Maria Jumenta

Seria a primeira eleição em Mato Pequeno, desde que o distrito havia se tornado independente de Mato Grande, e a sede local do Partido da Família Brasileira (PFB) recebeu várias propostas de interessados em se lançar como vereador do novo município. Uma dessas foi Maria Jumenta, apelido pelo qual era mais conhecida na região e que provavelmente tinha alguma relação com sua má catadura e físico de caminhoneiro, expondo os braços musculosos e bronzeados em camisas xadrez sem mangas, e usando geralmente calças jeans surradas e botinas de cadarço. Maria, contudo, não era caminhoneira, embora o seu negócio tivesse uma relação indireta com os homens que passavam pelo povoado, transportando carga: eram eles que, volta e meia, traziam uma nova "atendente", eufemismo pelo qual eram denominadas as garotas que trabalhavam na pousada/prostíbulo de Maria. Mas Maria não queria ficar conhecida apenas como cafetina: seus planos eram bem mais ambiciosos.

- Essa cidade está precisando de ordem, e de ordem eu entendo - jactava-se para quem a quisesse ouvir.

Pois Maria foi então ao diretório do PFB e declarou suas intenções: queria uma vaga para concorrer à vereança nas eleições daquele ano.

- Mas Maria... - ponderou Leandro Belchior, o presidente do diretório municipal. - Você é dona de cabaré, e mesmo que não fosse, a sua orientação sexual não é bem aceita pelo meu partido.

- O seu partido se interessa por votos? - Questionou Maria, braços cruzados. - Pois eu posso conseguir votos! E quanto a família, sou a maior defensora da família em Mato Pequeno: se eu abrir a boca, muito casamento tradicional aqui vai por água abaixo... e não estou só falando dos homens, das mulheres também!

Belchior pediu um tempo para pensar. Quando Maria saiu, ele ligou para várias personalidades do antigo distrito. Houve praticamente uma unanimidade nas declarações atestando o conservadorismo e o apego de Maria Jumenta à família.

No dia seguinte, Belchior deu-lhe as boas vindas como candidata à vereança pelo PFB.