UM GOLE AMARGO DE SÓBRIEDADE
Bento sempre foi um jovem sonhador, cheio de planos e esperanças. No entanto, a adolescência trouxe consigo um novo amigo: o álcool. O primeiro gole foi uma promessa de euforia, uma fuga das inseguranças da juventude. Ele não sabia, na época, que essa escolha mudaria o rumo de sua vida para sempre.
Nos anos seguintes, Bento tornou-se um frequentador assíduo dos bares da cidade. A cada dose, a ilusão de felicidade se tornava mais intensa, mas a realidade estava a apenas um gole de distância. O álcool não apenas entorpecia sua mente, mas também sua capacidade de tomar decisões sensatas. Ele perdeu a conta das vezes que subiu em sua moto, já embriagado, acreditando que poderia controlar tudo. Foram três acidentes, três quebras de perna, um traumatismo craniano que trouxe consigo um coágulo que quase lhe custou a vida. A cada queda, a dor física era apenas um reflexo da dor emocional que se acumulava.
Bento viu sua saúde deteriorar-se. Os dentes, que um dia foram motivo de orgulho, agora eram apenas lembranças de um homem que não se preocupou consigo mesmo. As mulheres que ele amou foram afastadas, desgastadas pela sua incapacidade de ser um parceiro fiel, e as oportunidades de trabalho escorregaram entre seus dedos como a água. O dinheiro que ele poderia ter usado para construir um futuro foi gasto em noites regadas a cachaça, em promessas vazias e em sonhos desfeitos.
A relação com Deus, que antes lhe trazia conforto, se desfez como fumaça. Ele andou pelo vale da morte, muitas vezes sem perceber, afundando-se em um abismo de solidão e desespero. A vida, que poderia ter sido uma jornada de conquistas, tornou-se um ciclo de auto-sabotagem.
Aos 50 anos, Bento finalmente decidiu parar de beber. A decisão foi um golpe de coragem, mas a realidade que o aguardava era cruel. Ele se viu cercado por dívidas, pela falta de amigos e pelo afastamento da família. A mulher ao seu lado, também marcada por seus próprios demônios, não conseguia oferecer o equilíbrio que ambos precisavam. A sobrecarga emocional tornava-se insuportável, e a solidão se tornava uma companhia constante.
Agora, Bento se vê refletindo sobre sua vida. As oportunidades que teve e deixou escapar se tornaram fantasmas que o assombram. Ele lamenta o dinheiro que gastou em futilidades, as casas e terrenos que vendeu em momentos de desespero, a saúde que desprezou, as mulheres que não amou o suficiente e os filhos que nunca teve. O primeiro amor, aquele que poderia ter sido sua âncora, se perdeu em meio ao turbilhão que se tornou sua existência.
O caráter, embora manchado por escolhas ruins, ainda pulsa dentro dele. Bento sabe que, mesmo com todas as dificuldades, ainda pode lutar. Mas a batalha é solitária. Ele não tem mais forças, a paciência escasseia e o otimismo se tornou um luxo que não pode se permitir. As sombras do passado o cercam, e a falta de paz e descanso se torna um fardo inescapável.
Enquanto caminha por essa nova fase de sua vida, Bento carrega consigo as cicatrizes de suas escolhas, lembrando-se de que, apesar de tudo, ainda é possível buscar redenção. A luta continua, e talvez, um dia, ele encontre um caminho que leve à paz que tanto anseia.