Tocaia

Tocaia

O ano não me recordo, mas sei que estava iniciando a faculdade de comunicação. Sem dinheiro e com um emprego mixuruca. Mal dava para se alimentar. Moradia precária, na verdade uma república de estudantes, aproximadamente dez numa mesma casa: Era uma tremenda bagunça. Lá moravam caras vindos de várias cidades do interior de São Paulo – futuros físicos, advogados, psicólogos etc. A casa era bem localizada. Estava situada no elegante bairro do Pinheiros. Ruas arborizadas, casas enormes, principalmente o prédio da faculdade onde eu estudava. Na porta, escrito em inglês, a palavra “body”, que alguns que vizinhos que passavam por lá perguntavam se era o nome do animal - bode. É o que dá, quando se falar somente o português – (risos).

Era uma época em que nos divertíamos muito, festas atrás de festas – tudo era alegria.

Mas o que quero contar para vocês é um fato corriqueiro, mas com um toque de tristeza, e porque não – dramático.

Naquela época namorava-se muito. Eu para não ser diferente, estava namorando uma estudante do primeiro ano, o nome não me recordo – sei que todos, inclusive eu, a chamava de Paty.

Nosso namoro até ia bem, já se consolidava uns seis meses de troca de juras de amor.

Certa vez fomos ao cinema, junto com umas amigas dela, inclusive uma prima-

Essa prima: uma garota de baixa estatura, loira, de olhos verdes, e extremamente simpática; deu em cima de mim. Foi paixão à primeira vista. Confesso que a atração foi reciproca. Conversamos tanto que esquecemos da Paty e suas amigas.

Daí em diante passamos a namorar, para tristeza da Paty. Era uma nova e louca paixão - loucura no superlativo. Na intimidade esquecíamos do mundo. Era um relacionamento tão louco, tão louco, que se eu estivesse de costa, e ela se aproximasse, eu sabia que era ela. Era um cheiro de amor único. O namoro começou a ficar sério – apresentou-me seus pais, italianos, talvez com nacionalidade brasileira. Meio a contragosto me aceitaram.

Eles, com razão, queriam que a filha namorasse um amigo da família – principalmente pelo seu status financeiro – seus pais donos de um haras – imaginem a fortuna daquela família. Minha condição totalmente oposta – meus bens; um velho fusca do ano de 1.966, e nem possuía casa, quem diria cama. Na república eu dormia num colchão colocado diretamente no chão. No começo namorávamos ali mesmo, paixão deixa-nos cego, e tudo é felicidade.

Comecei a frequentar a residência deles e as festas da família. Todos eles tinham o carro do ano, e minha nova namorada que vou aqui chamar de Maria, era tão mimada que ganhou um automóvel Ford zerinho, simplesmente por ter passado do primeiro para o segundo semestre.

No bairro onde ela morava ela tinha uma amiga de infância, e uma” grande galera”. Lá, era nosso “point” – Lá nos encontrávamos, inclusive essa amiga que mentia para a mãe de Paty, quando eu e Maria arrumávamos uma viagem, muitas vezes num feriadão. Acho que os pais de Maria, sabiam quando ela mentia – mas faziam vista grossa. Coisas que pais de filhas única, para não entrar em atrito com ela, optavam pela tolerância, e Maria se aproveitava desta atitude deles.

Mas um detalhe dessa turma que eu logo percebi, da mesma forma que ela me assediou quando nos conhecemos no cinema, ela, se engraçava com um cara dessa galera – o Zé, rapaz rico. O tal Zé de quem a família dela gostava – um bom partido. Eles conversavam muito. Depois de um tempo aguentado a proximidade deste suposto amigo. Fiquei com muito ciúmes o que me fez enquadrá-la. Questionada; disse-me – “é coisa da sua cabeça, ele é só amigo” e eu gosto muito dele. Não fiquei muito convencido e passei a ficar atendo. Dizem por aí, que geminianos são volúveis – apesar de não acreditar muito em signos fiquei em alerta.

Notei, que ela começou a arranjar desculpas para não me encontrar – um dia ia na casa da amiga, no outro estava com dor de cabeça. Enfim, um monte de desculpas. Até que um dia, quando mais uma desculpa foi dada por ela – dizendo-me que não poderia encontrar porque tinha que ir dormir na casa da amiga porque ela estava mal. Fiquei desconfiado, pensei, como um bom mineiro – Chega, vou tirar essa dúvida. Pra mim basta! Convidei um amigo de longa data, confidenciei-lhe as minhas dores, deixei meu velho fusca na garagem, e fomos para a frente da casa dela com o carro dele. Fizemos campana: Onze horas...nada dela aparecer! Meia noite...nada!

Quando estávamos quase desistindo, um carro parou na frente da casa dela. Não deu outra – A tocaia tinha valido a pena, para minha tristeza. Ela desceu do carro entre beijos e abraços, com quem? Com o José, o seu amigo de infância... Foi um choque. Um soco no meu estomago. Eu não queria acreditar no que estava vendo- minhas dúvidas terminaram ali! Fiquei como um touro enfurecido , cego de raiva. Todo meu corpo tremia. Só me lembro que a fulminei com o olhar. Me aproximei e sem dizer uma única palavra dei-lhe um tapa no rosto, dei meia volta e parti. E nunca mais a vi – Nem na faculdade. Nem em lugar algum. Acredito que ela pediu transferência...