O Bitcoin da Dona Maricota
Dona Maricota, 97 anos, viúva, a aposentada sempre foi conhecida no bairro por duas coisas: seu talento em fazer bolinhos de chuva e sua aversão a qualquer coisa que envolvesse tecnologia. O controle remoto da televisão, para ela, já era um bicho de sete cabeças. Então, quando o neto, o Pedrinho, resolveu explicar o que era criptomoeda, a confusão estava garantida.
— Vó, você precisa investir em Bitcoin! É o futuro do dinheiro!
Maricota, coçando o queixo, olhou desconfiada para o neto.
— Bitcoin, Pedrinho? Isso é comida nova, é? Faz o quê, engorda menos que açúcar?
Pedrinho riu.
— Não, vó, é uma moeda virtual. Não existe no papel, mas vale muito. Você compra pela internet e o valor dela só aumenta!
Ela deu uma olhada rápida para o cantinho onde guardava seu cofrinho de porquinho, cheio de moedinhas que juntava para comprar linha e tecido. Virtual? Moeda sem papel? Aquilo não fazia sentido.
— Espera aí, Pedrinho. Quer dizer que eu vou pegar meu dinheirinho suado, que ganhei na aposentadoria, e comprar algo que nem existe? Só na internet? Isso parece aquelas histórias pra boi dormir.
— Não, vó! É seguro, tem gente ficando milionária! Outro dia o amigo do meu professor disse que comprou Bitcoin em 2012 e agora tem dinheiro pra não trabalhar nunca mais!
Maricota, com as sobrancelhas erguidas, pensou. Já fazia um tempo que ela queria parar de costurar para fora e só fazer seus bolinhos de chuva em paz. Mas aquela história de “dinheiro virtual” não cheirava bem. Quando algo era bom demais, ela sabia que tinha que desconfiar.
— Tá certo, Pedrinho. Vamos fazer o seguinte: você pega aí esse tal de Bitcom... ou Biscoito, sei lá o nome. Compra aí pra mim uns dez desses. Vamos ver se eu fico rica também.
Pedrinho, com a tecnologia na palma da mão, já estava pronto para abrir uma conta numa exchange de criptomoedas e fazer a compra. Maricota, por sua vez, foi até o porquinho, deu umas batidinhas e despejou no colo do neto uma pequena fortuna: um monte de moedas de R$ 0,10 e R$ 0,25.
— Vai, Pedrinho, compra aí o que der. Não sou rica, mas também não sou boba.
O neto olhou para o monte de moedas e depois para a avó. Como explicar que o dinheiro que ela tinha guardado ali não ia nem dar para comprar uma fraçãozinha de Bitcoin? Ele suspirou.
— Vó, com isso aqui dá pra comprar... um pedacinho de um Bitcoin, talvez. Mas o valor dele pode subir!
Ela acenou, já sem paciência.
— Então compra logo esse pedacinho de Biscoito aí e depois me conta se ficou mais caro. E quando subir, me avisa pra eu vender!
Os dias passaram, e Pedrinho, ansioso, monitorava a cotação da criptomoeda, esperando o momento certo para avisar a avó. Quando o valor finalmente subiu um pouquinho, ele correu até a casa de Maricota, todo animado.
— Vó, o valor subiu! Agora você tem um pouquinho mais de dinheiro do que antes!
Maricota, que estava na cozinha, mexendo uma panela de feijão, nem olhou para ele.
— Subiu quanto, Pedrinho?
— Uns dois reais!
Ela largou a concha, olhou para o neto e riu alto, com aquela gargalhada que só as mulheres que já viram de tudo sabem dar.
— Dois reais? Ah, Pedrinho, me faça o favor! Da próxima vez, vou investir meus trocados em farinha. Ao menos disso eu faço bolinho de chuva, que vale muito mais que esse tal de Bitcom!
Angélica Lima