A HISTÓRIA DE ROBSON
A família Souza deixou o sertão do Cariri no penúltimo pau-de-arara, se tratava de uma improvisação feita na carroceria do caminhão para transportar nordestinos em direção ao sul maravilha.
Falta de perspectivas e seca prolongada serviram de incentivo para os Souza saírem do Ceará, com destino a então capital federal, lá contariam com apoio de vizinhos, que por carta relatavam bem sucedidas trajetórias laborais, desde que se instalaram na favela da Rocinha, na Zona Sul carioca.
Naquele final dos anos 60, Rocinha se constituía de um amontoado de precários barracos, dispostas ao longo da Estrada da Gávea, sinuosa artéria que ligava Gávea a São Conrado se encarapitando pela montanha que separa os bairros.
Não foi difícil para Antônio, o patriarca negociar um lote e levantar sua rústica moradia com o pouco dinheiro que conseguiu levantar antes da partida, afinal era pedreiro de profissão.
No início, a mulher e cinco filhos viviam no único cômodo seco da casa, afinal o dinheiro que trouxe só deu para isso mesmo!
As crianças cresceram nesse ambiente de escadarias, becos sempre regados a esgoto, moradias precárias e ausência ou deficiência de serviços públicos. Sofriam também com pouca insolação e ventilação, o sítio onde cresceu a favela pode ser encarado insalubre devido a alta densidade edificada.
A Tuberculose é uma doença que graça em ambientes com alta densidade de pessoas, selecionando vítimas entre aquelas com baixa defesa imunológica, seja resultante da má alimentação, seja das comorbidades adquiridas ao longo da vida. Um exemplo esclarecedor para este fato são as penitenciárias, que agregam todos componentes que propiciam a proliferação da doença.
Foi em 2003 que Robson, filho caçula de seu Antônio conseguiu aprovação no concurso para a COMLURB, a companhia de limpeza da cidade. Dos cinco irmãos foi ele, aos trinta anos, o primeiro componente da família Souza, a entrar no mercado formal de emprego.
Com poucas semanas de trabalho, Robson feliz de vida por trabalhar na própria comunidade, eliminando o custo e tempo para o necessário deslocamento diário. Mas um fato estranho lhe causou preocupação, um cansaço que não passava, acompanhado de febre intermitente e perda de peso nas últimas semanas. Assustado com os fatos procurou o posto de saúde local, e da consulta, logo veio o diagnóstico, Tuberculose.
Saiu da instituição de saúde arrasado, precisaria passar por tratamento longo, seis meses no mínimo. O profissional de saúde que lhe atendeu, pormenorizou o processo, inclusive enfatizando os efeitos colaterais do tratamento, lembrou que tão logo começasse o tratamento, as drogas utilizadas minimizariam os problemas associados a Tuberculose, e então voltaria a se sentir bem. Essa era a cilada da doença. Boa parte das pessoas quando voltam a sentir-se bem, resolvem abandonar o tratamento.
Aí sim a Tuberculose volta fortalecida, tecnicamente essa fase de retorno ao tratamento é definida como recidiva, exigindo uso de drogas mais pesadas, gerando efeitos colaterais mais intensos, constantes e diversificados.
No trabalho, ao tomar conhecimento do problema, Pedrão, seu chefe imediato e também vizinho na Travessa oito, um dos muitos becos da favela, se sentiu na obrigação de intervir, chamando Robson para uma longa conversa.
Pedrão recentemente perdera o irmão com quem mais se identificava para a doença. Então, passou a relatar detalhes da sofrida trajetória vivenciada, não queria em hipótese alguma rever esse filme.
Detalhou para Robson o diagnóstico, o tratamento, a melhora seguida do abandono, e a necessidade de retornar ao tratamento, com todos os efeitos colaterais, que em seguida abateram não só a saúde, mas também o humor do irmão, que agora diluía o sofrimento a goles de cachaça. Não demorou muito surgir à necessidade da internação, posteriormente seguida de doloroso final trágico e prematuro.
A responsabilidade assumida por Pedrão no tratamento de Robson deu mais força para encarar a doença, o retirando do trabalho nas ruas e abonando faltas em dias em que não se sentia bem.
Robson nem poderia imaginar, mas reside na comunidade com maior índice de infectividade dessa doença e, além disso, carrega características do público alvo da tuberculose: homem, pardo e na faixa de etária mais propensa a doença.
Por outro lado, hoje Robson faz parte do grupo de 2/3 dos pacientes que concluíram o tratamento com sucesso.