Aprígio Se Casou Numa Aldeia

Por Vieira de Morais (*)

Pela história brasileira, nos informa que, de 1879 a 1912 se deu, ao norte do Brasil, a chamada "Febre da Borracha", devido o alto preço dessa matéria-prima por lá.

O látex (líquido viscoso e esbranquiçado) era extraído da seringueira e após seu processo de coagulação transformava-se em borracha. E transportado em barcos, a vapor, para Manaus ou diretamente para Belém.

De lá ganhava o mundo... ao ser vendida pelos 'Coronéis da Borracha' a países estrangeiros. — Atividade extrativista que alavancava as economias...

Os nordestinos, ainda com força de trabalho, eram atraídos pelas 'boas notícias' que circulavam, a respeito dessa mão de obra.

E, pela corrida ao chamado "Ouro Branco" como a imprensa dizia da época, o jovem Aprígio (pai de Joaquim Barbeiro) deixou a casa dos pais em São José do Egito, e foi procurar trabalho. — Naqueles rincões sem fim do interior do Pará...

Com alguns três dias viajados, por terra e água sobre o caldalosos rios, escanchado numa rede.

— Naquela região ninguém compra uma passagem de barco sem ter na bagagem uma rede. Mais-que-tudo, como bom nordestino, Aprígio carregava a sua..

Umas 50 horas de viagem chegaram a Santarém, e Aprígio ficou uns dias por lá para ver um rumo certo a tomar; e não demorou tanto: num barco menor prosseguiu seu destino...

Não demorou na busca por trabalho: conseguiu uma colocação numa unidade de extração do látex, em densa mata...

Até hoje, mas naquele tempo o que mais havia naquelas florestas do Pará, eram onças-pintadas. — E pretas também.

Amaneira daqueles trabalhadores dos seringais se defenderem de animais ferozes eram conduzir cada um, a sua boa arma de fogo carregada.

E rotineiramente lá estava o jovem Aprígio com os demais colegas de lides. Espalhados pelas matas, a extrair, o precioso látex. Espingarda-chumbeira, rabo-de-cotia, nas costas, e mãos a faca seringueiro cabo longo-corte fechado. — A riscar a pele das árvores castanheiras, e coletar o seu ouro.

Havia chovido a noite que passou e no frescor da manhã seguinte, dia brilhante o destino não quis mais aquele jovem, alto de olhos azuis naquela rotina de seringueiro.

Aprígio riscava uma seringueira... e ouviu por trás de si um forte barulho de mato a se quebrar...

Sem perda de tempo algum agarrou sua espingarda, presa às costas, a empunhou já engatilhada, a mirar seu alvo.

Mass como bom caçador que era, não atirou sem saber primeiro que bicho era ... e não pôde apertar o gatilho: por não saber do que se tratava.

Com um minuto ou mais, atônito a tentar, a todo custo descobrir que movimentação era aquela, sob a vegetação rasteira da floresta, conseguiu!

Se tratava de um enfrentamento corporal, de vida ou morte, de um jovem índio, com uma índia de sua idade.

Aprígio descansou o cão da arma na espoleta sem disparar um tiro sequer.

Não percebeu a mais tempo aquela luta por lutarem por trás d'uma enorme árvore caída, que apodrecia aos poucos com a ação do tempo.

A luta continuou por mais um tempo...

Aprígio aproximou-se dos brigões, encostou a espingarda e tentou como pôde para separar a abriga; e, apesar da muita força que tinha não conseguiu.

Vencidos pelo cansaço ou por uma intervenção milagrosa, do nada, cessaram o embate, a confusão. Estava ali encerrada a questão...

No início do diálogo com o homem branco, o casal tentou explicar algumas coisas, oralmente ao Aprígio, mas ele nada entendia.

Então, passaram a usar uma linguagem de sinais e, Aprígio entendeu bastante que disseram.

E soube do grande livramento de morte que teve naquele dia: a briga dos dois foi motivada pelo fato do seu irmão, ao disparar sua flecha em Aprígio fora interrompido bruscamente por ela. Ao ponto que gerou aquela luta quase interminável.

FORAM OS TRÊS, ao grande chefe que ouviu primeiro os irmãos...

Aprígio só via e ouvia a conversa, a parte e sem entender quase nada do que era dito, salvo Alguns sinais feito por eles e pelo cacique.

Ela contou ao Cacique toda a verdade: não escondeu nada. — Tim tim por tim tim.

Seu irmão, o jovem índio foi ouvido, mas seu argumento não convenceu o superior. Ao disse foi desaprovado num balanço de cabeça; e por palavras:

— Saiba Paracujaka: o grupo sobe minha égide está proibido por ordens do além, de não praticar mais o canibalismo; e, matar alguém por matar, é uma falta imperdoável. Sua irmã lhe salvou de uma prisão no fundo do Rio Negro: se tivesse ferido de morte homem branco.

Aprígio também foi ouvido; e um auxiliar do cacique o interpretava. Não tinha muito a dizer, mas falou o que tinha que ser falado.

— Cacique Takurupá, lider absoluto de minha gente caiapó quer ouvir home branco, falar aí!

— Eu o sou Aprígio seu cacique; estava a tralhar no seringal do senhor Luciano, Coronel da Borracha coletando látex para ele e de repente ouvi um barulho por trás de mim, olhei e vi os dois rolando no chão da floresta tentei apartar a briga e não consegui; quando pararam de brigar me trouxeram pra cá.

Tudo dito e esclarecido entre as partes envolvidas a razão foi dada à moça indígena e ao jovem branco Aprígio, pelo cacique Takurupá; de ter ele a parti de então, a liberdade do mundo de ir embora, para o seu reduto de trabalho, ou ficar na aldeia e se tornar como um deles...

E um namoro entre a Tainá e Aprígio, aconteceu...

A pesar do grande desafio a enfrentar pela frente: devido às normas tribais ao dizer que o rapaz civilizado, uma vez assumindo o casamento com uma moça de uma tribo daquela região, não poderia retornar com a esposa à civilização do homem branco.

Aprígio foi ficando na aldeia até decidir o que fazer da vida...

A sós com Tainá, ainda tímido Aprígio soube de quando seu amor, se deu por ele.

— Tainá, a muito pressinto que você quer me dizer algo; ou eu estou enganado?

— Verdade, quero: o meu amor por ti, nasceu no seu trabalho; naquele dia da minha briga, ao pé da seringueira.

Eu aguardava ansiosa para lhe revelar isso.

Ao saber de como tudo aconteceu, Aprígio passou a amá-la de uma maneira muito especial, como nunca visto; mais ainda por saber dela ter salvo a sua vida da morte pela flechada morteira do arco do seu irmão.

Então uniram, um coração ao outro na prevenção de viverem unidos até que a morte os separasse...

Tudo que o Aprígio possuía, estavam numa mochila velha. Algo de alimentar-se no seu trabalho no seringal

Ao ver o que havia na mesma, Tainá viu: farinha, carne-de-sol, de charco, uma saca de sal… ela não pensou duas vezes, o jogou numa Lagoa que havia junto à oca.

Após esse fato Aprígio ficou muito contrariado com a sua atitude. Por não estar sendo fácil acostumar-se com a culinária dos povos indígenas; muito menos sem o sal.

A vida d'um casal sem filhos, por muito tempo, pode se tornar monótona e vazia... E com esse casal não diferia: caminhava nessa direção...

Mas ia chegar gente nova na aldeia: Tainá estava grávida.m e a alegria refinaria naquele lar...

Passaram-se os nove meses de gestação de Tainá e o assunto da chegada do seu curumim à aldeia não saía da boca da comunidade indígena.

Dia chegado do nascimento da criança do casal mais lindo e querido da aldeia!

A alegria veio, que nem um relâmpago: invadiu a oca, os corações; alegrou a todos e, retornou ligeira ao firmamento.

— Foram recebidos com festa numa constelação.

Daí a razão de até hoje todas as Tainá significar "estrelas"

Mementos, após o parto morreram mãe filho!

O mundo desmoronou sobre o Aprígio que, perdeu a cabeça, o chão naqueles ermos.

A vida perdeu o sentido para ele a viver num labirinto de tristeza e desilusão a chorar... chorar.

Numa madrugada de agosto, desapareceu da aldeia para nunca mais voltar.

Foi sabido que em terras pernambucanas casou-se na sociedade em que viveu, com Maria Ferreira Bonfim e foram muito felizes até ao final da vida.

*Nemison Vieira de Morais

Acadêmico Literário da ANELCA E ALBMGRMBH

(21:01:21)

Nemilson Vieira de Morais
Enviado por Nemilson Vieira de Morais em 09/07/2024
Reeditado em 15/09/2024
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