001 - "Os Fundamentos do Santuário de São Francisco das Chagas"
Na vastidão do sertão de Canindé, onde as caatingas fechadas se estendiam até onde os olhos podiam alcançar, o som do vento parecia carregar as orações de uma terra que mal conhecia o conforto da fé organizada. Poucas casas pontilhavam o que seria, um dia, a próspera Vila de Canindé, e entre essas construções, uma alpendrada se destacava. Era o lar temporário de Francisco Xavier de Medeiros, um homem de origem portuguesa que havia chegado com um objetivo claro: erigir uma capela em honra a São Francisco das Chagas.
Medeiros sabia que a tarefa seria árdua. O sertão era hostil, o povoado, pequeno, e os recursos, escassos. Mas, em seu coração, havia uma chama acesa pela devoção ao santo das chagas, e isso o impulsionava. Ele começou a lançar os alicerces da capela com suas próprias mãos, ao lado de alguns poucos trabalhadores que acreditavam no seu sonho. Em meio às dificuldades, inclusive à resistência natural de uma terra seca, os alicerces começaram a tomar forma. A esperança crescia junto às paredes da futura igreja.
Entre os moradores, falava-se sobre a história de um caboclo, Gonçalo, o primeiro habitante daquelas terras, descendente da tribo dos Canindés, que abençoava a obra com seu silêncio reverente. Gonçalo sabia que aquela capela seria mais do que pedra e cal; ela seria o futuro de uma terra que acolheria milhares de fiéis. Porém, nem todos compartilhavam dessa visão. Muitos, com medo da seca e da fome, temiam que a capela nunca fosse concluída.
E, de fato, em 1792, uma seca devastadora solapou o Ceará, interrompendo as obras e dissipando as esperanças dos mais fracos de espírito. Durante anos, a capela permaneceu inacabada, com suas paredes ainda não abençoadas pelo toque final que traria a presença divina. Porém, Medeiros, teimoso como o próprio sertão, recusou-se a abandonar o seu propósito. Sabia que o destino da capela estava atrelado à resiliência daquele povo.
Foi somente em 1796 que, com a volta das chuvas e a renovada ajuda dos fiéis, a construção foi finalmente concluída. A pequena capela, então humilde e mal adornada, não era apenas uma obra de arquitetura. Ela se tornou símbolo de resistência, fé e comunhão. Nas décadas que se seguiram, a capela foi crescendo, reformada, reparada e ampliada, até que se transformou em um santuário majestoso, atraindo peregrinos de todas as partes do Brasil, homens e mulheres que buscavam ali um refúgio para suas dores, uma esperança de cura e um alento espiritual.
A cada reparo, uma nova história era gravada nas paredes do templo. As mãos que construíram e reconstruíram aquele espaço santo eram movidas pela fé e pela promessa de que São Francisco das Chagas não abandonaria Canindé. O legado de Francisco Xavier de Medeiros e de todos aqueles que contribuíram para a obra continuava a crescer, imortalizado nas preces murmuradas sob o céu do sertão.