Um quarto para Vana

- Eu usava esse quartinho como depósito - avisei, ao acender a luz - precisa de uma limpeza.

Vana, que vinha logo atrás de mim, correu os olhos pelo aposento atulhado de trastes e balançou a cabeça, afirmativamente.

- Eu posso limpar - afirmou. - Pelo menos, tem uma janela.

Era um basculante, na verdade; mas, enfim...

- E como você vai dormir no emprego, não vai perder tempo no trânsito - comentei tentando fazer graça, mas Vana continuou com a mesma impassividade de antes. Mordi os lábios.

- Piada horrível - murmurei para mim mesma. Surpreendentemente, foi só então que Vana esboçou um sorriso.

- Não se preocupe, Wanda; estou acostumada a morar no mesmo local em que trabalho. Aqui só é um pouco... menor.

- Tenho alguns móveis que posso pedir ao George que traga para cá, depois que você tirar a tranqueira - acrescentei. - Uma cama de solteiro, um colchão, um gaveteiro, uma cadeira, uma mesinha... a roupa de cama eu posso lhe emprestar até você comprar a sua...

- Está bem - assentiu mansamente Vana. - Acredito que em breve vou conseguir algum dinheiro...

- Você vai receber um salário, claro - apressei-me em dizer. - Um dólar e sessenta por hora, que é o salário mínimo nacional.

- Certo... e o que você vai querer que eu faça?

- Basicamente, você vai servir os clientes, manter tudo limpo durante o expediente e fazer a limpeza da loja depois que fechar - enumerei. - O movimento maior aqui é pela manhã, cedo, e depois das 18 h, até umas 20 h no máximo. Se você tiver interesse, posso te ensinar algumas coisas de cozinha.

Vana pareceu ficar genuinamente surpresa.

- Isso envolve carne?

Vana era vegetariana, lembrei-me.

- Aqui é um café; então, não - tranquilizei-a. - Isto é, exceto se considerar como carne derivados, como presunto, salame e fiambre...

- Creio que posso lidar com isso - admitiu ela.

- Ótimo, então. É claro que vou ter que fazer alguns testes, ver se você leva jeito para a coisa...

- Está bem - repetiu Vana. - Posso começar a limpeza?

- Mas claro! - Assenti.

* * *

Mais tarde, naquele mesmo dia, quando liguei para George, ele me perguntou porque eu havia finalmente resolvido aceitar Vana como empregada.

- Você sabe que eu não estava precisando de alguém para me ajudar, embora ter uma pessoa para olhar o café e organizar as coisas por mim seja bom - admiti. - E eu confio no seu instinto; Vana me parece uma boa pessoa, apesar do problema da amnésia ou seja lá o que quer que tenha acontecido com ela.

- Ela pode estar com amnésia, mas tem um raciocínio rápido - reforçou George. - Parece alguém que aprende depressa.

- Eu acho que sim. Fiquei de ensinar umas receitas, coisas simples; ela pode começar pelo básico, que é fazer o café, ferver o leite. Depois a gente vê.

- E obrigado por ter deixado que ela ficasse no seu quartinho de despejo - acrescentou ele. - Quando trouxe os móveis, me surpreendi por ela já ter tirado toda a tranqueira de lá.

- Sim, acho que Vana está acostumada com trabalho pesado... ela veio de uma fazenda, não é isso?

- Era um lugar onde havia muitos animais... não exatamente uma fazenda, pelo que entendi - redarguiu George.

- Acho que esse talvez tenha sido o ponto que me fez aceitar que ela ficasse - ponderei. - Vana leva jeito com bichos... você conhece a minha gata, Lulu... ela vive solta no café, mas não é lá muito sociável. Pois quando fiquei só com Vana, Lulu saiu lá do canto dela e veio se esfregar nas pernas de Vana, ronronando toda contente. Eu nunca a vi fazendo isso com ninguém.

- Se Lulu também confia nela, porque não você? - George riu, antes de desligar.