Na pacata fazenda onde morava, Otílio ganhou fama não pelo que fazia de melhor, mas pelo seu talento inigualável para contar histórias mirabolantes. Entre os peões da fazenda, era conhecido como o "mitomania", (mentiroso) um título que ele próprio gostava de ostentar com orgulho. Em uma tarde de festa, enquanto os peões celebravam ao som de violas e risadas, Otílio rompeu o silêncio montado em seu cavalo, trotando tão rapidamente que mal puderam reconhecê-lo.
Curiosos com a pressa de Otílio, os peões decidiram pará-lo. Com um gesto decidido, bloquearam seu caminho e questionaram o motivo daquela correria. Otílio, visivelmente abalado e com lágrimas nos olhos, explicou entre soluços que estava a caminho do velório de seu pai. Emocionados e solidários, os peões prontamente interromperam a festa e decidiram se reunir para irem na casa do pai do Otílio.
Galopando pelas estradas poeirentas da fazenda, os peões alcançaram a modesta casa onde o pai de Otílio residia. Ao baterem na porta, esperavam encontrar Otílio, mas foram surpreendidos quando o próprio pai de Otílio os recebeu. Confusos, os peões questionaram onde estava Otílio, ao que o pai respondeu com um sorriso sereno:
Meu filho, não está... e vocês ainda acreditaram nele?
Compreendendo a situação, os peões voltaram à fazenda entre risos e suspiros de alívio. Otílio, o eterno contador de histórias onde estavam suas grandes mentiras. Havia novamente tecido uma narrativa tão envolvente que até mesmo o luto imaginário de um filho se transformou em uma história para ser lembrada nas noites de fogueira da fazend
Neri Satter – Setembro de 2024 CONTOS DO SCARAMOUCHE