Coisas do Alzheimer
Minha mãe foi diagnosticada com a demência de Alzheimer aos 78 anos de idade.Durante doze anos convivemos com a demência, tratando-a com medicamentos disponíveis e cuidados paleativos.
Foram anos de muitas lutas, paciência e aprendizados sobre o Amar.
Mas nem tudo foi tristeza e dor.
Houve momentos lúdicos do brincar com uma mãe criança, e momentos de gaiatices e até cômicos.
Contratamos uma cuidadora que nos auxiliava nas tarefas diárias do zelar.
Irani, a nossa parceira, às sete da manhã depois de preparar o café, me chamava para juntas cuidarmos do banho e higiene de minha mãe ( neste tempo ela já tinha esquecido os movimentos do andar).
Como de costume cheguei á beira de sua cama e chamei por ela. Mãe é a hora do café, vamos rezar?
Ela continuou imóvel, o corpo já franzino estava bem esticadinho, pés juntinhos.
Chamei novamente, e nada.Percebi que ela respirava tranquilamente.
Olhei para Irani e disse — ela não responde, será que morreu?
Peguei em seu braço, e quando soltei devagar, este caiu desfalecido feito boneca de pano, e milagrosamente voltou à posição anterior (mãos cruzadas sobre o abdômen).
E ela continuava mortinha, mas respirando suavemente.
Última tentativa de "reanimá-la", uma massagem em seus pés para ativar a circulação.
Neste momento ela sempre reclamava, mas neste dia foi diferente. Ela foi inflando as bochechas para segurar o aí aí aí, afinal de contas estava morta.
Olhei para Irani e disse....Morreu mesmo, não podemos fazer mais nada, vamos tomar nosso café, e depois chamamos a Mão Amiga (funerária).
Por uns instantes ela fez menção de abrir os olhos, mas continuou imóvel.
Fomos pra cozinha, aguardar as cenas do próximo ato.
Segundos depois ouvimos um chamado em voz alta e firme, ordenando....
"VEM ME LEVANTAR, EU JÁ DESMORRI"...
Meses depois desta cena, ela viajou para a pátria espiritual.Calmamente durante uma madrugada, enquanto dormia.
Simples assim....e desmorrida e vivíssima continua em nossos corações.