Uma Conversa de Rozemberg Com Papai
Por Nemilson Vieira de Morais (*)
Rozemberg foi um bom profissional da carpintaria em minha cidade. Dava gosto a gente ver aquilo que ele produzia com esmero, em madeiras.
Com a sua chegada a Campos Belos — GO, abriu uma indústria de mobiliários, em frente à nossa casa, na Rua do Comércio, Vila Baiana. Num casarão antigo da família santos. — Onde morou e trabalhou nesse ofício por um tempo.
Fabricava mesas, cadeiras, tamboretes e camas torneadas (de casal e solteiro). Usava muito a sucupira (madeira nobre) e abundante por lá nesse tempo.
O negócio ia bem, mas havia se endividado bastante com as compras de alguns equipamentos para a pequena indústria moveleira.
Com o tempo, de inadimplência, alguns cobradores deu de visitá-lo; e isso o aborreceu demais. Pelas sucessivas cobranças e pela falta de condições financeiras naquele instante, para quitar os compromissos assumidos. — Sem contar a vergonha que passava.
Para a resolução do problema o Rozemberg lembrou-se de alguém muito especial para ele: o meu pai. Muito não, mas dinheiro pouco o velho sempre tinha. A conversa se deu mais ou menos assim:
— Seu Natã eu preciso conversar seriamente com o senhor...
— Pois não seu Rosemberg, o que deseja!
— Depois de algumas noites mal dormidas seu Natã e, pensando no pior...
Já quase no amanhecer, de ontem para hoje me veio uma luz e eu me
lembrei do senhor... "Seu Natã vai me salvar!"
Então, eu vim cá pro senhor me ajudar a salvar pelo menos uma alma. — Já é uma grande ajuda.
— Como assim?! Em que posso ajudar salvar essa alma? O que está acontecendo?
— São os cobradores, seu Natã que não me dão paz. Virou um inferno minha vida: volta e meia tem um lá em casa, enchendo minha paciência, a me cobrar. Não aguento mais tanta afronta... e os meus planos são de matar um a um; conseguindo matar o primeiro, os outros fogem. Vou furar o estômago deles e fazer uma meia-lua com a faca; e puxar as vísceras para fora e jogar pros bichos na rua.
Continuou falando...
— Tão jogando a minha moral lá na lama seu Natã; e isso eu não vou permitir. Ninguém nesse mundo havia me cobrado: porque nunca dei tal motivo. Agora estou servindo de chacota ao povo, por causa dessa gente que não tem modos de tratar os outros; eu vou dar um jeito nisso.
Meu pai rabiscava um jornal velho com caneta azul; aberto em cima da mesa em que atendia seus fregueses. Levantou os óculos de graus a testa e olho no olho reverberou:
— Rosemberg o que você deseja que eu faça, para evitar que uma tragédia dessa proporção, não aconteça?!
— Se o senhor, seu Natã me arrumar trezentos cruzeiros e eu juntar com mais um tanto que já tenho, lhe garanto que não vai morrer ninguém. Vou pagar todo mundo; cada dia um pouco. Até quitar todas essas dívidas. Do contrário, a carnificina vai ser grande... o senhor vai ver.
Papai voltou com os óculos para o lugar e deu um cheque-mate no assunto do seu interlocutor, uma tacada de mestre:
— Quanto a ter esse valor a lhe emprestar Rozemberg não vai ser tão dificil, mas eu pensei outra coisa:
Mata esses cobradores vagabundos, que a partir de hoje, lhe cobrarem!
Rozemberg jamais imaginaria ouvir do papai uma tão inusitada resposta sugestiva e o interpelou:
— Seu Natã?! Não esperava essa! De onde o senhor tirou essa ideia e por que, me dá um conselho desse?
Papai calmamente, em poucas palavras o explicou...
— Eu tenho uma esposa e um monte de filhos para criá-los... se eu lhe emprestar esse dinheiro, num futuro bem próximo, ao lhe cobrar, quem vai morrer sou eu.
Rosemberg deu às costas ao papai e ganhou a Rua do Comércio imaginando coisas...
*Nemilson Vieira de Morais
Acadêmico da ANELCA & ALB/MG/RMBH
(22:06:24)
Nemilson Vieira de Morais
Enviado por Nemilson Vieira de Morais em 22/06/2024
Reeditado em 22/06/2024
Código do texto: T8091552
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