INFERNOS

Ismael e Raabe se encontraram em um café em um canto esquecido da cidade, onde o tempo parecia ter parado e as conversas se misturavam ao aroma forte do café amargo. Ambos traziam consigo o peso de relacionamentos fracassados, cicatrizes invisíveis e um passado que os moldava a cada dia. Ismael, após três tentativas frustradas de encontrar amor, se via em um ciclo de promessas não cumpridas e filhos que clamavam por atenção, enquanto Raabe lutava contra os ecos de gritos e portas batendo, suas experiências de vida marcadas pela violência e pela solidão.

O destino, com seu humor peculiar, fez com que suas vidas se entrelaçassem. As conversas fluíram como um rio, onde cada um contava suas histórias de dor e abandono. Descobriram que, apesar das diferenças, havia um fio invisível que os conectava: a ausência dos outros e a luta diária pela sobrevivência emocional e física. Tornaram-se amigos, encontrando consolo nas palavras um do outro, e logo o que era amizade se transformou em um amor que parecia prometer um novo começo.

No entanto, o casamento não tardou a se revelar um terreno minado. Os filhos de Ismael e Raabe, em sua rebeldia juvenil, não estavam dispostos a ceder ao que consideravam uma invasão. As brigas pelo controle da casa tornaram-se frequentes, e a tensão se acumulava como nuvens pesadas no céu. Os meninos, antes solitários em suas infâncias, agora se uniam em um exército de desprezo e desinteresse, transformando o lar em um campo de batalha.

Ismael e Raabe tentavam se apoiar, mas os traumas do passado não se dissipavam com facilidade. Cada discussão sobre disciplina ou carinho era um lembrete de suas próprias faltas como pais. As crianças, imunes ao amor que os adultos tentavam construir, buscavam apenas suas próprias vantagens no caos. A casa se tornava um labirinto de gritos, risadas sarcásticas e olhares vazios, onde os sonhos de um futuro tranquilo se perdiam entre as paredes desgastadas.

Em uma noite particularmente tensa, Ismael, exausto, olhou para Raabe e viu não a mulher que amava, mas uma sombra do que ela poderia ter sido. Raabe, por sua vez, enxergava em Ismael uma figura que falhava em ser o protetor que ela tanto precisava. O amor, que antes parecia um refúgio, agora se transformava em uma prisão. As promessas de felicidade tornaram-se ecos distantes, como risos de crianças que nunca existiram.

A relação, que começou como um sopro de esperança, agora era um ciclo vicioso de frustração. Eles tentavam se encontrar em meio ao caos, mas cada um estava perdido em seus próprios infernos pessoais. As paredes da casa, que deveriam abrigar amor, tornaram-se testemunhas silenciosas de um clamor por socorro.

Os filhos, em sua liberdade não supervisionada, tornaram-se os arquitetos de sua própria anarquia, esquecendo-se do que significava ter uma família. Enquanto isso, Ismael e Raabe se viam presos em um jogo de culpa e ressentimento, onde o amor, aos poucos, se transformava em um eco distante.

E assim, o que começou como um conto de amor e redenção se tornou uma história de luta e sobrevivência. Infernos na terra existem, e eles habitavam um dos mais complicados. No silêncio da noite, entre sussurros e lágrimas, Ismael e Raabe perceberam que talvez fossem mais fortes juntos, mas o que haviam construído já carregava as marcas da destruição. O destino, brincalhão e irônico, continuava a tecer suas tramas, deixando-os à mercê de suas escolhas e do tempo.