ele veio com a enxada pro meu lado, levantou ela bem alto e pelo jeito queria acertá logo no pescoço. Coloquei a mão rosto e fechei o olho. “Minha Nossa Senhora”...Já tava rezando, quando ouvi um som bem baixinho vindo lá do canto do muro. Parecia um passarinho, mas tava diferente. Passou um tempin, a enxada não veio e eu abri mão. Olhei pelo vão dos dedo e lá longe ví que a Leninha tava fazendo biquinho. Né possivi. Eu não queria acreitá no que tava vendo:

Leninha tava assoviando igual um pardalzinho. Mas era um assovio triste e demorado. Assoviou, assoviou e deu pra ver as gota que corria no rosto dela e caia no chão. Zé do Bandulaque ficou parado igual uma pedra. Durim. De repente largou a enxada e saiu correndo que nem um loco pra casa adentro. Eu não sabia se corria ou se ia ver a Leninha.

Tomei coragem e levantei já pensando no coisa que podia aparecer a qualquer momento. Cheguei perto dela e vi que estava com olho esbugalhado de um jeito que não vô esquece. Tentei sacudi ela, dei uns biliscão e nada. Ela ficou alí paralisada e eu chorei igual criança. Foi aí que meu pai entrou correndo quando viu a porta arreganhada e achou nós dois assustado lá no fundo. Leninha nunca mais conseguiu falar uma palavra e depois de um tempo sumiu. Os vizinho fala que os pais da Leninha mandô ela pro Colônia, em Barbacena. Disseram que ela tava vendo coisa e precisava de médico de cabeça.

Até hoje eu guardo a cartinha que ela deixou cair do borso quando tava encostada no muro lá de casa. Eu só tive coragem de abrir depois de uns três dias. As letrinhas em vermelho estavam dentro de um coraçãzin: “Gosto demais do cê, André”.

Alan Narcizo
Enviado por Alan Narcizo em 12/11/2024
Código do texto: T8195115
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