O pai e o filho
Nasci em uma família grande, sou o oitavo de treze irmãos, minha família era muito pobre e a gente morava em uma casa com dois quartos grandes no interior do Paraná, mesmo quando eu era criança já trabalhava na roça com alguns dos meus irmãos e meus pais, eu o admirava, queria ser igual ele, sempre ficava fazendo alguma coisa para chamar sua atenção.
Não me lembro do meu pai demonstrando um gesto de carinho, nem comigo, nem com meus irmãos e nem mesmo com minha mãe, mas naquela época eu não entendia muito sobre isso e achava normal o pai da gente ser assim, então eu não me importava nenhum pouco com isso.
Às vezes o meu pai contava piadas depois do jantar e eu deva muita risada, mesmo quando a piada era sem graça eu forçava uma risada só para deixar ele feliz, talvez essa era a nossa maneira de demonstra amor um pelo outro. Um dia, enquanto ele falava, eu fiquei olhando para ele e imaginava ele contando as mesmas piadas para os meus filhos no futuro.
Porém, na maioria das vezes, meu pai não queria conversa, a gente até tentava puxar algum assunto, mas ele respondia com poucas palavras já querendo finalizar a conversa. Eu nunca sabia se depois do jantar seria o "dia das piadas" ou o dia do "Não quero conversar".
Em um domingo quente, no final de janeiro, eu estava sentado na porta da cozinha, tinha acabado de almoçar. Eu estava pensando nos nomes que eu colocaria nos cachorrinhos da nossa cadela que estava preste a dar cria. Meu pai passou por mim carregando uma lata para colocar minhocas e duas varas de pescar, passou direto, nem olhou para mim, mas de repente ele parou, olhou para trás e disse:
- Vamos pescar?
Eu levantei a cabeça para responder que sim, mas o sol bateu tão forte nos meus olhos que fiquei com preguiça e saiu um...
- Ah pai...
Ele mudou a feição na hora, fez cara de quem se arrependeu de ter me chamado, não disse nada e continuou andando em direção à estrada que levava até o rio.
Eu fiquei sentado ali, olhando ele de longe, pensando que eu deveria ter ido com ele, continuei pensando no nome para os cachorrinhos, alguns minutos depois eu já tinha todos na minha cabeça e pensei em contar para o meu pai quando ele voltasse.
Anoiteceu e meu pai ainda não tinha voltado, minha mãe estava preocupada, ele sempre voltava antes do sol se pôr, ela ia até a porta olhava em direção à estrada e entrava, fazia isso várias vezes sem dizer nada. Já estava muito tarde e ela não queria pedir para nenhum dos filhos irem atrás dele e também não poderia deixar os filhos sozinhos em casa para ir até o rio.
Foi a noite mais longa da minha vida, eu não conseguia dormir e escutava minha mãe chorando, mas ninguém perguntava nada para ela. Acabei pegando no sono e quando acordei o dia já estava amanhecendo, minha mãe não estava na cozinha preparando o café, como a encontro todos os dias quando eu acordo.
Ela estava lá fora, na beira da estrada aguardando um vizinho que tinha ido procurar meu pai, eu e meus irmãos sentamos em frente nosso casa e ficamos esperando em silêncio.
Quando o vizinho voltou, ele encontrou com minha mãe que correu até ele, não dava para ouvir o que ele dizia, mas vimos minha mãe levando as mãos na cabeça e em seguida joelhou-se no chão chorando sem parar. Quando ela se levantou e com a ajuda do vizinho caminhou até a gente não precisava dizer nada... A gente já sabia!
Naquele dia meu pai teve um enfarto na beira do rio, enquanto pescava e morreu. Ele me chamou para ir com ele e eu não fui e carrego isso comigo até hoje, eu poderia ter ajudado, ter chamado alguém para socorrê-lo, ou pelo menos estar ao seu lado na hora que partiu, mas eu não fui e o tempo não volta mais e todos os dias eu fico a pensar, o que teria acontecido, se eu tivesse ido com meu pai pescar.